Da sala de aula para o ambiente doméstico, o setor educacional foi um dos mais desafiados pela pandemia de Covid-19. As barreiras de superação tecnológica estavam presentes em inúmeras frentes: de alunos com diferentes perfis, áreas de conhecimento e idades a profissionais que precisavam rapidamente se adaptar para manter no ambiente digital o ritmo e qualidade de ensino vividos, até então, de forma presencial.
Na Cogna Educação, holding que abriga marcas como Kroton, Saber, Vasta e Platos, a avalanche de desafios do setor encontrou um adversário à altura, Roberto Valério, CEO da Kroton, principal divisão de negócios de graduação do grupo educacional. Administrador de empresas pela FGV (Fundação Getúlio Vargas), Valério atuou por três anos na Anhanguera Educacional, ocupando as posições de presidente e vice-presidente de Operações e Marketing da marca, trajetória que confere ao executivo um olhar abrangente sobre os dilemas e vantagens competitivas presentes no setor.
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Educação à distância não é assunto novo para a Kroton. A companhia, pioneira no mercado de educação remota, viu o seu volume de alunos do digital crescer 18% em 2020 na comparação com 2019. Apenas no seu guarda-chuva estão marcas como Anhanguera, Unopar, Pitágoras, Fama, Unime, Uniderp e Unic, que respondem por 1.673 polos de ensino à distância distribuídos em território nacional, com meta de alcançar 2.300 polos até o fim de 2021.
Entre desafios contábeis, culturais e estruturais do setor, a companhia projeta para 2021 retomar a trajetória de rentabilidade, após uma profunda reestruturação de suas operações. Em entrevista à Forbes, Valério falou sobre os desafios da Kroton em meio à crise sanitária e apontou os possíveis rumos para o setor educacional no país.
“A tendência é de crescimento com a recuperação da economia passado a pandemia, eu sou otimista. No ponto de vista de resultados, de caixa, de satisfação e engajamento dos alunos, nosso 2021 será muito melhor que 2020. A rapidez em entregar coisas diferentes tem nos dado esse otimismo”, avalia Valério.
Segundo informações do executivo, em 2020 mais de 18 mil funcionários — entre equipes administrativas e docentes — e 850 mil alunos — contabilizando entre os que já faziam parte da modalidade EAD e presenciais que mudaram de formato com a paralisação das aulas –, tiveram que modificar suas atividades para o modo digital. “Foi uma grande operação, para atender mais 1.200 cidades onde atuamos e 13 mil turmas diferentes”, relembra.
Experiência, transição e adaptação de profissionais e alunos foram pontos essenciais na transformação exigida em meio a pandemia. Além do suporte, os treinamentos intensivos em ferramentas de tecnologias foram fundamentais para uma rápida inserção. “No dia a dia, muitos não tinham familiaridade com o digital. Mas a estrutura criada e oferecida ao longo dos anos nos ajudou a sair super bem naquele primeiro momento”, comenta o CEO.
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Apesar da superação, os números deixam registrado o tamanho do desafio enfrentado pela empresa no último ano. A Cogna, controladora da Kroton, apontou um prejuízo líquido consolidado de R$ 4 bilhões no quarto trimestre de 2020, um salto em relação à perda de R$ 168 milhões no mesmo período em 2019, mas sem efeitos no caixa. Segundo o balanço da empresa apresentado ontem (31), os últimos três meses do ano passado foram de reconhecimento de perdas no valor recuperável de ativos, que totalizou R$ 3,3 bilhões. Excluindo o abatimento de valores intocáveis e a maior quantidade de estoques, a Cogna teve prejuízo líquido ajustado de R$ 589 milhões, ainda assim pior do que o lucro de R$ 51,6 milhões um ano antes.
Na Kroton, a estratégia de negócios passou por considerável reestruturação operacional voltada à redução de custos. Entre as medidas, foram realizadas a unificação de Campus, migração de operações para parceiros, mudanças geográficas e renegociação de aluguéis. O impacto na redução das despesas administrativas das unidades foi de R$ 155 milhões em economia no último ano, representados por redução de: 18% nos gastos com locação, IPTU e condomínio; 17% utilities e facilities; 20% manutenção e expansão e 27%, custos e despesas.
Segundo Valério, o programa Fies (Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior), apesar de ter sido importante para os negócios, já não tem impactado nas receitas da Kroton.
“Países que ajudam no financiamento educacional tendem a crescer. No geral, estudantes buscam financiar os cursos mais caros e ao longo dos anos a gente foi percebendo que isso já não refletia em nossas finanças. Esse fluxo de alunos Fies praticamente acabou”, comenta o executivo.
Planos para 2021
No fim do ano passado, a Kroton anunciou a mudança do foco do ensino presencial para o EAD, com a expansão de cursos, apesar do cenário de incertezas ainda latente com a pandemia. “O mundo já estava mudando, o preconceito do ensino à distância caiu, muitos alunos migraram para o EAD porque os cursos são mais baratos. A gente já vinha trabalhando com esse foco e, quando a pandemia chegou, acelerou esse processo. Mas é importante dizer que nós continuamos oferecendo cursos presenciais e que só estamos adaptando e remanejando cursos com uma demanda menor, que podem ser realizados no formato online. Um ajuste ao novo cenário e essa nova realidade e garantir que o EAD esteja sempre disponível, de acordo com a dinâmica de cada cidade atendida”, destaca Valério.
Na Kroton, a procura por cursos EAD registrou crescimento médio de 30% em 2020. Este ano, a demanda continua em alta no formato. “Houve uma mudança de costumes e cultura, e isso gera um impacto na procura por cursos. Os presenciais continuarão em alta, mas não da mesma forma como antes da pandemia.”
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A empresa também anunciou para 2021 a intenção de ampliar vagas em cursos como direito e medicina, que demandam aulas presenciais, além de investimentos na Academia Tech: modalidade com 12 cursos de graduação e duração de até dois anos.
“Estamos entusiasmados com essa ferramenta, que tem o foco na formação rápida. É uma graduação, mas ele se forma em um ou dois anos. Tivemos parceria de empresas como Google e Amazon. Um formato bem moderno e de alta demanda. Sempre foi a nossa vocação, uma educação de qualidade e a criação de coisas práticas”, ressalta o CEO.
Lições para o setor
Com o cenário de incertezas para diversos setores em 2021, a tendência é que a educação busque, de algum jeito, formas de continuar funcionando e levando conhecimento para os lares das famílias brasileiras. Segundo Roberto, a expectativa para o fim da pandemia e a retomada das atividades presenciais é grande.
“Boa parte da crise, falando economicamente, ficou para trás. Não fizemos projeções, mas temos ótimas perspectivas para este ano: 2021 será ainda melhor que 2020 para nós. Estamos com boas medidas e iniciativas. Somos grandes, mas estamos atentos ao mercado e a toda mudança”, disse Valério.
Entre os legados e aprendizados da pandemia, o executivo destaca o “foco nas pessoas, colaboradores, alunos e a simplicidade. Estamos lidando com sonhos, que incluem famílias e histórias. Quando apostam em nós, não podemos deixar eles interromperem seus objetivos. Eles que pagam nossos salários. Só assim podemos lidar melhor com situações adversas e de grandes mudanças”, conclui o executivo.
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