Num mundo altamente preocupado com aparências, o fenômeno do “pretty privilege” (os privilégios econômicos, sociais e políticos que são concedidos a homens e mulheres apenas com base na sua aparência física) é real. Mas, embora existam benefícios claros nesse tratamento preferencial, um exame mais aprofundado pode revelar que também existem certas consequências indesejáveis em ser altamente atraente. Será? Aqui, algumas explicações psicológicas.
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Uma personalidade bonita
Um estudo de 2021 que examinou a ideia de que “a beleza é boa” descobriu que indivíduos atraentes são percebidos como tendo mais traços morais do que indivíduos pouco atraentes. Pesquisas também mostram que pessoas consideradas bonitas são tidas como mais confiáveis do que a média.
Estas suposições baseiam-se provavelmente no “efeito halo”, em que se presume que alguém que é percebido positivamente num determinado aspecto tem também outras qualidades positivas. Por exemplo, rostos altamente simétricos não são apenas vistos como atraentes, mas também como indicadores positivos de saúde e de bons traços de personalidade, como sociabilidade, inteligência, vivacidade, autoconfiança e saúde mental.
Nascer bonito ou bonita pode dar a esses indivíduos confiança e habilidades sociais que os fazem parecer mais competentes, simpáticos e persuasivos. Devido à sua aparência e habilidades percebidas, as interações sociais e românticas tornam-se mais fáceis. E as portas se abrem e convites são prontamente feitos.
Mas, pesquisas mostram que indivíduos atraentes também podem ser percebidos como vaidosos, o que nem sempre é bem visto.
Além disso, as verdadeiras ligações sociais baseadas na personalidade e nos interesses partilhados podem ser ofuscadas por julgamentos externos superficiais. Os relacionamentos podem começar pelos motivos “errados” (pela beleza, apenas), por exemplo, levando a uma sensação de isolamento e falta de conexão real, o que é essencial para o bem-estar de qualquer pessoa.
Por outro lado, em 2022, um estudo também descobriu que, se um indivíduo é considerado menos atraente e de aparência menos inteligente, ele também parece menos humano para o observador. Especificamente, as mulheres menos atraentes pareciam menos humanas, tal como os homens menos inteligentes, sugerindo uma camada mais profunda de preconceito de gênero. Estas atribuições de traços de personalidade tornam-se indicadores preocupantes de como os indivíduos (com ou sem o privilégio da beleza) podem ser tratados de forma diferente em determinados ambientes, sem que tenham culpa alguma ou feito nada de errado.
Beleza pode ser vantagem na carreira?
Nas esferas profissionais, o privilégio da beleza pode ser uma plataforma de lançamento para o sucesso. Pesquisas mostram consistentemente que indivíduos atraentes têm maior probabilidade de serem contratados, promovidos e receberem salários mais elevados. A sua confiança baseada na aparência também lhes permite buscar os salários e as oportunidades que desejam e merecem.
Da mesma forma, a aparência de um aluno na sala de aula também pode afetar as notas que ele recebe. Alunas consideradas bonitas ganharam notas mais baixas em cursos online do que quando as aulas foram dadas presencialmente, segundo estudo de 2017. Da mesma forma, em 2022, um outro estudo mostrou que as notas das alunas atraentes diminuíram quando as aulas off-line mudaram para o ensino on-line. E aí está um dos maiores paradoxos, principalmente quando se trata de gênero: mulheres podem ser consideradas mais inteligentes quando não estão dentro dos padrões de beleza. Mas também podem sofrer por estar dentro deles.
Além disso, o privilégio da beleza pode criar uma dinâmica acadêmica ou no local de trabalho que promove a discriminação, o ressentimento e o descontentamento. O indivíduo privilegiado pode ter sucesso, mas à custa de seus relacionamentos e, possivelmente, de sua saúde mental.
Uma pesquisa mostrou que mulheres atraentes podem experimentar dissonância cognitiva ou conflito mental quando se beneficiam da beleza, pois podem simultaneamente enfrentar desprezo, hostilidade e falta de empatia devido às suas vantagens, levando a um declínio na sua saúde mental. Por mais que sejam colocadas num pedestal, podem ser desvalorizadas pelos mesmos motivos.
O pretty privilege também pode criar uma ênfase excessiva nas qualidades externas, levando ao desenvolvimento de uma relação pouco saudável com o próprio corpo, baseada na pressão para “manter as aparências” ou continuar a receber validação através da beleza.
E, para quem não tem esse privilégio, acaba lidando com a inadequação, a comparação social e a frustração, o que nos leva à importância de promover uma definição de beleza mais inclusiva e diversificada, bem como de enfatizar as verdadeiras qualidades internas de uma pessoa acima de tudo.
Precisamos pensar em uma beleza inclusiva
Em sua essência, o tal do pretty privilege confere aos indivíduos uma série de vantagens sociais, profissionais e pessoais baseadas unicamente em sua atratividade física. Mas a investigação sobre essa vantagem sublinha a necessidade de reconhecer e valorizar a diversidade das experiências humanas para além das aparências físicas. Em última análise, compreender a natureza dupla do pretty privilege é um passo crucial para promover uma sociedade que valoriza os indivíduos pelo seu carácter e capacidades, e não pela estética.
*Mark Travers é colaborador da Forbes USA. Ele é um psicólogo americano formado pela Cornell University e pela University of Colorado em Boulder.