Em se tratando de política fiscal, as consequências têm muito peso nos rumos da economia do país, e seus efeitos podem impactar resultados por um longo tempo, daí a importância de compreender o que é o risco fiscal e, dessa forma, estruturar seu planejamento buscando blindá-lo de efeitos potencialmente grandes em seus ganhos.
O que é risco fiscal
O risco fiscal representa a possibilidade de um país não conseguir honrar seus compromissos financeiros devido a um descontrole entre receitas (impostos, por exemplo) e despesas públicas.
Quando um governo mantém gastos superiores às receitas sem apresentar medidas concretas para reequilibrar as contas, surgem os déficits fiscais. Esses déficits acumulados levam ao aumento da dívida pública e comprometem a credibilidade do país.
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Consequentemente, o mercado financeiro reage com desconfiança, afetando a percepção de investidores em relação à estabilidade econômica. Esse ciclo de desconfiança gera impactos amplos na economia e se reflete diretamente em seus investimentos.
Por que o risco fiscal é importante
O risco fiscal não é apenas um problema técnico; ele afeta o cotidiano das empresas, das famílias e, claro, do investidor. Suas consequências incluem:
- Juros elevados: Para atrair investidores dispostos a comprar títulos públicos, o governo precisa oferecer taxas de retorno mais altas. Isso aumenta o custo da dívida pública e reduz a disponibilidade de recursos para áreas como infraestrutura e saúde.
- Desvalorização do real: A perda de confiança faz com que a moeda local se desvalorize em relação a moedas fortes, como o dólar. Isso aumenta os custos de importação e pressiona a inflação.
- Crédito mais caro: Com juros mais altos, o custo de financiamentos sobe para empresas e consumidores, freando o crescimento econômico.
- Impactos a longo prazo: Juros elevados, inflação e crédito caro criam um ambiente econômico menos dinâmico, prejudicando o crescimento e a geração de empregos.
Como o governo Lula está abordando o risco fiscal?
A equipe econômica liderada pelo ministro Fernando Haddad vem prometendo uma série de medidas para equilibrar a responsabilidade fiscal com os gastos do governo e o endividamento público crescente.
Numa busca por dar soluções aos problemas criados pelo próprio governo, os principais pilares das mudanças são:
- Aumento da arrecadação: medidas como maior fiscalização no comércio eletrônico e discussões sobre tributações específicas, incluindo setores de alto lucro, buscam incrementar as receitas públicas.
- Controle de gastos: o arcabouço fiscal, aprovado em 2023, limita o crescimento das despesas à expansão das receitas. Essa medida cria previsibilidade e disciplina no orçamento público, enviando sinais positivos ao mercado.
- Reforma tributária: em tramitação no Congresso, a reforma tributária é uma tentativa histórica de simplificar o sistema fiscal brasileiro, que há décadas é considerado um dos mais complexos do mundo. Propostas como o PLP 68/2024 e o PLP 108/2024 buscam unificar tributos sobre consumo e criar um Comitê Gestor para melhorar a gestão tributária.
- Estímulo ao crescimento econômico: programas como a Nova Indústria Brasil (NIB) e o Acredita, focados em reindustrialização e acesso ao crédito para microempreendedores, refletem esforços para fortalecer a base produtiva do país.
O desafio do governo: realizar um ajuste com credibilidade
Para reverter esse ciclo de instabilidade, o governo precisa sinalizar um ajuste fiscal confiável, capaz de equilibrar as contas públicas no curto e médio prazo. Contudo, há uma clara dificuldade política em consolidar e anunciar um pacote robusto de medidas.
A ausência de um plano fiscal consistente amplifica os temores do mercado e aumenta a percepção de risco, dificultando ainda mais a recuperação da confiança necessária para estabilizar a economia e atrair novos investimentos.
Esse cenário exige, além de medidas técnicas, também um compromisso político sólido para mitigar os impactos do risco fiscal e reconstruir a credibilidade econômica do país.
Como o risco fiscal impacta seus investimentos
Como mencionei no início deste artigo, você não deve alterar sua estratégia a cada nova notícia de mercado, porém, entender o cenário e os riscos de curto, médio e longo prazo é relevante para que seu planejamento esteja em linha com o cenário, evitando surpresas.
- Títulos públicos: quando o risco fiscal aumenta, o mercado exige taxas de juros mais altas para comprar títulos do governo, como o Tesouro Direto. Isso pode ser bom para quem já está investindo em renda fixa, mas ruim para o país, que precisará gastar mais para pagar esses juros.
- Bolsa de valores: o aumento do risco fiscal costuma afastar investidores estrangeiros, levando à desvalorização de ações na bolsa de valores. Empresas com grandes dívidas, em especial, sofrem mais nesse cenário, pois o custo do crédito aumenta.
- Câmbio: a desvalorização do real frente ao dólar afeta negativamente investimentos em moeda estrangeira, como fundos internacionais, além de elevar os custos de importação para empresas.
- Inflação e consumo: com o aumento da instabilidade fiscal, o governo pode recorrer à emissão de moeda para cobrir despesas, gerando inflação. Isso corrói o poder de compra e afeta a performance de investimentos em renda fixa indexados à inflação.
Oportunidades de investimento
Embora o risco fiscal traga desafios, ele também apresenta oportunidades. Taxas de juros elevadas tornam a renda fixa mais atraente, enquanto momentos de desvalorização na bolsa podem abrir portas para quem busca investir em boas empresas a preços descontados.
Manter-se informado sobre as políticas em andamento e suas implicações econômicas é o verdadeiro diferencial para investir de forma consciente. Como o risco fiscal demonstra, economia e confiança caminham juntas – e confiança não se constrói com promessas, mas com ações concretas.
Risco fiscal x confiança econômica
O desafio do governo não é apenas técnico, mas também político. Recuperar a confiança do mercado na gestão fiscal é essencial para atrair capital estrangeiro e estimular o crescimento econômico.
Embora ainda haja ceticismo, medidas como o arcabouço fiscal e a reforma tributária sinalizam esforços para criar um ambiente mais previsível e sustentável.
Para o investidor, o aprendizado é claro: compreender o cenário econômico e seus desdobramentos é essencial para alinhar sua estratégia de alocação de recursos. No curto prazo, juros elevados podem beneficiar a renda fixa; no longo prazo, apenas um ambiente de confiança pode fomentar um mercado de ações dinâmico e sustentável.
A lição, portanto, é clara: a relação entre política fiscal e investimentos não é casual, é causal. Afinal, a economia é, em última análise, um reflexo da confiança que a sustenta. E confiança, como no caso do risco fiscal, não é construída no discurso, mas na prática.
Eduardo Mira é investidor profissional, analista CNPI, pós graduado em pedagogia empresarial, coordenador do MBA em Planejamento Financeiro e Análise de Investimentos da Anhanguera Educacional, sócio do Clube FII e sócio fundador da holding financeira MR4 Participações.
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