O mercado de carbono é uma das várias ferramentas à disposição das empresas, afirma a advogada especialista em meio ambiente, Cinthia Caetano Carvalho, vp corporate e head academy da Future Carbon Group, organização que conta com especialistas no desenvolvimento de projetos baseados na geração de créditos de carbono. “O mercado de carbono está entre as muitas ferramentas para o financiamento climático, em especial o mercado da mitigação – e parte disso é direcionado idealmente para a adaptação”, afirma Cinthia. “Porque não existe uma única bala de prata para o financiamento climático ou para a crise climática. O que a gente precisa é fazer o melhor uso das várias ferramentas.”
Mas Cinthia e sua companhia estão mesmo de olho no mercado voluntário. “O mercado voluntário de carbono se destaca porque ele vai para um lugar onde as empresas estão muito acostumadas a trabalhar, que é justamente o mercado. Uma ferramenta de compra e venda facilita a governança de atores privados”, afirma ela.
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De acordo com dados do Ecosystem Marketplace’s, a plataforma tipificou 170 diferentes áreas de projetos sobre o mercado global voluntário de carbono. O valor total para transações em 2021, publicado no segundo semestre do ano passado, foi de quase US$ 2 bilhões (R$ 10,6 bilhões na cotação atual). Isso representa um aumento de quatro vezes em relação às transações de 2020, que foram de US$ 520 milhões.
“No Brasil, a gente consegue colocar esses projetos, mais ou menos, em meia dúzia de categorias, sendo que floresta, uso do solo, energias renováveis e agricultura são onde concentramos mais as nossas ações”, diz Cintia, se referindo ao portfólio da Future Carbon. Em outros países, os projetos podem ter outros desenhos, como ações urbanas, de mineração, entre outras. No caso do Brasil, o potencial florestal se torna um ativo de mercado.
Em relação à diversidade de instrumentos, junto ao mercado voluntário estão o mercado regulado de carbono, os pagamentos por serviços ambientais e os projetos diversos de proteção da natureza, entre eles os do Fundo Amazônia, programa que foi retomado neste início de 2023 e que tem disponível, de imediato, valores da ordem de R$ 3 bilhões em doações da Noruega e Alemanha para o combate ao desmatamento.
De acordo com a executiva, o mercado voluntário precisa estar na pauta das empresas por ser um instrumento pronto para ganhar escala. E mais, ela alerta: não há motivo para contrapor o mercado voluntário ao regulado, um embate que não existe de fato. “A gente tem a impressão de que o mercado regulado concorre com o voluntário. Mas na verdade eles empinam, os dois avançam.”
Mercado de carbono 2.0
Vale lembrar que o mercado de carbono não é algo novo, ele tem cerca de 20 anos. No mercado regulado, o principal driver da demanda é a legislação, é o estado trazendo uma obrigação. No caso do mercado voluntário essa obrigação vem de dentro para fora. “Ela, geralmente, está relacionada às questões ESG, vem de dentro da empresa para fora, para o mercado, que pode ser um investidor, um consumidor, um conselho de administração e os acionistas”, afirma. “Então, o que vai impulsionar é a ideia de responsabilidade social corporativa e mais recentemente ESG, numa versão ainda mais avançada do que é esse conjunto.”
Pela trajetória crescente do mercado, pode-se dizer que na primeira fase, o que ocorreu lá atrás a Futute Carbon chama de mercado 1.0. Hoje, o mercado de carbono está na fase 2.0, com uma série de novas complexidades, atores, inovações, mudanças constantes de metodologia, de certificações, entre outros. No Brasil atual, a estimativa é de que quase 60% dos projetos de mercado voluntário de carbono estão ligados à floresta, o maior ativo do país, seguido por geração de energia, com cerca de 35%.
Entre as orientações da especialista é que as empresas busquem por projetos que tenham uma melhor conexão com ela própria. E nesse caso, isso pode ser melhor garantido no mercado voluntário, porque é o próprio terceiro setor e as associações empresariais, a sociedade civil, que se auto regula criando arcabouços e diretrizes de melhores práticas e benchmarking. “Hoje, os compromissos são estabelecidos pelas próprias empresas, mas também pelas governanças, investidores, clientes, fornecedores”, diz ela, destacando um novo avanço nesse cenário.
“Tradicionalmente, a gente vem negociando o crédito de carbono no balcão, ou seja, contrato de parte a parte. Mas, hoje em dia, vem tendo novas ferramentas para fazer isso também em escala, num caminho sem volta de otimização desse mercado”. Cinthia se refere aos instrumentos financeiros que as startups estão construindo para agilizar negociações entre as partes.