Se você também passou as madrugadas olímpicas assistindo às competições de skate, com certeza viu Leticia Bufoni mandando manobras na pista de Tóquio. Seus cabelos tingidos de rosa não passam despercebidos, é verdade, mas a brasileira é um dos maiores nomes no cenário mundial do esporte, incluído pela primeira vez nos Jogos Olímpicos na edição de 2020.
Leticia foi uma das representantes do Brasil na categoria Street, ao lado de Rayssa Leal – a fadinha – e Pâmela Rosa. Das três, apenas Rayssa conseguiu se classificar para a final, garantindo a medalha de prata. E Leticia, que jamais imaginou que um dia participaria de uma Olimpíada, ficou com gosto de quero mais. “Quando eu era mais nova, pensava que, se um dia fosse aos Jogos Olímpicos, iria querer me aposentar logo depois. Mas agora que aconteceu, estou muito ansiosa para a próxima edição e quero participar de várias. Quem sabe trazer uma medalha?”, almeja.
VEJA TAMBÉM: 5 Olimpíadas mais caras da história
Após lesões em 2019 e a perda de etapas classificatórias, Leticia acreditava que não conseguiria participar da Olimpíada. Conseguiu muito mais: às vésperas de embarcar para Tóquio, a brasileira se tornou a mulher com mais medalhas na história dos X Games em sua categoria ao ganhar o sexto ouro na competição, considerada a principal para esportes radicais. Ao todo, a brasileira garantiu 12 medalhas em suas participações.
Aos 28 anos, a atleta foi apontada como referência por duas medalhistas olímpicas: além de Rayssa, sua fiel companheira em Tóquio, Sky Brown, skatista britânica que levou o bronze na categoria Park também elogiou a brasileira. As duas têm apenas 13 anos. Por isso, Leticia começou a ser chamada de Xuxa nas redes sociais, apelido que ela recebe com carinho. “É incrível saber que tem meninas mais jovens se inspirando em mim, seguindo meu caminho. Foi muito gratificante estar ao lado delas nos Jogos, dá orgulho”, conta.
Quando começou a andar de skate, aos nove anos, Leticia não tinha em quem se espelhar. Diferentemente das jovens que querem apostar no esporte atualmente, ela não teve uma referência para mostrar aos pais e ganhar o incentivo para investir no esporte. “Meu papel é incentivar mais meninas a andar de skate, a ganhar medalhas e a continuar competindo e evoluindo”, afirma.
E o efeito já pode ser sentido. De acordo com levantamento do site Cuponeria, a busca por skates no e-commerce cresceu 614% no mês de julho. A atleta avalia que o crescimento do interesse pelo esporte no país pode atrair mais investimento. “Com o skate em evidência, sendo divulgado na mídia, podemos ganhar mais centros de treinamento. Seria incrível se a seleção pudesse treinar em seu próprio país, mas a equipe teve que viajar para os Estados Unidos. Seria ótimo ter espaços para todos os skatistas do Brasil”, declara.
Leticia se mudou para os Estados Unidos aos 14 anos, quando foi chamada para participar do primeiro X Games. Na época, não tinha empresário ou equipe para dar apoio. A família nem sempre pôde estar presente e ela precisou aprender a cuidar de si mesma. “Fiquei praticamente sozinha, contando com a ajuda de algumas pessoas mais velhas, mas não é a mesma coisa que o apoio da família. Eu não queria ser profissional, vencer, eu só queria andar de skate”, relembra.
A menina que sofria preconceito na infância e ouvia comentários maldosos dos vizinhos – “me chamavam de Maria João por usar roupas masculinas, porque eu não sabia que podia me vestir de outra forma para andar de skate” – no bairro de Vila Matilde, em São Paulo, profissionalizou-se em território norte-americano e ganhou a primeira medalha do X Games em 2013, na edição realizada em Foz do Iguaçu. Nas pistas, exibe o seu próprio estilo: além dos cabelos rosa, a skatista costuma competir usando calças legging e maquiagem. Para ela, o mais importante é o conforto.
LEIA TAMBÉM: Rayssa Leal ganha prata no skate e se torna mais jovem medalhista olímpica do Brasil
No Instagram, a atleta reúne mais de 4 milhões de seguidores que acompanham o seu dia a dia radical. Com a visibilidade que ganhou durante os Jogos, teve aumento no engajamento, o que facilitará as negociações para uma outra frente: ela também atua como influenciadora digital. “É impressionante a quantidade de fã-clubes que surgiram e estão me divulgando. São pessoas que nem acompanhavam skate e, agora, diariamente recebo mensagens perguntando sobre as próximas competições ou com histórias de quem comprou skate ou recuperou o que estava esquecido no armário”, conta.
Além dos patrocínios que recebe como atleta – como da Nike, GoPro e Red Bull, das brasileiras Petrobras e Oi, assim como de outras marcas mais conectadas ao skate, como a Grizzly –, Letícia também tem contratos para monetizar sua influência digital com nomes como Australian Gold, de bronzeador, e Sea Doo, de jet-ski.
O ano de 2021 está sendo de realizações para a atleta. Ela conseguiu competir em Tóquio com a sua própria marca de shape de skate, um sonho que já cultivava há quase 10 anos. Depois de uma tentativa que não deu certo, por falta de tempo para se dedicar ao projeto e de pessoas comprometidas com a ideia, ela recebeu o convite da marca norte-americana Dwindle, distribuidora de skates, para criar seu próprio shape. “Já tive vários patrocinadores antes, mas nunca conseguia opinar nos lançamentos. Minha maior vontade era ter controle do que acontecia e criar o melhor shape para qualquer idade, de iniciantes a profissionais”, explica.
A Monarch, que vinha sendo concebida há cerca de um ano e meio, teve sua estreia oficial nas pistas de Tóquio e conta com uma sócia muito especial: Sky Brown. “Já éramos bem amigas e eu acredito no potencial dela. Somos muito parecidas, então ela foi o par perfeito para criar a marca.” No momento, os shapes estão sendo vendidos num e-commerce próprio, com entrega internacional, mas Leticia espera que eles também estejam disponíveis fisicamente no Brasil até abril de 2022.
Atualmente quarta colocada da categoria Street no ranking mundial, Leticia não nega que sente pressão pela posição que ocupa. “Já venho competindo há tantos anos, já ganhei todos os campeonatos, então há uma expectativa em cima de mim, de que vou ganhar medalha. Eu mesma me coloco essa pressão porque gosto de vencer e estar no pódio”, confessa. Mas, se o brasileiro aprendeu alguma coisa com o supletivo de skate feito durante a Olimpíada, é de que cair faz parte. “Isso é o mais importante. Conseguimos transmitir a energia do skate, de que não precisa andar para seguir esse estilo de vida e também não precisa ser profissional para se divertir”, finaliza.
Facebook
Twitter
Instagram
YouTube
LinkedIn
Siga Forbes Money no Telegram e tenha acesso a notícias do mercado financeiro em primeira mão
Baixe o app da Forbes Brasil na Play Store e na App Store.
Tenha também a Forbes no Google Notícias.