A Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) e a UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), com o reforço da criação do INCT OABras (Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia da Olivicultura e do Azeite Brasileiro), apresentou na segunda-feira (1) o resultado de uma pesquisa sobre a qualidade do azeite de oliva produzido no Brasil. O estudo, parte de um projeto que começou há sete anos e deve durar mais cinco, mostra que o produto brasileiro possui padrão internacional de qualidade.
“Geramos uma série histórica, com informações inéditas, que contribui para melhoria e formulação de políticas públicas voltadas para o estabelecimento de um marco regulatório para o produto, com objetivo de fortalecer a olivicultura no País”, diz Adélia Machado, pesquisadora da Embrapa.
Os estudiosos da entidade analisam há sete anos a composição química do azeite brasileiro. Com isso, foi possível caracterizar os óleos e montar um painel sensorial com um grupo de especialistas para avaliar o produto, considerando aparência, aroma e sabor, entre outros critérios. O conjunto de resultados demonstrou que a composição em bioativos e voláteis de azeites de oliva virgem de diferentes variedades de oliveira atende aos parâmetros da legislação nacional e internacional.
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O aporte orçamentário contará com mais R$ 6 milhões até a conclusão da pesquisa. A iniciativa pretende solucionar gargalos tecnológicos, a fim de garantir alta produtividade das oliveiras e a qualidade do azeite de oliva brasileiro. A equipe da Embrapa, UFRJ e INCT OABras é formada por 34 cientistas de 18 instituições de pesquisa nacionais e internacionais. A liderança é Embrapa Agroindústria de Alimentos, localizada em Guaratiba (RJ) e financiada pelo CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico).
O que é um painel sensorial e para o que ele serve
A avaliação do azeite de oliva por teste de painel é o único método sensorial incluído na regulamentação internacional de óleos comestíveis que pode classificá-lo entre os tipos extra virgem, virgem, comum ou lampante, explica a pesquisadora Daniela Freitas, responsável pelo painel sensorial da Embrapa Agroindústria de Alimentos. Hoje, o Laboratório Federal de Defesa Agropecuária, localizado em Porto Alegre (RS), e que pertence ao Mapa (Ministério da Agricultura e Pecuária) é o único no Brasil reconhecido pelo COI (Conselho Oleícola Internacional), cujo painel sensorial foi credenciado em dezembro de 2021.
Este ano, o painel da Embrapa participa pela primeira vez do teste de proficiência organizado pelo COI, que avalia a sua competência e permite verificar o desempenho comparando-o aos demais painéis sensoriais oficiais já credenciados pelo órgão. “O resultado satisfatório do teste de proficiência será fundamental para o reconhecimento deste painel sensorial junto ao COI”, diz Freitas.
A composição química dos azeites de oliva brasileiros é estudada há sete anos na Embrapa, em parceria com a UFRJ, tanto em relação aos padrões de qualidade e identidade quanto à composição de aromas (voláteis). A qualidade do azeite é relacionada a diversos fatores, como agronômicos, tecnológicos e condições de armazenamento. Os parâmetros de identidade e qualidade do azeite são definidos por instruções do Mapa, que, por sua vez, segue a regulamentação da União Europeia.
Mapa de aromas de azeites nacionais
O azeite extra virgem tem um aroma complexo, contendo várias centenas de substâncias voláteis. Seu aroma está relacionado com a variedade genética da oliveira, o solo e o clima onde é cultivada e as condições de extração e armazenagem do azeite de oliva, como aponta o pesquisador da Embrapa Agroindústria de Alimentos Humberto Bizzo, que realizou uma capacitação como Cientista Visitante no grupo de Química de Alimentos do Departamento de Ciência e Tecnologia do Fármaco da Università degli Studi di Torino, em Turim, Itália, para a aplicação da técnica de cromatografia multidimensional abrangente na análise dos voláteis (aromas) dos azeites brasileiros.
Vinte e sete azeites brasileiros, sendo 15 produzidos no Rio Grande do Sul e 12 na Serra da Mantiqueira, tiveram seus voláteis amostrados por microextração em fase sólida e analisados por cromatografia gasosa multidimensional abrangente acoplada à espectrometria de massas. Os resultados preliminares indicam que a técnica de cromatografia multidimensional abrangente constitui uma importante ferramenta para a caracterização dos azeites brasileiros, cuja aplicação permitiu o estabelecimento de marcadores químicos para processos de indicação de origem e ocorrência de adulteração. A vantagem do uso dessa técnica é que possibilita a agregação de uma elevada quantidade de informações química sobre os voláteis das amostras.
Bizzo é vice-coordenador do INCT OABras e irá coordenar as análises do perfil dos componentes voláteis presentes em amostras de azeite de oliva nacional, responsáveis por seu aroma, por meio da técnica cromatografia gasosa multidimensional abrangente. “Após a realização da pesquisa, teremos um mapa de aromas do azeite de oliva brasileiro, a partir de uma correlação mais precisa entre voláteis e origem geográfica ou variedade utilizada. Os dados obtidos serão como impressões digitais dos azeites brasileiros”, explica o pesquisador.
Uma outra vantagem da técnica é a possibilidade de reduzir a ocorrência de fraudes e adulterações. A metabolômica de aromas constitui atualmente o estado da arte na análise de alimentos. Tem sido aplicada com sucesso na análise de café, chá preto, cacau, avelãs e frutas. “Nesse projeto, pretendemos atuar em conjunto com os produtores de azeite, a fim de aumentar a oferta, diminuir fraudes e solucionar problemas que interferem na olivicultura nacional”, afirma Bizzo.
Produção e consumo de azeite de oliva no Brasil
Atualmente, o Brasil é o terceiro maior importador mundial de azeite de oliva, ficando atrás apenas dos Estados Unidos e da União Europeia. O azeite brasileiro tem qualidade reconhecida por prêmios internacionais conquistados nos últimos anos, mas a produção local ainda é incipiente. Iniciada na última década, chegou a 503 toneladas em 2022, o que representa apenas 0,24% do consumo nacional. O Rio Grande do Sul e a região da Serra da Mantiqueira apresentam os maiores volumes de produção, em razão dos aspectos favoráveis de clima e relevo.
“O conhecimento gerado a respeito das variedades cultivadas no Brasil contribuiu para a caracterização de um produto de elevado valor comercial e de grande interesse pelos aspectos nutricionais e de benefícios à saúde”, aponta Adélia Machado. Nos últimos anos, a pesquisadora coordenou projetos para caracterização do Padrão de Identidade e Qualidade (PIQ) de azeites de oliva produzidos nos estados de Minas Gerais, São Paulo e Rio Grande do Sul.
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Integrante do Programa dos Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia, o INCT OABras é composto por seis áreas de pesquisa e desenvolvimento: sistema de produção; fitopatologia; química e metabolômica; agroindustrialização e produção de azeite de oliva; análise sensorial e estudos do consumidor; coprodutos do aproveitamento do bagaço de oliva e de folhas provenientes da poda.
“Os pesquisadores irão atuar na cadeia produtiva da oliveira no Brasil, desde a perspectiva agronômica no campo, passando pela agroindustrialização até a qualidade química e sensorial dos azeites brasileiros, a fim de promover a expansão da olivicultura e melhorar a qualidade do azeite de oliva brasileiro”, explica a pesquisadora Rosires Deliza, coordenadora do projeto e responsável pelo Lasi (Laboratório de Análise Sensorial e Instrumental) da Embrapa.
Também estão previstas ações de aproveitamento e valorização dos resíduos provenientes da produção de azeite para agregação de valor aos coprodutos gerados, com redução do impacto ambiental e incremento da renda dos agricultores, além de ações de popularização da ciência e de comunicação para o setor produtivo e para o consumidor. “A formação do painel sensorial de azeites terá um importante papel para alavancar a olivicultura brasileira ao promover o consumo e a valorização do azeite brasileiro de qualidade”, diz Deliza.