
Steve Ells abriu o primeiro Chipotle em uma antiga sorveteria perto da Universidade de Denver (EUA), em 1993. Agora, três décadas e uma revolução no conceito de fast-casual depois, ele é o primeiro bilionário do burrito da história.
A Forbes estima que Ells — que foi CEO do Chipotle até 2018 e presidente executivo até 2020 — tem um patrimônio de US$ 1 bilhão (R$ 5,74 bilhões na cotação atual), tornando-se um dos 288 novatos na lista dos Bilionários do Mundo deste ano, que será publicada na terça-feira (1). Ele talvez seja o mais improvável de todos.
No ano passado, 130 mil funcionários do Chipotle venderam US$ 11,3 bilhões (R$ 64,91 bilhões) em frango, carne e barbacoa em 3.700 lojas espalhadas pelo mundo — o suficiente para fazer do Chipotle a terceira cadeia de restaurantes mais valiosa do planeta, com uma capitalização de mercado de US$ 68 bilhões (R$ 390,59 bilhões), atrás apenas do McDonald’s e do Starbucks.
Ainda assim, Ells, 59 anos, um chef com formação clássica, mais propenso a discutir a “procedência” de seus ingredientes do que a lucratividade de suas lojas, tomou algumas decisões pessoais que pareciam garantir que ele nunca entraria na lista de bilionários.
A partir de 1998, ele vendeu grandes fatias do Chipotle para o McDonald’s em troca da ajuda da rede de fast food para expandir o Chipotle de 16 locais para quase 500. Quando a empresa abriu capital em 2006, foram os Arcos Dourados — e não o fundador e CEO Ells — que colheram a maior parte dos frutos. O McDonald’s detinha 91% do Chipotle, que ultrapassou a marca de US$ 1 bilhão de valor de mercado no primeiro dia de negociação; Ells possuía menos de 4%, uma participação que valia apenas US$ 44 milhões na época.
Depois, ele rapidamente começou a se desfazer do pouco estoque que tinha e continuou vendendo mesmo quando o preço das ações disparou ao longo da década seguinte. Em 2014, as ações do Chipotle haviam subido 1.400% desde o IPO, mas Ells havia reduzido sua participação para 1%, levando a Forbes a declarar que Ells não era bilionário — e “talvez nunca fosse”.
Mas o Chipotle continuou crescendo, ultrapassando mil unidades em 2010 e depois 2 mil em 2016. Enquanto isso, Ells recebeu um grande impulso do plano de compensação do Chipotle, que incluía um pacote de remuneração executiva que concedia a ele — e a outros executivos — grandes lotes de novas ações conforme o preço das ações do Chipotle subia.
Quando Ells deixou o conselho em 2020, ele havia acumulado cerca de US$ 300 milhões (antes de impostos) com todas as suas vendas e ainda possuía cerca de 1% das ações do Chipotle, valendo cerca de US$ 170 milhões (R$ 976,5 milhões). O preço das ações do Chipotle subiu mais 250% nos anos seguintes, e os prováveis retornos de investimento com a valorização dos mercados empurraram Ells para a lista de Bilionários do Mundo — mais de três décadas depois de abrir sua primeira loja, e apesar de anos vendendo barato e depois vendo o preço das ações subir. Ells preferiu não comentar os cálculos da Forbes.
Não que Ells tivesse planejado ficar rico preparando burritos, bowls e saladas para as massas. Filho de um executivo da indústria farmacêutica, ele nasceu em Indiana e cresceu no Colorado, formou-se em história da arte pela Universidade do Colorado em Boulder e depois estudou no Culinary Institute of America antes de se mudar para San Francisco, onde foi subchefe no icônico restaurante Stars. Inspirado pelas taquerias da cidade – restaurante ou barraca que serve comida mexicana, principalmente tacos e burritos –, voltou para Denver com esperanças de abrir uma taqueria própria — mas apenas para usar os lucros e financiar seu verdadeiro sonho: abrir um restaurante de alta gastronomia.
O primeiro Chipotle abriu suas portas em 1993 com um nome estranho, um cardápio limitado, um balcão com conceito novo e preços altos. Em uma era de burritos do Taco Bell por 59 centavos, Ells cobrava mais de US$ 4. “Os clientes entravam, davam uma olhada, e depois iam embora”, disse ele em um evento do Wall Street Journal em junho passado. “As pessoas não entendiam.” Mas a mistura de Ells entre comida de qualidade servida com a rapidez do fast food conquistou o público, e ele logo abandonou suas aspirações na alta gastronomia, abrindo a segunda loja em 1995 e a terceira em 1996.
Ells tinha 16 unidades em 1998, mas precisava de uma injeção de capital para continuar crescendo. “Enviamos o plano de negócios para 13 empresas de capital de risco ou bancos de investimento especializados em restaurantes”, contou Bob Ells, pai de Ells, à Bloomberg em uma história oral sobre o Chipotle publicada em 2015. “Fomos rejeitados pelas 13.” O McDonald’s, então em uma onda de aquisições, decidiu investir.
Logo, o gigante do fast food era dono da maior parte do Chipotle, embora Ells continuasse a administrar a empresa e insistisse no uso de ingredientes frescos preparados no local. Quando o McDonald’s mudou o foco para seu negócio principal poucos anos depois, levou o Chipotle à bolsa em janeiro de 2006 e vendeu sua participação de 91% ao longo dos nove meses seguintes, quando a empresa valia cerca de US$ 2 bilhões. (Essa participação de 91% valeria hoje US$ 62 bilhões ou R$ 356 bilhões)
As vendas saltaram de US$ 823 milhões (R$ 4,7 bilhões) em 2006 para US$ 4,5 bilhões (R$ 25,85 bilhões) em 2017, à medida que Ells expandia a rede pelos Estados Unidos e para o Canadá e a Europa. Mas, abalado por uma série de surtos de doenças transmitidas por alimentos, ele foi substituído como CEO em 2018 por Brian Niccol, que liderou uma reviravolta que levou as ações do Chipotle a novos recordes. Ells permaneceu como presidente executivo até 2020, quando renunciou e deixou o conselho.
Bilionário relativamente discreto, ele comprou várias propriedades em Manhattan, incluindo uma townhouse em Greenwich Village por US$ 30 milhões em 2021, revendida com um lucro de US$ 5 milhões apenas oito meses depois, segundo relatos.
Agora ele está tentando construir o “restaurante do futuro.” No ano passado, abriu o Kernel, um conceito fast-casual e totalmente vegano, com uso de robôs para ajudar na preparação dos alimentos. O cardápio fracassou, e agora ele está migrando para o Counter Service, um conceito de sanduíches com uma loja em Manhattan, na esperança de encontrar seu próximo Chipotle. “Você criou coisas grandiosas do zero—” disse o repórter do Wall Street Journal que o entrevistava no palco em julho. Ells logo o interrompeu: “Eu criei coisa grandiosa. Vamos ver se conseguimos usar o plural.”