A exploração espacial está muito em voga nos últimos anos, graças às façanhas de bilionários como Jeff Bezos e Richard Branson. Mas enquanto suas aventuras focadas no turismo podem ter ganhado as manchetes ultimamente, uma indústria ativa tem pressionado mais silenciosamente com experimentos e projetos que podem ter um enorme impacto no futuro da humanidade – tanto aqui na Terra quanto lá fora, será que o homem estaria pronto para estabelecer outros novos mundos.
A ISS (Estação Espacial Internacional), laboratório espacial que entrou em órbita em 1998, por exemplo, abriga atualmente cerca de 200 experimentos. Entre eles estão os estudos do impacto a longo prazo da exposição a ambientes de baixa gravidade para medir os níveis de dióxido de carbono na Terra. Um número significativo deles está focado em alimentos e na agricultura – e a única razão para isso é que, uma vez que eventualmente o homem deixe este planeta para assentamentos na Lua ou mesmo em Marte, provavelmente seria útil se soubéssemos como cultivar alimentos nesses ambientes.
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No entanto, esse não é o único motivo. Está rapidamente se tornando claro que, mesmo na Terra, a humanidade terá dificuldades para alimentar sua população cada vez maior, principalmente levando em consideração as mudanças climáticas e o aquecimento global. Espera-se que os experimentos no espaço levem a novos desenvolvimentos e descobertas científicas que ajudem a nos manter alimentados e saudáveis, onde quer que acabemos no universo.
O futuro do alimento no espaço
Para discutir o progresso que está sendo feito, participei de um webinar de Chris Hadfield – um ex-comandante da ISS e um dos astronautas mais famosos do mundo, bem como Ilan Sobel, CEO da Bioharvest Sciences. A Bioharvest desenvolveu metodologias de cultivo de células vegetais em biorreatores de uma maneira que não altera a sua estrutura molecular para criar extratos que retêm todas as propriedades de saúde e bem-estar da planta original. Até agora, eles criaram matéria celular de uvas vermelhas, azeitonas, romãs e até cannabis.
Hadfield começou me contando como ter orbitado o mundo cerca de 2.600 vezes deu a ele uma nova perspectiva sobre o planeta e os problemas que estamos enfrentando. Durante sua carreira de mais de 20 anos como astronauta, ele voou no espaço três vezes, pilotou o ônibus espacial duas vezes, ajudou a construir duas estações espaciais e se envolveu em 15 horas de caminhada espacial extra-veicular.
Sua crença é que a próxima década de viagens espaciais contará a história do estabelecimento dos primeiros assentamentos permanentes fora do planeta Terra – na lua – e talvez até o início da jornada através do “enorme oceano do espaço” entre nós e Marte – nosso vizinho planetário mais próximo que pode ser capaz de sustentar a vida humana. Segundo Hadfield, as “tecnologias como as que a Bioharvest está criando, vão nos alimentar nessa viagem”.
Ele começou a trabalhar com a Bioharvest quando a empresa se envolveu com um programa chamado DSFC (Deep Space Food Challenge). Instigado pela NASA (Agência Espacial Americana) e várias outras agências, incluindo a Agência Espacial Européia, o DSFC visa descobrir novas soluções baseadas em tecnologia para os problemas de alimentação de astronautas que estão longe da Terra por longos períodos de tempo. Ao fazê-lo, espera-se também que descubra soluções para os desafios mais urgentes para a alimentação na terra.
Hadfield diz: “Se [a população mundial] atingir o pico de 10 bilhões de pessoas, não podemos ter apenas a agricultura como tínhamos 6.000 anos atrás; precisamos de métodos mais eficientes. Não apenas organismos geneticamente modificados e fertilizantes… aqui na Terra, temos uma necessidade esmagadora de melhores maneiras de cultivar alimentos para todas as pessoas e elevar os padrões de vida”.
Então, como o espaço nos ajudará a desenvolver novos métodos de biotecnologia e agricultura? Sobel me diz que um caminho é que os “ambientes de microgravidade” encontrados em estações espaciais orbitais ou, teoricamente, em assentamentos permanentes fora do planeta permitiriam que as plantas crescessem de maneiras diferentes, o que poderia criar novos valores de utilidade para elas.
Ele diz: “Nos próximos cinco a 10 anos, teremos estações espaciais comerciais onde as empresas vão se estabelecer e fabricar diferentes produtos no espaço … criando composições medicinais únicas e trazendo-as de volta à Terra para tratar as pessoas.
“Este é o novo ciclo que as empresas, no limite, do ponto de vista da liderança e da tecnologia, procuram alavancar… o poder dos ambientes de microgravidade e trazer os benefícios de volta à Terra.”
O primeiro produto de sua empresa está projetado em torno do que é conhecido como o paradoxo francês – o fato aparentemente paradoxal de que os franceses sofrem taxas comparativamente baixas de certas doenças cardíacas, apesar do fato de suas dietas serem supostamente ricas em gorduras e colesterol. Acredita-se que isso se deva aos antioxidantes encontrados nas células da pele das uvas vermelhas usadas no vinho, que também são consumidas em quantidades relativamente grandes.
Sobel me diz que sua empresa demonstrou que suplementos criados a partir de células de uva que crescem em biorreatores têm o efeito de aumentar o fluxo sanguíneo, melhorando assim a saúde cardiovascular geral. A Bioharvest agora está desenvolvendo métodos para criar toda uma gama de metabólitos secundários, que incluem polifenóis e fitoquímicos nessas condições – permitindo que esses compostos essenciais e altamente benéficos sejam criados de maneira muito mais eficiente e econômica do que cultivá-los como parte das culturas.
Hadfield diz: “Tecnologias como essa são fundamentais … Estou confiante de que, quando estivermos mais longe na lua e além, teremos maneiras de produzir alimentos diferentes de como fizemos nos últimos 6.000 anos . E este vai ser um deles… você vai entrar na instalação de produção de alimentos, e haverá um biorreator lá produzindo as coisas que precisamos para nos mantermos saudáveis.”
* Bernard Marr é colaborador da Forbes EUA, autor de sucesso internacional, palestrante popular, futurista e consultor estratégico de negócios e tecnologia para governos e empresas com foco nas implicações de novas tecnologias, como inteligência artificial, big data, blockchains e Internet das Coisas.