A primeira vez que um funcionário pediu demissão da minha empresa, eu caí no choro. Eu, pessoa física, e o Atelier, pessoa jurídica, ainda estávamos muito misturados nas minhas emoções. Se alguém não queria mais trabalhar ali, por qualquer motivo próprio e legítimo, eu sentia como se fosse uma rejeição pessoal. E rejeições doem muito — quem não conhece essa dor?
Com muitas conversas com pessoas mais experientes, terapia e raciocínio lógico, fui aprendendo a separar os sentimentos e os papéis. O Atelier nasceu de mim e, em alguma medida, talvez eu tenha sempre a sensação de que é uma extensão minha — não limitado a isso. Mas ele é uma empresa. E por mais diferente que eu trabalhe para que essa empresa seja, continua sendo uma empresa, ainda mais para quem chega de fora para se juntar a ela.
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Em momentos difíceis, gosto sempre de voltar às origens. Quando lembro do sonho, antes de haver qualquer realidade, o Atelier seria um meio para realizar cada uma das pessoas que o representam. Um meio para contribuir com a felicidade individual. Juntos, formaríamos — e hoje posso dizer que formamos — um coletivo forte, capaz, talentoso. Mas o meio para isso sempre foi a liberdade individual. Então, quando alguém decide seguir em frente, deixando seu vínculo com o Atelier, o sonho é colocado à prova. Se é verdade que queremos que as pessoas se realizem, então é preciso respeitar e, mais que isso, apoiar as escolhas de cada um. E se o Atelier contribuiu para esclarecer o que a aproxima ou afasta da própria realização a cada momento, então cumprimos o que nos propusemos.
Na segunda demissão, eu me abalei menos e me recuperei mais rápido. Na terceira, já não chorei. Não porque não me importasse mais, mas porque entendi que não se tratava de nada pessoal. Dali em diante, as experiências se multiplicaram e fui aprendendo a racionalizar cada vez mais rápido as emoções que me acometem sempre com muita intensidade, principalmente quando se trata de pessoas queridas, competentes, cheias de potencial, como as que trabalham conosco.
Os principais desafios que reconheço nesse processo giram em torno de aceitar que decisões importantes nem sempre estão ao alcance de nossas mãos. De aceitar o curso natural da vida, independente de nossas vontades. De aceitar que o encontro e desencontro de intenções têm motivações pessoais, íntimas e intransferíveis. De que é preciso ter flexibilidade para confiar que toda mudança é uma oportunidade de evolução para as pessoas envolvidas. De entender que sucesso não significa “para sempre”.
Hoje, inspirada pela máxima budista de que a única permanência é a impermanência, eu me rendo ao incontrolável e, com o coração cheio de gratidão, me despeço das pessoas incríveis que escolheram seguir seus caminhos a partir de certo ponto sem o Atelier. Isso, no entanto, não apaga tudo o que construímos juntas e o fato de que elas, como todas que vieram e foram antes (e as que seguem conosco) ajudaram a colocar os tijolinhos que sustentam nossa base.
Empreender é um exercício diário de reinvenção, aceitação e ação. Por isso, seguimos.
Ariane Abdallah é jornalista, autora do livro “De um gole só – a história da Ambev e a criação da maior cervejaria do mundo”, co-organizadora do “Fora da Curva 3 – unicórnios e start-ups de sucesso” e fundadora do Atelier de Conteúdo, empresa especializada na produção de livros, artigos e estudos de cultura organizacional. Praticante de ashtanga vinyasa yoga, considera o autoconhecimento a base do empreendedorismo.
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