A fundadora e CEO da Fleur du Mal, Jennifer Zuccarini, é uma empreendedora nata. O empreendedorismo está no DNA: seu pai foi um visionário italiano que em 1954 levou a primeira máquina de café expresso para o Canadá, onde criou a família. Jennifer e as duas irmãs, também empreendedoras, cresceram ouvindo Giacomo repetir: “Por que trabalhar para alguém? Você deve sempre trabalhar para si mesma”.
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Diploma de história da arte e de belas artes debaixo do braço, mas tomada pela paixão de construir uma marca própria, a empresária nascida em Toronto decidiu fazer da moda o ponto central da sua carreira. Formada na Concordia University, se mudou para Nova York para estudar design de moda na FIT (Fashion Institute of Technology). Depois de alguns trabalhos na área, deu o grande salto ao cofundar sua primeira startup de lingerie, a Kiki de Montparnasse, em 2005.
Uma oportunidade de trabalhar como diretora de design na Victoria’s Secret, em 2008, proporcionou a Jennifer três anos de intensa experiência em uma gigante da moda, uma imersão que permitiu a ela aprender como funciona uma multibilionária do ramo. Mas ela logo voltou a sentir a chama empreendedora do pai. Foi assim que surgiu a Fleur du Mal, em 2012.
Com uma lista de celebridades como Bella Hadid, Victoria Beckham e Emma Roberts no catálogo, a Fleur du Mal criou um nicho para si mesma como uma marca atrevida e luxuosa de lingerie e moda praia. O estilo ousado aos poucos expandiu seus domínios, com o lançamento de uma coleção de ready-to-wear (expressão da moda atribuída à produção em série).
Embora o slogan da Fleur du Mal — “Inspiração para se vestir e se despir” — soe indecente, ele mostra que Jennifer aposta em apresentar a lingerie como uma peça de uso diário, uma parte do dia a dia, e não um tipo de roupa que as mulheres só usam aos fins de semana ou em encontros especiais.
“Quando eu estava criando a marca, pensava sobre como vestir a mulher de dentro para fora”, conta a empresária. “A marca fala do espírito e da alegria de viver que toda mulher tem. Antes de lançar a Fleur du Mal, eu olhava para a indústria e achava a maioria das lingeries muito básica ou super sexy, não havia muita coisa por aí que falasse à nossa ‘mulher Fleur’ — aquela que ama a moda, usa peças maravilhosas, faz coisas incríveis e é poderosa todos os dias.”
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Como varejista online, Zuccarini converteu lojas experimentais do tipo pop-up numa parte importante da estratégia da Fleur du Mal e encontrou assim uma maneira de combinar suas duas paixões: moda e arte. A pop-up mais recente, chamado de “The Peep Show”, contava com arte de artistas novos e menos conhecidos misturada a peças da Fleur du Mal. Acabou por se tornar um espaço de varejo permanente na cidade de Nova York, com trocadores que dão aos clientes a chance de experimentar a marca no próprio corpo antes de comprar. As obras expostas na galeria foram selecionadas por Jennifer e refletem a essência de Fleur du Mal: são poderosas, provocantes e femininas.
Além de expandir sua área de atuação no varejo, a Fleur du Mal recentemente lançou uma coleção de lingerie chamada “Essentials” — que, como indica o nome, tem itens imprescindíveis ao dia-a-dia — e um serviço que permite às clientes dimensionar o bojo dos sutiãs.
Na entrevista abaixo, Jennifer Zuccarini sobre como migrou da arte para a moda, como as mulheres podem reivindicar seu lugar no mercado e no mundo e como consegue se manter equilibrada como empreendedora.
Karin Eldor: Você estudou história da arte e artes plásticas: como acomodou a sua paixão pela arte em uma carreira como empresária de moda?
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Jennifer Zuccarini: Há muitas semelhanças entre artes plásticas e moda: ambas lidam com linguagem visual, curadoria e inspiração que vem em grande parte de um conhecimento do passado. Como eu estava fazendo desenhos e pinturas e cursos afins, me pareceu propício estudar design de moda.
KE: Você foi do mundo corporativo da Victoria’s Secret para o lançamento de uma grande marca própria, Fleur du Mal. O que a levou a dar esse salto empreendedor?
JZ: Depois de trabalhar na minha primeira marca, Kiki de Montparnasse, percebi algo que no fundo sempre soube: sou uma empreendedora de coração, desde a infância. Sempre pensei em mim mesma fazendo minhas próprias coisas e começando minha própria empresa. Eu amo construir marcas.
KE: Como fundadora do negócio, você tem de se preocupar com a parte prática. Como equilibra tudo e evita o desgaste?
JZ: Aprendi muito! [risos] Eu me vi esgotada anos atrás, porque estava profundamente mergulhada no negócio. Eu trabalhava todas as noites, todo fim de semana, não tinha tempo para me recarregar. Hoje sei que há certas coisas que preciso fazer por mim, para ser o meu melhor. Como meditar, o que eu não faço todos os dias, mas tento manter uma frequência. E me exercitar. Além disso, passar tempo com a família e amigos.
KE: Quais as três características essenciais para uma empreendedora?
JZ: 1- Persistência e coragem. E é preciso muita força para continuar, especialmente quando as coisas não estão dando certo, e isso é verdade para qualquer empreendedor, feminino ou não.
2- Confiança para apresentar as idéias com confiança. Como empreendedor, você precisa convencer as pessoas da sua visão, então tem de saber vendê-la. Precisa de confiança e certa dose de coragem para soar mais natural aos homens. As mulheres tendem a ser mais cautelosas e escrupulosas, se não estão convictas de algo.
3- Encarar tudo como um bate-papo — até mesmo uma negociação. Se alguém discorda de você, não quer investir em sua ideia ou lhe dizer ‘sim’, não desista e retome a conversa de onde parou.
No final das contas, eu realmente não gasto muito tempo pensando em ser uma mulher empreendedora: apenas faço o meu trabalho.
KE: Como você sugere que as mulheres reivindiquem seu lugar?
JZ: Lembro-me de quando tinha 21 anos e alguém me perguntou: “Você é do tipo que interrompe alguém em sala de aula quando tem a resposta sobre uma questão?” E eu disse que não, pois era muito tímida e não queria me arriscar a dizer algo errado. E ouvi que a mesma coisa que estava me impedindo de levantar a mão na aula era o que estava me segurando na vida. Eu sempre pensei sobre isso. Você tem que se colocar. Se falhar, pelo menos está no jogo. É algo importante para qualquer um, mas para especialmente para as mulheres: você pode não ter a resposta certa ou perfeita, mas você precisa se colocar no jogo.