As prioridades dos profissionais mudaram. Se entre 2018 e 2021 buscavam metas desafiadoras e plano de carreira definido – depois, é claro, de um salário competitivo –, desde 2022 eles querem flexibilidade em relação a horários e modelos de trabalho e equilíbrio entre vida pessoal e profissional. “A flexibilidade já é mais lembrada que o plano de saúde para o trabalhador do mundo contemporâneo”, diz Bruna Neves, diretora-geral da WeWork no Brasil, citando dados do relatório Tendências e Perspectivas do Trabalho 2023, conduzido pela empresa de escritórios compartilhados na América Latina.
Nas entrevistas qualitativas com mais de 10 mil profissionais de cinco países da região (Argentina, Brasil, Chile, Colômbia e México), flexibilidade foi o benefício inegociável mais citado pelos entrevistados (46%), muito à frente do plano de saúde (24%) e do vale-alimentação (19%).
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A terceira edição do estudo, feito em parceria com a Page Outsourcing, divisão do PageGroup especializada em terceirização de processo de recrutamento, e com o apoio de Renata Rivetti, fundadora da Reconnect Happiness at Work, e Alexandre Pellaes, pesquisador, professor e especialista em novos modelos de gestão, da Exboss, identifica tendências de comportamento dos profissionais latino-americanos.
Frustração com a falta de flexibilidade
Hoje, 55% dos profissionais brasileiros estão frustrados com seus trabalhos. E o principal motivo é a falta de flexibilidade, à frente do salário (citado por 14%) e da falta de processos (11%). Essa ordem vale para todas as gerações, com exceção dos baby boomers, profissionais na faixa entre 60 e 80 anos, que lideram a insatisfação (60%) e estão frustrados especialmente com o salário e a falta de reconhecimento.
Profissionais da geração X (52%) – entre 45 e 50 – ocupam o 2º lugar no nível de frustração, seguidos da geração Z (46%), aqueles de 26 a 13 anos, e millennials (42%), que têm de 27 a 42 anos.
A flexibilidade desejada pelos profissionais não é apenas em relação ao modelo híbrido, mas também envolve jornadas flexíveis e participação na definição das políticas de trabalho. O impacto disso não se dá só na vida profissional, mas também na saúde mental, no bem-estar e na qualidade das relações fora do trabalho.
O modelo híbrido é o que tem maior impacto positivo na saúde mental, segundo os próprios entrevistados: 63% afirmam isso, enquanto o impacto positivo do modelo remoto foi identificado por 41% e do modelo presencial, 28%.
Além disso, 63% dos entrevistados consideram que a flexibilidade ajuda a promover a diversidade nas equipes. Para 58% das pessoas com filhos, por exemplo, o híbrido é o melhor modelo de trabalho. “O híbrido gera mais oportunidades para pessoas que são mães e para quem mora em outras regiões fora das grandes capitais”, diz Neves.
Em linha com essa busca por mais flexibilidade, 83% dos colaboradores gostariam de trabalhar quatro dias na semana, um projeto que foi bem-sucedido internacionalmente e começa a ser testado por empresas no Brasil. 77% das pessoas acreditam que seriam mais produtivas com uma semana mais curta de trabalho. Outras 17% têm preocupações, como a dependência da presença física em algumas posições, como as comerciais, e a distribuição da carga de trabalho. “Trata-se, sobretudo, de mudança de mentalidade, com melhora de eficiência e em processos”, diz Neves.
Queda do trabalho híbrido
Os dados mostram que o trabalho híbrido sofreu uma queda no Brasil, enquanto os modelos 100% presencial ou remoto estão mais presentes no país do que no ano passado.
- Híbrido: sofreu redução de 14%, passando de 78% em 2022 para 64% em 2023;
- Presencial: subiu de 10% em 2022 para 18% em 2023;
- Remoto: subiu de 12% em 2022 para 18% em 2023.
As empresas ainda estão testando os melhores modelos e, muitas delas, tentando se adaptar às mudanças dos funcionários. Cerca de 55% dos entrevistados que trabalham em modelo híbrido disseram ter experimentado mudanças nos requisitos de presença no escritório nos últimos seis meses, o que envolve a quantidade de dias de trabalho no escritório e locais de reunião.
Isso varia de acordo com a política de cada empresa, mas a maioria dos profissionais (63%) gostaria de ir ao escritório de um a dois dias na semana. E entrevistados de todas as gerações concordam que uma política de trabalho 100% presencial tem um impacto negativo na felicidade e satisfação.
- 64% das pessoas vão ao escritório de duas a três vezes por semana;
- 21% trabalham presencialmente uma vez na semana;
- 10% vão escritório quatro vezes por semana;
- Apenas 3% trabalham presencialmente cinco dias na semana.
Mas, segundo a pesquisa, as decisões sobre os modelos de trabalho estão concentradas nas mãos das empresas e dos líderes (60%), e não dos funcionários. Apesar disso, os brasileiros têm mais autonomia para definir o seu modelo (27%) quando comparado à média da região (18%). “A tensão entre expectativa e realidade se torna cada vez mais forte, já que a base da pirâmide ganhou força e não aceita mais decisões unilaterais das empresas”, diz Neves.
Isso exige o trabalho conjunto entre profissionais de RH e lideranças para entender as necessidades dos funcionários e orquestrar soluções para atrair e reter os melhores talentos. “Ao perceberem que muitos profissionais estão abertos a oportunidades mesmo estando empregados, as empresas vêm tomando medidas para se adaptar e ter sucesso, como investir no desenvolvimento e na progressão de carreira de seus colaboradores atuais”, afirma Lucas Toledo, diretor-executivo do PageGroup.
Escritório é espaço para conexões
Se os profissionais querem ir ao escritório no máximo dois dias na semana, esse espaço passa a ser um ambiente de conexão, o que já havia sido observado na pesquisa do ano passado.
Entre os principais motivos que levam as pessoas ao escritório hoje estão:
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- Integração de equipes e relacionamentos interpessoais (48%);
- Obrigatoriedade (29%);
- Aumento na produtividade (12%);
- Infraestrutura (7%).
Nas entrevistas qualitativas, os entrevistados também citaram resolução ágil de problemas, eficiência na tomada de decisões, comunicação e contato pessoal e networking. “Todos têm a ver com relacionamentos”, observa a diretora-geral da WeWork.