A perda de cabelo depois da quimioterapia é uma reação muito comum. Por isso, muitos pacientes de câncer optam por usar chapéus, perucas ou lenços na cabeça. Mas nem todos os efeitos colaterais da doença são visíveis, e muitos outros sintomas desconfortáveis geralmente não são discutidos.
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Para onde uma pessoa pode ir se estiver clinicamente estável, mas ainda com dor ou dificuldade em atividades cotidianas, como se exercitar, cuidar de seus filhos, dormir, tomar banho ou fazer sexo? “Normalmente, quando se tem uma condição de longo prazo, o lado médico das coisas é muito bem coberto, mas há outros aspectos em que apenas se aceita que o paciente vai se sentir mal”, diz a empresária britânica Tamara Rajah.
É por isso que, em 2015, ela lançou sua loja online Live Better With, a primeira sob o conceito one-stop shop – uma espécie de loja de conveniência – para pacientes com câncer, com o objetivo de ajudar a aliviar os efeitos colaterais que os afetam negativamente todos os dias.
O negócio agora ajuda 45 mil pessoas em todo o mundo e acaba de levantar US$ 7 milhões em investimentos de empresas como a Downing Ventures, a Forward Partners e dmg ventures (braço do “Daily Mail”), totalizando US$ 11 milhões até o momento.
“Queremos que pacientes de longo prazo sintam alívio, que saibam que existem coisas que podem ajudar, mesmo que seja comprar um chapéu macio, respirável e antimicrobiano, sem costuras em lugares que incomodam o couro cabeludo dolorido”, diz Tamara.
A empreendedora teve a ideia de lançar a Live Better With enquanto trabalhava na área de saúde como sócia da McKinsey & Company. “Eu vi repetidas vezes como o lado da vida cotidiana dos pacientes era negligenciado”, lembra.
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Poucas pessoas que Tamara conheceu sabiam quais produtos poderiam ajudá-los e, se os conhecessem, não sabiam onde comprá-los. “Comecei a fazer uma lista de itens no meu caderninho, mas ela foi ficando cada vez mais longa, reforçando a falta de informação existente”, explica.
Na mesma época, os avós da empresária foram diagnosticados com câncer, ampliando sua compreensão sobre como era importante tratar as pessoas, não apenas suas condições. Por isso, ela criou a Live Better With, com foco no paciente, o que significa que os produtos não são organizados por tipo ou marca, mas pelas necessidades da pessoa e como ela se sente. “Tudo o que você precisa saber é se ela tem dificuldades para dormir, sente-se mal ou tem problemas na boca.”
A loja online, que no início tinha apenas 350 produtos, agora vende mais de 2 mil itens, desde cremes hidratantes a livros de culinária e sutiãs pós-mastectomia. No ano passado, Tamara abriu a primeira loja do Reino Unido especificamente para pacientes com câncer, dentro do Guy’s Hospital, em Londres, e lançou o primeiro mapa de apoio mundial ao câncer digital (mostrando todos os serviços que podem ser relevantes por endereço). Mais recentemente, ela lançou a Live Better With Menopause, que ajuda as mulheres na menopausa a lidar com sintomas como ondas de calor, baixa libido e cabelos e unhas quebradiços. De acordo com a empreendedora, há planos para ajudar pacientes a administrarem todos os tipos de condições, desde autismo e TDAH até diabetes ou artrite.
Mídias sociais em prol da solidariedade
Ao longo dos anos, a Live Better With também expandiu suas raízes do varejo para a publicação de conteúdo próprio, com foco no paciente, e na criação de comunidades online impressionantes. Hoje, são quase 50 mil integrantes em seu grupo fechado no Facebook para pacientes com câncer.
“É o que você espera de um encontro na vida real”, diz Tamara sobre as páginas. “As pessoas postam que estão com insônia ou que acabaram de passar pela quimioterapia. É uma enorme onda de solidariedade, onde os pacientes descobrem que há muito mais gente passando pelas mesmas coisas que eles.”
Embora muitos produtos da Live Better With tenham sido recomendados por profissionais de saúde e cuidadores, um grande número foi diretamente recomendado por pacientes via e-mail ou rede social, e esse feedback ajudou a empreendedora a desenvolver itens de marca própria, incluindo chapéus e sutiãs respiráveis e uma gama de produtos para a pele. “Lemos todos os comentários postados em nossos grupos”, diz Tamara, observando que todo o feedback é compartilhado entre os canais de mensagens do Slack – app de trabalho – da equipe.
Marca global
A missão de Tamara pode ser significativa, mas não tem sido fácil, e o caminho à frente não parece simples. Ela diz que encontrar funcionários que investem da mesma forma nas áreas de vendas e no impacto social do negócio tem sido seu maior desafio. “Quando você erra, seu negócio fica mais lento, mas quando você acerta, vale a pena cada tormento e reflexão”, observa.
Apesar de já ter conquistado um grande público nos Estados Unidos (50% dos seus clientes são da Grã-Bretanha e cerca de 30% dos EUA), Tamara diz que a globalização também tem sido difícil. Ela admite que ainda está lutando consigo mesma para traçar o melhor caminho a seguir. “Uma coisa é ter recursos limitados e querer adaptar os produtos para os consumidores locais. Outra é ter equipes em todos esses lugares”, diz ela.
No entanto, são as experiências comuns e compartilhadas dos pacientes que Tamara acredita que vão impulsionar seus negócios em novas regiões. Em cinco anos, ela espera ter alcançado pessoas de todos os países do mundo.
“Independentemente do comportamento regional de compra no comércio eletrônico, as necessidades do paciente – suas necessidades humanas – são as mesmas: eles têm os mesmos efeitos colaterais, a mesma falta de informação”, diz Tamara. E, embora esses efeitos não sejam totalmente visíveis, pelo menos agora os pacientes sabem onde procurar ajuda.