Muitos acreditam que a crise climática é a questão mais importante da humanidade hoje em dia. O aquecimento global, a subida do nível do mar e os fenômenos meteorológicos extremos já estão afetando vidas em todo o mundo e as previsões não são nada otimistas.
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A emergente tecnologia da IA (inteligência artificial) é frequentemente vista como um farol de esperança que fornecerá soluções para desafios que a sociedade não conseguiu resolver até agora.
Mas, embora tenha potencial para ser transformadora, também há muito entusiasmo em torno dela — o que não surpreende quando empresas de tecnologia com enormes orçamentos de marketing esperam ganhar US$ 184 bilhões (R$ 975,2 bilhões, na cotação atual) com a venda de tecnologias de IA.
Portanto, resta saber até que ponto é realista esperar que ela forneça soluções para desafios muito concretos e urgentes. A Forbes examinou algumas afirmações sobre IA e o quanto elas condizem com a realidade.
O que está sendo dito?
O World Economic Forum (Fórum Econômico Mundial, na sigla em inglês) diz que a tecnologia contribui na luta contra as mudanças climáticas. Segundo um relatório recente da entidade, “a IA já está sendo usada para enviar alertas de desastres naturais no Japão, monitorar o desflorestamento na Amazônia e projetar cidades inteligentes mais verdes na China”.
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Outro relatório do Google e do Boston Consulting Group concluiu que a IA pode ser potencialmente utilizada para mitigar entre 5% e 10% das emissões globais dos gases de efeito estufa (GEEs). “A IA tem um papel muito grande na abordagem das mudanças climáticas”, afirmou Kate Brandt, a diretora de sustentabilidade da bigtech.
Já a Organização das Nações Unidas (ONU) acredita que a tecnologia pode ajudá-la a alcançar todos seus objetivos estratégicos, sobretudo promover o desenvolvimento sustentável de uma forma que reduza os danos causados ao meio ambiente pela atividade humana.
Nem todos estão otimistas
Os mais céticos sobre o papel da IA costumam indicar que os sistemas são muitas vezes extremamente intensivos no consumo de energia.
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Publicado recentemente, um relatório da Ação Climática Contra a Desinformação, que é uma coalizão de grupos ambientalistas, declarou que “as pessoas vão ficar indignadas ao ver quanta energia será consumida pela IA nos próximos anos, bem como uma inundação de desinformação sobre as mudanças climáticas.”
Foi até sugerido que usinas a carvão, muito prejudiciais ao meio ambiente e que de outro modo teriam sido desativadas, tiveram sua vida útil prolongada para satisfazer as necessidades energéticas da IA.
Outro perigo é que mudanças comportamentais impulsionadas pela adoção generalizada da IA nem sempre são amigas do ambiente. O surgimento de aplicativos de compartilhamento de viagens como o Uber reduziu o número de viagens feitas em carros particulares. Mas também fez diminuir o uso de formas ainda mais ecológicas de transporte público, levando a um aumento da poluição.
Outros consideram que, embora a IA e outras tecnologias sejam majoritariamente controladas pelas grandes corporações e utilizadas por aqueles que podem pagar por elas, os benefícios desproporcionalmente acabam nas mãos de quem já é privilegiado.
Por exemplo, famílias podem poupar dinheiro nas contas de energia por meio da instalação de painéis solares, e os carros elétricos são mais baratos de operar do que aqueles movidos a combustível, mas ambos exigem um investimento inicial elevado que muitos não podem pagar.
Isso deixará setores com menos renda na sociedade menos motivados para fazer as mudanças no estilo de vida e comportamentais necessárias para, justamente, combater os impactos das alterações climáticas.
Sanando o clima
O que está sendo feito, atualmente, e como isso se compara às grandes reivindicações sobre o potencial da IA?
Uma forma de utilização da tecnologia é melhorar processos agrícolas, de modo a reduzir o impacto ambiental da produção de alimentos. Os dados coletados com uso de câmeras em equipamentos agrícolas e drones são usados para determinar as quantidades ideais de fertilizantes e pesticidas a serem usados na lavoura.
Os agricultores recebem alertas em tempo real sobre as condições meteorológicas e outros fatores que afetam as culturas, permitindo-lhes tomar medidas antes que danos sejam causados e melhorar o rendimento das linhas de produção.
Outras iniciativas envolvem o monitoramento do derretimento de icebergs nos oceanos polares, uma tarefa que a IA é capaz de realizar dez mil vezes mais rápido do que humanos. Isso torna mais fácil prever o impacto do aumento das temperaturas no nível do mar, bem como a liberação de nutrientes de água doce, que têm impacto na biodiversidade do oceano.
A IA também está sendo utilizada para reciclar resíduos de forma mais eficiente, minimizando por exemplo as emissões de metano criadas durante o processo.
Outro projeto que hoje está gerando resultados envolve o uso de IA para analisar imagens de satélite, monitorar o desmatamento e prever seu efeito na capacidade do planeta absorver emissões de carbono.
E também há iniciativas para desenvolver cidades inteligentes, ou seja, ambientes urbanos concebidos para serem amigos do meio ambiente. Por exemplo, transportes públicos e serviços municipais são planejados de forma a minimizar o desperdício e o consumo de energia. O trânsito é controlado em tempo real para evitar congestionamentos e as redes de serviços públicos distribuem água e energia de maneira eficiente.
Sem falar que a IA permitiu grandes avanços na busca por energia limpa e quase ilimitada, sobretudo no que pode ser considerado o maior passo nesse sentido: a fusão nuclear.
No início de 2024, uma equipe de pesquisadores da Universidade de Princeton, nos EUA, disse que a IA os ajudou a superar um dos maiores desafios no caminho para produzir um tipo de energia similar à geração de energia do sol.
Hype ou realidade?
A julgar pelos projetos e iniciativas que estão atualmente sendo realizados em todo o mundo, é realista acreditar que a IA tem o potencial para, pelo menos, mitigar os perigos da crise climática.
No entanto, é importante saber que existem limitações e desafios, em particular, a elevada demanda por energia da própria IA. Além disso, há um perigo real de que, ao tratar a IA como uma “bala de prata”, o mundo seja levado a uma catástrofe ambiental, enquanto experts não encontram soluções alternativas.
Isto significa que é importante lembrar que a mudança não será impulsionada apenas pela tecnologia. Evitar um cataclisma para o qual os cientistas prevêem que o planeta está se dirigindo exigirá esforços políticos e individuais.
Mas novas aplicações reais para a IA na ação climática surgem a cada dia. Em particular, aquelas que ajudam a procura por fontes de energia limpa e ferramentas que permitem às pessoas comuns maximizar sua contribuição para o clima, oferecendo esperança. Ao tratar a IA como apenas uma das muitas ferramentas de que a sociedade precisa para mitigar e reparar os danos causados ao planeta, ela pode contribuir na construção de um futuro mais sustentável.
*Bernard Marr é colaborador da Forbes EUA. É futurista e consultor de organizações e empresas. Tem cerca de 20 livros publicados e 4 milhões de seguidores em suas redes sociais