Resumo:
- A Ferrari 250GTO foi vendida pelo colecionador e advogado Bernard Carl, para o ex-piloto de corridas e comerciante de supercarros, Gregor Fisken, por cerca de US$ 44 milhões em outubro de 2017;
- O veículo foi vendido sem a caixa de marchas, e a peça se encontra com um colecionador da Califórnia, que só vai liberá-la por US$ 25 mil;
- A briga judicial entre Carl e Fisken segue indefinida.
Os ânimos podem se alterar ridiculamente rápido quando se trata de coisas preciosas, especialmente aqueles colecionáveis na faixa dos US$ 40 milhões. Mas, quando a segunda Ferrari 250GTO já fabricada, chassi 3387GT, foi vendida pelo renomado colecionador e advogado de Washington, Bernard Carl, para o ex-piloto de corridas e comerciante de supercarros de Londres, Gregor Fisken, por cerca de US$ 44 milhões em outubro de 2017 (a venda pública de carro mais cara do mundo), nenhum aficionado pelo do mundo dos carros raros poderia imaginar que o acordo terminaria com uma peça do carro protagonizando um processo amargo movido perante um tribunal de Londres.
Esta semana marca a primeira do julgamento de uma disputa de longa data que resultou no processo movido por Fisken contra Carl. Fisken está processando Carl pela não entrega da icônica caixa de marcha (embreagem) original nº 2 da GTO. Infelizmente para os dois homens, o Carl não tem essa caixa e nunca teve. E aí, dois anos após a venda de tirar o fôlego do icônico carro de corrida, o problema se mantém.
Alguns antecedentes nos dão uma imagem do porquê do burburinho por trás dessa disputa: as três principais vendas de carros mais caros do mundo são as 250GTOs da Ferrari. Em 2013, o chassi 5111GT foi supostamente vendido por um valor um pouco maior, de US$ 52 milhões (não confirmados). A Bonham’s alcançou o preço mais alto já pago por um carro em leilão em 2014, com um 250GTO puxando um preço de martelo de cerca de US$ 38 milhões. Havia apenas 39 dos 250GTOs fabricados, projetados pelo lendário engenheiro da Ferrari Gian Carlo Guerra, que, ao fazer o protótipo, martelou o esqueleto do corpo do GTO em fios de alumínio antes de bater nos painéis manualmente para cobri-lo. O próprio Enzo Ferrari aprovou os detalhes. Os GTOs são os mais raros da categoria. O chassi 3387, o assunto dessa disputa, é um lendário. Esse coquetel de ativos foi o que gerou o preço mais alto registrado para um carro na venda entre Carl e Fisken.
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Carl manteve o apelo de inocência, nesta semana em Londres. O carro e sua embreagem original eram de propriedade separada, como Carl e Fisken sabiam no momento da venda. Como parte do acordo, Fisken considerou que Carl fazia um esforço de boa-fé para localizar e entregar a embreagem. A posição de Carl era, em vez disso, que cabia a Fisken buscá-la.
O dono da caixa de marcha, um negociante americano especializado em raridades, não ajudou no conflito, exigindo uma “taxa de liberação” de US$ 25 mil pela peça. Fisken, que comprou o carro com a intenção expressa de vendê-lo, repassou o carro com sucesso para seu cliente, o que apenas intensificou a urgência de levar a caixa de marcha para a Inglaterra para que ela pudesse ser entregue ao novo proprietário. Afinal, o atual dono do chassi 3387GT quer que seu valor, presumivelmente superior aos US$ 44 milhões pagos por Fisken, também aumente. Do ponto de vista de um colecionador, essa quantia pode aumentar enormemente com a embreagem original do carro.
Embora seja um axioma de colecionadores de carros as peças originais serem uma chave para aumentar o valor, é importante lembrar que o Chassis 3387GT era um carro de corrida em meados do século 20, levado a 17 pódios em 27 corridas, inclusive sendo conduzido na cansativa corrida de 24 horas em Le Mans por Glenn “Fireball” Roberts, em 1962. Neste ano, não havia uma corrida mais mortalmente dura para pilotos e carros do que Le Mans. O GTO não era “colecionável” na época, era um cavalo de corrida puro-sangue. Todas as partes de cada carro de corrida são retiradas e substituídas rapidamente, por motivos relacionados ao desempenho aprimorado no calor de uma temporada ou para atender às demandas de uma pista específica. A caixa de marcha original de “fábrica” do chassi 3387GT caiu no esquecimento durante seus anos de corrida e não foi devolvida. Ninguém precisava disso. Eles estavam correndo, não colecionando.
Mas a caixa estava muito bem guardada, acabando nas mãos do revendedor da Califórnia. O nobre carro passou por cinco proprietários entre 1968 e 1997, quando chegou, sem embreagem, a Carl, em Washington. De qualquer forma, o debate entre Fisken e Carl esquentou, depois endureceu em um longo processo legal durante 2018, resultando nas aparições de Carl nesta semana na corte de Londres.
Durante o período antes da ação judicial, a disputa piorou depois que Fisken entrou em contato com o proprietário da embreagem na Califórnia. Não ficou claro qual dos diretores do negócio original era responsável pelos custos de remessa e pela “taxa de liberação” de US$ 25 mil. A posição de Fisken era que Carl era obrigado a arcar com esses acordos. A posição de Carl era que Fisken poderia ir para a Califórnia e pegar a peça por conta própria; além disso, pelo favor de localizá-la, Fisken devia a Carl um adicional de US$ 500 mil.
Fisken não engoliu a jogada e decidiu abrir um processo. As disputas legais sobre o retorno da caixa de marcha, e se Carl realmente deve os US$ 500 mil extras previstos no contrato, no momento ainda estão indefinidos. O juiz está a dias de uma decisão. Mas a lição didática sobre o caso está pronta para ser ministrada em aulas de arbitragem em faculdades de direito de ambos os lados do Atlântico: trabalhar juntos para encontrar uma peça de carro de US$ 25 mil em um acordo de US$ 44 milhões será, em última análise, menos caro e muito menos extravagante do que os trabalhosos tribunais que consomem tempo e dinheiro.
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