O Ministério da Fazenda e o relator do arcabouço fiscal, Cláudio Cajado (PP-BA), querem evitar que a proposta sofra novas alterações até a votação na Câmara, afirmaram à Reuters o deputado e duas fontes da pasta, com percepção no governo de que iniciativas de última hora para ajustar a medida podem desfigurar o texto.
Cajado disse à Reuters que vai trabalhar para manter o parecer já apresentado, numa indicação de que deverá rejeitar as emendas apresentadas por deputados, ponderando que estuda todas as sugestões apresentadas e as levará para avaliação em conjunto do governo e líderes partidários. Só o que tiver consenso deve ser inserido.
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“Eu persegui esse equilíbrio, fui exaustivo em encontrar o ponto de equilíbrio para que o texto pudesse contemplar a todos, se não totalmente, pelo menos medianamente”, destacou.
Após a apresentação do relatório, a proposta tramita na Câmara em regime de urgência e tem votação em plenário prevista para quarta-feira (24). No total, 40 emendas foram apresentadas ao projeto – metade para endurecer o controle das contas públicas.
Há propostas para reduzir a trajetória de gastos, limitar desembolsos adicionais em investimentos e retirar o piso para crescimento das despesas, entre outras. No sentido contrário, deputados de esquerda sugerem a preservação de áreas como educação, meio ambiente e social, além de dar maior flexibilidade aos gastos.
De acordo com uma fonte da Fazenda, a pasta entende que a possibilidade de rebelião da base, especialmente por parte do PT, está contida, sob o entendimento de que tentar mexer no texto poderia gerar resultado negativo ou até um endurecimento ainda maior da proposta.
“Apesar de a possibilidade de emendas petistas que afrouxem o projeto estar mais distante, há outras formas de tentar desfigurar, por exemplo, fazendo sugestões informais ao Cajado para que ele mexa no parecer”, disse a fonte, ressaltando ser mais difícil fazer o controle político desse lobby direto sobre o relator.
Uma segunda fonte da pasta avaliou que o texto apresentado por Cajado está equilibrado e que “quanto menos mexer, melhor”. Para essa autoridade, o resultado das negociações é positivo.
“Nem a que saiu daqui e nem o relatório representam 100% do que acredito ser ideal, mas não tem que ser a que eu quero, e sim a que é possível, equilibrando diferentes visões”, afirmou.
Ainda assim, o texto não conta com apoio integral na Esplanada. Uma terceira autoridade da área econômica ouvida pela Reuters, que fez parte da elaboração da medida e falou sob condição de anonimato, afirmou que o resultado final enrijeceu a regra e dificulta uma sustentabilidade de longo prazo.
Na avaliação dessa fonte, o texto atual tem normas demais, será de difícil entendimento para investidores estrangeiros e é pouco flexível ao tornar permanentes os parâmetros para evolução dos gastos — a proposta original previa que cada governante estabeleceria esses critérios para os quatro anos seguintes.
“Vai acontecer como no teto, regra fixa impossível de se ajustar no tempo, em breve estaremos discutindo tudo de novo”, afirmou.
Para essa fonte, caberia ao governo estudar a necessidade de negociar mais mudanças no texto, acrescentando que essa avaliação envolveria discussões mais amplas de longo prazo.
Novos pedidos de exclusão
Enquanto a equipe econômica digere o texto conseguido, Cajado conta, sem dar detalhes, que também tem recebido diretamente outros pedidos de exclusão de despesas dos limites impostos pela nova regra fiscal, como as de fundos ligados às Forças Armadas.
Nesta sexta (19), em conversa com jornalistas, o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, disse que, embora não participe diretamente, há pedidos dos militares para ficarem de fora de limitações do arcabouço.
“O relator me telefonou dizendo que tem dificuldade nisso, que isso pode ser tratado noutra área a posteriori. Mas pedir não é pecar.”
A regra geral da proposta estabelece que as despesas federais não poderão crescer mais do que 70% da alta das receitas, além de definir que os gastos crescerão anualmente entre 0,6% e 2,5% acima da inflação.
O texto enviado ao Congresso pelo Ministério da Fazenda definia que em caso de descumprimento da meta fiscal, que terá uma margem de tolerância, o crescimento dos gastos passaria a ser limitado a 50% da alta da receita.
O relator adicionou a essa punição uma série de gatilhos automáticos de ajuste fiscal, como impedimento para criar cargos, reajustar auxílios de servidores, aumentar despesas obrigatórias e conceder ou ampliar benefícios tributários.
Pelo texto, se o governo quiser suspender ou amortecer esses gatilhos, terá que enviar um projeto ao Congresso para pedir essa autorização, além de fazer uma compensação por meio de ajustes em outras áreas.