Artigo recentemente publicado por competentes técnicos da Embrapa (Elisio Contini e Adalberto Aragão) mostra que a agropecuária brasileira alimenta cerca de 800 milhões de pessoas no mundo, incluída a população interna. O estudo considera o que o Banco Mundial classifica como “alimento”, de acordo com o Food Price Index: os grãos (arroz, trigo, milho e cevada), óleos vegetais e tortas (soja, óleo e torta de soja, óleo de dendê, de amendoim), açúcar, banana, carne de aves e bovina, e laranja. Mostra, ainda, que de 2011 a 2020 o Brasil passou a alimentar mais 259 milhões de pessoas, e, se o crescimento das exportações continuar no ritmo observado nos últimos dez anos, até 2030 o país alimentará mais de 1 bilhão de pessoas.
Para se ter uma ideia, em 2020, em plena vigência da tragédia causada pela Covid-19, o país foi responsável por 72% do comércio global de suco de laranja, 51% da exportação mundial de soja, 34% da de açúcar, 31% de carne de frango, 22% de carne bovina, 26% de café, 23% de milho e 10% da carne suína. Entretanto, é pequena a participação em outros produtos, como frutas, derivados de leite, pescado, verduras e legumes. Há um amplo potencial para aumentar o nosso papel na alimentação global. Para isso, será necessário avançar no terreno das inovações tecnológicas. Esse é o caminho para ampliar a competitividade do Brasil na atividade exportadora desses setores. Vale lembrar que a tecnologia tropical aqui desenvolvida aumentou a oferta de alimentos, reduzindo seu preço e o valor da cesta básica, que caiu 40,05% de dezembro de 1975 a dezembro do ano passado.
Entre as tecnologias necessárias, é bom começar por fertilizantes: hoje a dependência externa do Brasil está em 90% de potássio, 75% de nitrogenados e 50% de fosfatados. Aliás, o grupo de “adubos ou fertilizantes químicos” é o segundo no ranking das importações brasileiras, perdendo apenas para “óleos combustíveis de petróleo ou de minerais”. Uma dependência que precisa ser reduzida, seja com o aumento da produção interna de matérias primas, provenientes de investimentos altíssimos e licenças ambientais complexas, seja no avanço de novos fertilizantes orgânicos, como já vem crescendo o uso de “compostos” e de organo-minerais. Destacam-se também os defensivos biológicos, especialmente os inseticidas e fungicidas, elementos-chave da inovadora “agricultura regenerativa”, já em franca expansão no país, e que elevará significativamente a “barra” da nossa defesa sanitária.
A irrigação é mais um tema para o qual precisamos melhorar nossa performance: hoje irrigamos cerca de 10% de área cultivada, muito menos do que fazem os países desenvolvidos. Com irrigação, poderemos produzir até três safras por ano, o que jamais será alcançado no hemisfério norte, sem sol o ano todo. A digitalização e a conectividade têm chegado ao campo com rapidez, formando uma juventude capacitada nas melhorias de gestão ao setor.
Todos esses temas alavancarão a nossa maior oferta de alimentos para o mundo, focada, inclusive, na ampliação da participação dos pequenos produtores que hoje estão fora dos mercados globais. Dos 5 milhões de produtores brasileiros, mais de 4 milhões, sobretudo os pequenos, estão nessa situação inaceitável. A incorporação destes aos mercados, papel que vem sendo realizado pelas cooperativas agropecuárias, pelas quais já passa 50% da produção rural brasileira, e pelo “Sistema S” do campo, o Senar e o Sescoop, se faz necessária e urgente. O governo também tem um relevante papel a desempenhar nesse segmento, por meio da Anater. Uma vez adotadas essas inovações, será possível transformar desafios em infinitas oportunidades para o Brasil.
Roberto Rodrigues é coordenador do Centro de Agronegócios da FGV
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