Você já parou para pensar que a vivência de trabalho de um colega com a mesma formação, mesma idade e com cargos parecidos pode ser muito diferente que a sua? A maneira como a vida se apresenta para você, os olhares que recebe, o jeito que você é tratado pode mudar muito, dependendo de fatores muito simples como gênero, orientação sexual ou cor da pele.
Neste mês de março, eu gostaria de fazer um convite para uma rápida reflexão sobre igualdade de gênero. Eu sei que não tenho lugar de fala, mas também sei que promover equidade e inclusão é uma responsabilidade de todos: minha, de líderes e de todas organizações – não só das mulheres. Para evoluirmos, precisamos de parceria e de pessoas aliadas, para juntos trabalharmos em um mundo melhor.
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Lembro de uma das mudanças que presenciei na inclusão das mulheres no mercado de trabalho, no início da minha carreira, há quase 30 anos. Todas as áreas tinham uma boa presença feminina, mas Vendas não. A área lidava com ambientes predominantemente masculinos, mais agressivos, quase hostis. Muito se falava sobre não colocar mulheres para vagas em Vendas. A intenção? Protegê-las. Lembro de quando tinha que recolher produtos para devolução e entrava em depósitos que até ratos tinham. Como colocaríamos uma mulher num ambiente desses? O tempo não demorou para me provar que eu não poderia estar mais errado.
Até que decidimos mudar. Chegaram mulheres como minha amiga Adriana Novais, uma desbravadora do caminho feminino em Vendas, que hoje preside a P&G na Colômbia. Ela não queria “proteção”. Ela queria oportunidade. Queria poder escolher sua carreira, queria mudar o que fosse necessário e queria suporte dos seus colegas e líderes. A oportunidade veio e, com ela, muitos desafios! Todos recebemos letramentos, mentorias, treinamentos para lidar com as situações difíceis. Porém, ela mostrou a que veio e, com muito empenho e apoio, seguiu firme e chegou onde está. Tenho muita alegria de ter contribuído neste processo, sempre como amigo, às vezes como mentor ou até chefe.
Aprendi muito. Aprendi a, sempre que quiser ajudar alguém, perguntar antes como essa pessoa quer ser ajudada. Aprendi a acreditar menos em limitações e mais em possibilidades. Aprendi que, quanto mais plural o pensamento, mais soluções criativas acontecem. Aprendi que nessa troca, juntos chegamos mais longe.
Adri e tantas mulheres mostram que liderança e habilidade não têm gênero, e trazem muito mais valor que o preconceito. A presença de mais mulheres em Vendas, por exemplo, foi um terreno fértil para mudanças importantíssimas na cultura de vendedores e, principalmente, na maneira como indústria e varejo se relacionam. Existia no mercado a mentalidade de fazer a melhor negociação para si, tirando todo o suco do outro lado. Mas, com pessoas de pensamento diverso, foi criada a cultura do ganha-ganha. Clientes viraram parceiros e, em conjunto, passamos a criar valor um para o outro e fazer o que é bom para ambos.
Muita coisa mudou nesses últimos 30 anos, mas é importante dizer que a jornada ainda é longa. Estamos em um novo século e, ainda, todos os dias mulheres são diminuídas em sua maneira de dirigir e são assediadas nas ruas. Todos os dias mulheres gastam o dobro de horas em tarefas domésticas. Todos os dias mulheres sofrem com a síndrome da impostora no trabalho e ainda recebem um salário menor pela sua entrega.
A responsabilidade para mudar isso é de todos nós, jamais somente delas. Até porque, a equidade não é só a coisa certa a fazer, mas também é um grande negócio, com colaboradores mais felizes, um melhor clima organizacional e abrindo um celeiro de talentos e oportunidades. Como aliado, meu papel é me conscientizar, ouvir, transformar e incentivar tantas outras Adrianas, Veronicas, Brunas, Luanas, Milenas ou Fernandas desbravando matas fechadas para se tornarem referência. Meu papel é relembrar que estruturas podem ser mudadas. Basta querer e começar.
André Felicíssimo é presidente da P&G Brasil
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