Os resultados financeiros da Motorola no último trimestre de 2020, divulgados no mês passado, trouxeram uma notícia boa para a diretoria: após 10 anos fiscais consecutivos, a empresa apresentou lucro em todas as regiões do globo. Mesmo em um ano de dificuldades impostas à indústria por conta da pandemia da Covid-19, a fabricante de eletrônicos assegurou o bom desempenho de vendas na América Latina, a principal área comercial da empresa, e conquistou incremento de dois dígitos em áreas antes adormecidas, como Europa e Ásia.
Na liderança dessa estratégia de crescimento e estímulo dos mercados em continentes diversos está o presidente global da Motorola, o brasileiro Sergio Buniac. Executivo que fez carreira na corporação, Buniac começou como gerente de marketing e vendas em 1996, chegou a ser presidente para a América Latina em 2012, até que, em fevereiro de 2018, passou a ocupar a cadeira de CEO mundial. Além das mudanças de cargos, nesses 25 anos o executivo presenciou mudanças de gestão e estratégia na empresa, causadas pela compra da Motorola pelo Google, em 2011, e pela Lenovo, em 2014.
Em pouco mais de três anos na presidência global da corporação, Buniac fez a Motorola diminuir consideravelmente seu prejuízo operacional, além de apresentar cinco trimestres consecutivos de lucro antes de impostos entre outubro de 2018 e dezembro de 2019. De acordo com os relatórios financeiros da Lenovo, a fabricante de celulares saiu de um prejuízo de US$ 738 milhões para US$ 43 milhões entre os anos fiscais de 2016 e 2020, respectivamente. Parte dessa melhora financeira é atribuída à gestão do executivo.
Nesse intervalo, assim como o prejuízo operacional diminuiu, o faturamento também. Entre os anos fiscais de 2016 e 2020, a Motorola saiu de uma receita de US$ 7,7 bilhões para US$ 5,2 bilhões, respectivamente, uma queda de 32%. Embora a corporação tenha uma menor entrada de recursos, Buniac, em entrevista exclusiva à Forbes, revela que o tíquete médio por aparelho aumentou nos últimos anos, além de a empresa ter enxugado custos e descontinuado produtos sem retornos relevantes.
Em uma comparação direta entre 2020 e 2019, o preço médio unitário dos dispositivos da Motorola cresceu 18%, indicando um menor volume de vendas, mas com maior receita proporcional. “Não adianta vender um monte de telefone barato”, diz Buniac. “Estamos crescendo no valor por unidade agora porque retornamos ao segmento premium depois de uns dois ou três anos fora.”
O IMPACTO DA PANDEMIA
No seu último trimestre de 2018, a Motorola registrou receita de US$ 1,6 bilhão. No entanto, o número mais importante daquele relatório financeiro era outro. Pela primeira vez desde a aquisição pela Lenovo, em 2014, a Motorola obteve US$ 3 milhões de lucro antes de taxas e impostos.
Durante o ano de 2019, a situação se repetiu, e a companhia apresentou lucro em todos os trimestres. A situação caminhava para um sexto trimestre consecutivo de resultados operacionais positivos. Até que chegou 2020. No exato último dia de 2019, o primeiro caso de Covid-19 foi registrado na cidade de Wuhan, na China, local onde a corporação possui uma de suas principais fábricas de smartphones e eletrônicos.
Com uma de suas principais plantas no primeiro epicentro da pandemia, a Motorola teve de se adaptar à nova realidade. “A nossa vida em um mundo com a Covid-19 começou dois meses antes de todo mundo”, afirma Buniac. “Imagine que ninguém entendia muito do que se tratava [a doença] e nós tivemos de estabelecer procedimentos nas fábricas rapidamente.” Depois de alguns meses de adequação, a corporação pôde replicar seus modelos de segurança em outras fábricas na Argentina, Brasil e Índia.
Os resultados financeiros da empresa, que vinham em uma crescente, no entanto, sofreram os impactos da paralisação parcial das fábricas, acesso dificultado aos componentes e a transferência de parte da força de trabalho para casa. Os nove primeiros meses do ano passado, somados, trouxeram prejuízo operacional de US$ 132 milhões, acabando com a sequência de cinco trimestres de lucro.
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A situação, porém, retomou os patamares de 2019 nos últimos três meses do ano, apresentando uma receita de US$ 1,5 bilhão e lucro antes de impostos de US$ 10 milhões, o maior valor da Motorola após a aquisição pela Lenovo. “[2020] não foi um ano fácil, e eu nem quero dourar a pílula”, diz Buniac. “Tivemos nosso momento de queda, mas também tivemos nosso momento de recuperação.” Segundo o executivo, a agilidade para reagir e o trabalho em equipe fizeram toda a diferença.
Embora a crise sanitária tenha causado um impacto nos resultados da empresa, para Buniac foi apenas um desvio de percurso. No último trimestre de 2020, a companhia apresentou lucro em todas as regiões em que atua: América do Norte, América Latina, Europa, Ásia e Oriente Médio. Algumas áreas, antes adormecidas, tiveram ganhos de receita de dois dígitos, como foi o caso da América do Norte (17%) e Europa (82%), em comparação ano sobre ano, entre 2020 e 2019.
QUALIFICAÇÃO DO PORTFÓLIO
O ano de 2020, embora diretamente impactado pela pandemia de Covid-19, trouxe mudanças profundas não apenas nos resultados financeiros da Motorola, mas também em seu portfólio de produtos. Durante o ano passado, a corporação descontinuou aparelhos e retornou a um segmento de mercado mais premium, dos smartphones mais potentes, os chamados flagships, com o celular de tela dobrável Razr e o Edge.
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Esses dois principais produtos marcaram não só o lançamento de smartphones premium, como também a aposta da Motorola no 5G para alcançar novos mercados e usuários. “Acredito que a tecnologia vai trazer um novo crescimento, principalmente de valor [unitário de aparelhos], um pouco menos em número de unidades”, diz Buniac. O executivo aposta que a nova rede de dados móveis causará um impacto positivo no dia a dia do consumidor, principalmente no que tange à alta velocidade, para downloads e uploads, e o baixo tempo de resposta para execução de comandos.
E não são apenas os celulares flagships lançados pela Motorola no ano passado que são compatíveis com a tecnologia 5G. A linha intermediária de smartphones Moto G, que possui preços entre R$ 1.500 e R$ 3.600, também teve um aparelho com essa especificação técnica: o Moto G 5G, lançado em dezembro.
O incremento da linha intermediária tem sido uma aposta da companhia para atrair novos consumidores para a marca. Neste mês, a empresa anunciou uma edição comemorativa, o Moto G100, que possui especificações técnicas de alta performance, como, por exemplo, um processador Snapdragon 870, o que dá maior velocidade e fluidez no funcionamento do aparelho.
CICLO DE PRODUTOS ACELERADO
Para lançar três smartphones diferentes em apenas um ano, a gestão de Buniac na Motorola tem feito um trabalho de aceleração do ciclo de produtos e aproximação com o consumidor. Nos últimos três anos, conta o executivo, o tempo que a companhia demorava para idealizar um smartphone e colocá-lo à venda no mercado foi reduzido em 33%. Essa agilidade possibilitou um maior número de lançamentos por ano. “Não adianta ter uma ideia boa e demorar quatro anos para executá-la”, afirma o CEO.
Para encurtar esses ciclos, o executivo diz que a empresa precisou realizar com mais frequência as pesquisas com o consumidor. “Antigamente, o nosso time de engenharia demorava meses, até um ano, para entender o que os usuários pensavam [de um smartphone]”, conta. “Hoje, você compra um aparelho, recebe um questionário de satisfação no segundo dia e outro no 30º dia.” Com esse retorno, diz Buniac, foi possível decifrar a cabeça do cliente e entregar produtos mais assertivos.
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