O quadro fiscal de 2023 gera preocupação diante da discussão sobre continuidade de medidas temporárias implementadas pelo governo, disse hoje (15) o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto.
Em debate sobre inflação promovido pelo Instituto Millenium, Campos Neto afirmou que a questão é como será o financiamento dessas medidas a partir do ano que vem, em referência aos programas sociais reforçados temporariamente pelo governo e o Congresso.
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“Vocês têm um instituto liberal então conhecem uma frase famosa: não existe nada mais permanente do que um programa temporário do governo, isso é uma coisa que nos aflige. Hoje o mercado tem uma ansiedade para entender como vai ser o fiscal do ano que vem, os programas que foram implementados, se forem continuados, como serão financiados”, disse.
Líderes nas pesquisas de intenção de voto, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente Jair Bolsonaro já prometeram manter o valor do Auxílio Brasil em 600 reais a partir do ano que vem. A medida em vigor hoje permite o pagamento adicional apenas até dezembro, com o benefício retornando ao patamar de 400 reais em janeiro do ano que vem.
Embora tenha demonstrado preocupação com o futuro das contas públicas, Campos Neto afirmou que o fiscal teve surpresa muito positiva, ressaltando que o governo “não caiu na tentação de indexar” ao, por exemplo, não reajustar os salários do funcionalismo público.
Na apresentação, o presidente do BC disse que as expectativas do mercado para a inflação a partir do ano que vem têm subido e que há uma diferença entre a interpretação de analistas e a do BC. Segundo ele, a razão está no fato de o mercado fazer uma correlação mais alta entre expectativa para 2023 e dados correntes, além de haver diferenças nas análises de componentes como os industriais e o hiato da atividade.
A estimativa mais recente do BC aponta para um IPCA em 6,8% no fim de 2022, 4,6% em 2023 e 2,7% em 2024. O mercado, conforme boletim Focus divulgado nesta segunda, projeta o índice em 7,02% neste ano, 5,38% em 2023 e 3,41% em 2024, com movimento de queda no ano corrente e alta nos exercícios seguintes.
O presidente do BC destacou a surpresa positiva no mercado de trabalho brasileiro, afirmando que “nunca imaginaria” estar falando em taxa de desemprego abaixo de 9%.
Enfatizando ser difícil estimar a taxa neutra de desemprego no país –que não pressiona nem desacelera a inflação–, ele afirmou que ainda há margem no mercado de trabalho e estimou que o dado provavelmente cairá para perto de 8,5%.
Nos três meses até junho, último dado disponível, o desemprego no país recuou a 9,3%, menor patamar para o período desde 2015, segundo dados do IBGE.
FOCO DE 2024
Após o BC decidir dar ênfase à inflação acumulada em doze meses no primeiro trimestre de 2024, que agora faz parte do horizonte relevante da política monetária, Campos Neto disse que essa opção foi feita porque o BC entendeu que melhoraria a “função reação” do BC.
“Estamos ainda olhando o que é a meta no ano fechado, mas nosso horizonte é ajustado”, disse.
No período de 12 meses encerrados no primeiro trimestre de 2024, o BC projeta uma inflação de 3,5%.
Na decisão do Comitê de Política Monetária no início de agosto, a autoridade monetária disse que o modelo foi adotado porque suaviza os efeitos diretos das mudanças tributárias implementadas pelo governo este ano, com desonerações temporárias que se encerram em dezembro.
Campos Neto disse nesta segunda que a inflação atual claramente teve melhora após as medidas, mas ainda é necessário entender como as iniciativas vão se dissipar nas cadeias.
“A gente olha a inflação mais no longo prazo, o nosso horizonte relevante é mais longe, a gente não é tão guiado pelo instante.”
Ele ressaltou que preços administrados –impactados pelas reduções tributárias– estão caindo, mas serviços ainda estão em alta.
Sobre o cenário externo, o presidente do BC afirmou que pode estar se iniciando nos Estados Unidos uma janela de baixa do crescimento econômico, com risco de recessão, e inflação ainda elevada. “Essa é a janela que me preocupa”, disse.
Ele ponderou que o componente de desaceleração da atividade global tende a ser mais forte sobre a inflação brasileira do que a depreciação cambial que seria gerada por uma fuga de capitais com a alta de juros em economias avançadas.
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