As recentes projeções do Boletim Focus para a inflação e a taxa Selic sinalizam certo pessimismo por parte do mercado. O relatório reflete a percepção semanal de mais de cem instituições financeiras do país sobre os rumos da economia.
Há uma semana, a expectativa de crescimento da inflação era de 8,35%. No relatório desta semana, subiu para 8,45%. A projeção da Selic se manteve no mesmo patamar da semana anterior, em 8,25% para 2021 e 8,50% para 2022.
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Em linha com essa percepção do mercado, a última reunião do Copom (Comitê de Política Monetária), dos dias 21 e 22 de setembro, já havia anunciado a subida da Selic em um ponto percentual, de 5,25% para 6,25%. Esta foi a quinta elevação do ano, e trouxe a taxa para o nível mais alto desde julho de 2019.
Em geral, o mercado financeiro antecipa essas medidas na precificação dos ativos. Ainda assim, a divulgação de mudanças nas projeções sempre causa algum ruído.
Por mais que a gente saiba que acompanhar notícias não é uma conduta estratégica para quem investe pensando no longo prazo, vivemos em um país com histórico complicado em termos de previsibilidade. Isso acaba motivando reações mais imediatistas por parte dos investidores.
Além disso, a instabilidade política afasta o investidor estrangeiro, que, para se proteger, vende seus ativos no Brasil e transforma reais em dólares, que voltam para o exterior. A consequência direta é que a moeda norte-americana sobe e os preços disparam. Lei de oferta e demanda, simples assim.
Temos ainda a questão das commodities. A vacinação avançou, e há claros sinais de retomada, com Estados Unidos e China voltando a consumir em larga escala. Com isso, os produtores de milho, arroz e soja, por exemplo, não têm motivos para orientar suas vendas ao mercado interno, a menos que tenham aqui ganhos equivalentes aos que têm no mercado externo. Este é mais um fator que eleva a inflação.
Na economia, tudo está interligado. Sem estabilidade política que possibilite diálogo entre os Poderes e viabilize as reformas que são necessárias para propiciar um crescimento econômico sustentável e de longo prazo, subir a Selic acaba sendo o remédio amargo inevitável.
Do ponto de vista da economia real – aquela que impacta seu bolso na gôndola do supermercado, na bomba de combustíveis ou nas tarifas dos serviços púbicos –, com tudo o que o país vem passando desde o início da pandemia, e com quase 14 milhões de desempregados, o momento é bem ruim para a alta de juros.
O aumento desacelera a economia justamente quando ela precisa de estímulos para a retomada. Mas, com a inflação crescente, a Selic continuará sendo a solução disponível, pois o real problema do Brasil é de ordem fiscal e tributária.
Enquanto não conseguirmos resolver essas questões, continuaremos afugentando investidores estrangeiros, favorecendo a alta do dólar e não crescendo de acordo com o real potencial que o país possui.
Se tivéssemos uma política econômica menos pautada por interesses político-partidários e mais focada no crescimento da economia, provavelmente a Selic não precisaria ter chegado a patamares tão baixos como chegou nos últimos anos.
Isso está intimamente ligado à ausência de austeridade nos gastos públicos ao longo de sucessivos governos, e à baixa capacidade de articulação política para viabilizar as reformas necessárias.
Ao longo de 2019 e de 2020, a decisão do governo de baixar a Selic a níveis nunca antes vistos foi a medida encontrada para equilibrar as contas públicas.
Ao cortar juros, o governo barateou sua dívida, cujo maior peso está na LFT (tesouro Selic). Mas, historicamente, o cobertor é curto no Brasil. Sendo assim, aos olhos do investidor, juros baixos demais equivalem a uma relação risco/retorno muito ruim.
Dessa forma, o remédio paliativo adotado para equilibrar as contas públicas agora traz seus efeitos colaterais, entre eles, a necessidade de subir novamente a Selic.
Como o aumento da Selic mexe na economia?
A inflação é o que mais pesa na decisão do Banco Central para aumentar a taxa Selic. Claro que o nível de atividade econômica e a taxa de desemprego influenciam, mas a inflação é critério decisivo.
Alta do dólar, alta dos preços internacionais das commodities, como o petróleo – tudo isso vem impactando fortemente nossa economia. Temos ainda a crise hídrica aumentando o custo da energia elétrica, o que pesa tanto na vida do consumidor pessoa física, quanto nos custos de produção de bens e serviços das empresas.
Todos esses elementos tendem a continuar pressionando a inflação até o final do ano. Consequentemente, o cenário dos investimentos também passa por variações.
O que muda nos seus investimentos?
Esta pergunta é recorrente nas minhas redes sociais. Aqui, eu quero devolver a pergunta a você: o que mudou nos seus objetivos e na sua capacidade de aporte? Esta é a questão mais importante que você precisa responder.
Claro que com as mudanças no cenário econômico, talvez você precise rebalancear a sua carteira e, eventualmente, fazer mudanças que a deixem mais próxima de oferecer os resultados que você busca.
Neste momento em que a renda fixa está oferecendo vários investimentos com taxas atrativas, para muita gente é tentador fugir da volatilidade da renda variável.
Mas, antes de aplicar naquele CDB que oferece mais de 10% ao ano, ou em algum título do tesouro, a pergunta que você precisa se fazer é: descontada a inflação e o imposto de renda, o rendimento líquido que eu vou receber vai me garantir o valor que eu busco no intervalo de tempo que o dinheiro ficará aplicado?
Se a resposta for sim, então não há nada de errado em ficar na renda fixa.
Mas se você precisa de mais dinheiro do que as aplicações de renda fixa podem lhe proporcionar, vale buscar na renda variável as oportunidades que tenham perspectiva de oferecer o retorno que você necessita para aquele determinado período de tempo. E oportunidades não faltam.
Minha orientação permanece fiel ao que ensino aos meus alunos: tenha um planejamento claro quanto aos seus objetivos de curto, médio e longo prazo. Coloque tudo no papel. Com isso, você sempre terá como aproveitar as melhores oportunidades em cada cenário.
Isso é importante, porque se você não tiver total clareza quanto ao rendimento que precisa, escolher onde aplicar o dinheiro torna-se uma loteria. E investimento, seja em renda fixa ou variável, não é um jogo, não é aposta. Investimento eficiente é a combinação de estudo e planejamento.
Eduardo Mira é formado em telecomunicações, com pós-graduação em pedagogia empresarial e MBA em gestão de investimento. É analista CNPI, certificado CPA10 e CPA20, ex-gerente do Banco do Brasil e da corretora Modal.
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