Em 2020, a economia de baixo carbono destinada a conter as emissões de GEEs (gases de efeito estufa) movimentou € 229 bilhões, 20% acima do ano anterior. De 2017 para cá, esse valor saltou cinco vezes. “O mercado de carbono é um mercado para cuidar do planeta”, diz o administrador Plínio Ribeiro, CEO da Biofílica, empresa especializada na conservação de florestas e na comercialização de serviços ambientais, mestre em meio ambiente pela Universidade de Columbia e o Earth Institute (EUA), liderando atualmente o Comitê de Sustentabilidade da Sociedade Rural Brasileira.
O mercado de carbono e suas regulações estiveram ontem (24) no centro de um dos palcos da Expert XP 2021, evento anual da XP Investimentos que termina amanhã. Parte dos analistas econômicos que se debruçam sobre o tema carbono afirmam que esse mercado será o maior do século 21, acima até do atual mercado de óleo e gás, que está na casa de US$ 2 trilhões. E mais: esse status tem chance de ocorrer antes de 2050.
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De acordo com a engenheira florestal, Rebeca Lima, diretora executiva da CDP Latin America, organização internacional que impulsiona investidores, empresas e governos a reduzir suas emissões de GEEs, 50% das grandes empresas listadas e que reportam ao CDP já fazem parte de algum sistema regulado de carbono. “E olhando especificamente para quem compra esses créditos, 33% das que compram ou vendem créditos, fazem parte desse mercado voluntário ou regulado”, afirma. No caso do Brasil, 9% das empresas listadas fazem parte de algum sistema regulado, lembrando que o país possui empresas internacionalizadas com operação em países que construíram esse sistema. “Então, 9% fazem parte ou são afetadas por esse sistema, e 30% compram ou vendem. Ou seja, temos o mesmo apetite por compra e venda desses créditos aqui.”
Trocando em miúdos, o mercado regulado é uma instância subnacional, na qual o governo de um país regula um determinado setor da economia. A Forbes, nesta edição de agosto, mostra o mercado regulado do CBIOs (Crédito de Descarbonização) calculado com base nos biocombustíveis. No caso do mercado voluntário, como o próprio nome sugere, está ligado a projetos da iniciativa privada para sequestrar carbono ou mitigar (evitar) que carbono seja emitido na atmosfera.
Para entender o que é um crédito de carbono a conta é simples: o crédito é uma tonelada de CO2 equivalente. Isso porque muitas vezes o crédito nem está ligado ao carbono, mas a um outro gás de efeito estufa que é convertido em toneladas de CO2, daí o “e” de equivalente. Posto isto, é importante entender que no mercado regulado uma tonelada, para ser comercializada, se dá na forma de uma licença de emissão. Ela é criada pelo país regulador a partir de um estudo da dinâmica das emissões de um setor ou segmento. Mais uma vez, vale lembrar os CBIOs para o setor de biocombustíveis, como a cana-de-açúcar.
Já para o mercado voluntário significa dimensionar um projeto ligado a sequestrar carbono. O melhor exemplo é a restauração de paisagem, o reflorestamento, ou evitar que o carbono seja emitido. O maior exemplo é o chamado REED (redução das emissões por desmatamento e degradação). “Para dar um exemplo numérico, que infelizmente acontece muito no Brasil, quando a gente desmata e queima a floresta tropical nós estamos emitindo, a grosso modo, 500 toneladas de CO2 por hectare”, afirma Ribeiro. Marta Giannichi, bióloga e secretária da Amazônia no Ministério do Meio Ambiente, diz que o governo tem trabalhado para melhorar o ambiente do crédito voluntário, ao contrário do que vinha sendo feito. É uma mudança de direção. “Há uma mudança de posicionamento histórico para reconhecer o mercado voluntário de carbono como uma ação que tem uma contribuição direta nos GEEs, no desmatamento”, afirma Marta. “Sinalizar e trazer segurança jurídica visa trazer reconhecimento do mercado voluntário.”
Há uma corrida para transformar o Brasil na Arábia Saudita do crédito de carbono. O desafio passa por mudanças nas empresas e elas vêm ocorrendo. As metas Net Zero é uma delas, definição que está no IPCC (Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas) da ONU (Organização das Nações Unidas) como a neutralidade “ao se reduzir as emissões o mais próximo do zero em um determinado período e compensar quaisquer emissões remanescentes com projetos que removam emissões da atmosfera”.
Rebeca diz que “ficou bem claro no último relatório do IPCC, lançado na semana passada, que nas próximas duas décadas o planeta vai atingir um grau e meio a mais de temperatura. O que é ruim. No entanto, aponta que é possível manter o aumento nesse patamar com a carbono neutralidade até 2050.” Mas ela salienta, também, que há um limite para a neutralidade e que será preciso outras fontes de compensação. “Do ponto de vista tecnológico há limitações naturais do que se pode fazer, a exemplo da aviação e navegação. E segundo, do ponto de vista de eficiência financeira econômica do mercado, considerando que reduzir têm um custo e os créditos têm outro custo.” Ou seja, é preciso fazer contas e tomar decisões. “ As empresas podem se preparar com várias ferramentas, como a participação no mercado voluntário, ou esperar a conta chegar. O fato é que ela vai chegar, é uma questão de tempo.”
Os negócios com base na natureza possuem esse viés: o mercado de carbono serve para financiar uma transição que não seria possível se não fosse o crédito, acreditam os especialistas. “Há 15 anos, para quem já acompanhava os investimentos em energia renovável, não tinha nenhum projeto de eólica, de energia solar, porque não havia um componente de crédito de carbono na rentabilidade daquele projeto”, afirma Ribeiro. “O mercado de carbono foi fundamental para transformar essas energias renováveis que hoje, principalmente no Brasil, são muito competitivas, viáveis do ponto de vista econômico e do ponto de vista de negócio.”
Mas também, dizem eles, as soluções baseadas na natureza necessitam de financiamento para gerir as florestas e recursos adicionais para restaurar a floresta ou plantar floresta. “É justamente para isso que serve o crédito de carbono: financiar essa megatransição para uma economia de baixo carbono, de segmentos e negócios que não teriam uma fórmula fora disso”, afirma Ribeiro. “O que está acontecendo é que estamos desligando os projetos de energia renovável e acredito que daqui a 5 anos nós nem vamos mais ver créditos de energia renovável no sistema, enquanto o grosso da economia estará vinculado ao que a gente chama de uso da terra, com práticas agrícolas de baixo carbono, restauração de floresta, reciclagem de produtos pré e pós consumo, atividades que ainda precisam de investimento para se tornarem viáveis.”
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