Em 2020, a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) fez um alerta: a pandemia de coronavírus aumentou os fatores de risco para o suicídio. São eles a depressão e o uso de drogas (todas elas, de álcool a substâncias ilícitas como a cocaína).
Essa, de fato, é uma informação alarmante. Só no Brasil, 12 mil pessoas, aproximadamente, tiram a própria vida por ano. A pergunta é: o suicídio pode ser evitado?
A resposta está longe de ser fácil, mas pode-se dizer que, sim, é possível reduzir as chances de alguém se matar. Entretanto, não se pode dizer com absoluta certeza que é possível evitá-la totalmente. O tema é muito complexo, assim como são complexas as razões pelas quais uma pessoa passa a enxergar na morte a saída possível para a sua vida.
Para que se tenha uma ideia da complexidade do tema, cito um exemplo recente. Todos os dados científicos apontam para maior probabilidade de suicídio entre homens. Com a pandemia, observou-se, no Japão, uma ligeira queda de morte auto-inflingida entre homens e um aumento de quase 15% entre as mulheres.
Há várias hipóteses, entre elas a de que hoje há, naquele país, um número maior de mulheres vivendo sozinhas, e a pandemia afetou consideravelmente aquelas que davam conta de suas vidas sem a ajuda de ninguém.
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O ato de tirar a própria vida não surge de uma hora para outra. De maneira didática, pode-se dizer que existe uma gradação que vai da tristeza, em um extremo, ao suicídio propriamente dito, o outro extremo. Entre as duas pontas há uma zona cinzenta, que abrange os quadros de depressão, a ideia de morte, a vontade de tirar a própria vida, que inclui um planejamento para que isso aconteça, e a tentativa de se matar.
É justamente nessa zona cinzenta que o médico é capaz de agir. É nessa zona que surge a palavra morte. Não quer dizer que aquela pessoa fale em morte. Por meio de suas atitudes, ela demonstra que a ideia de autoeliminação está presente. Por exemplo: ela começa a se desfazer de coisas das quais gosta, antecipa o testamento, procura um serviço funerário para organizar o seu enterro, passa a adotar comportamentos que colocam a vida dela em risco, como andar em alta velocidade com o carro etc.
O apoio de um profissional da área de saúde mental – psiquiatra ou psicólogo – é fundamental nesse momento, pois ele tem ferramental para prover ajuda, que vão desde medicamentos antidepressivos até a internação.
Porém, a ajuda mais importante é a da família. Ela é quem tem mais chances de perceber se um ente querido passou a exibir comportamentos diferenciados. Ao notar algo estranho, procure conversar com aquela pessoa. O objetivo é que ela saiba que você se importa e que ela não está sozinha. E, rapidamente, a incentive a procurar ajuda médica ou faça você mesmo o contato com um profissional de saúde mental.
Dr. Arthur Guerra é professor da Faculdade de Medicina da USP, da Faculdade de Medicina do ABC e cofundador da Caliandra Saúde Mental.
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