José Janguiê Bezerra Diniz é a prova viva da teoria de que a educação é a única forma concreta de mobilidade social. Nascido em uma família de sete filhos no sertão paraibano, com mãe dona de casa e pai peão de fazenda, o empresário foi engraxate, vendedor de mexerica e de sorvete e garçom antes de tomar a decisão que mudaria sua vida: deixar sua casa com apenas 14 anos e ir morar com um tio no Recife para estudar. Hoje é dono do Ser Educacional, um dos maiores grupos de Ensino Superior particular do Brasil, com mais de 50 instituições presenciais no país e mais de 300 polos de Ensino a Distância, cuja receita líquida em 2017 foi de R$ 1,2 bilhão. Nesta entrevista, ele conta os percalços que enfrentou e as lições que aprendeu.
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FORBES – Seu primeiro negócio foi uma caixa de engraxate, aos 8 anos. Que lembranças traz de sua infância?
Janguiê Diniz – Nasci em Santana dos Garrotes, uma cidadezinha no sertão da Paraíba com 5 mil habitantes. Meu pai era peão e minha mãe era do lar. Foi uma infância difícil, mas graças a Deus sempre tivemos comida na mesa. Por ser de uma família sem recursos financeiros, não tinha dinheiro para frequentar a matinê aos sábados com outros garotos da minha idade. Foi quando tive a ideia de engraxar sapatos para conseguir um trocadinho. Pedi a um tio meu que construísse uma caixa. Estudava em um período e no outro saía pelas ruas da cidade engraxando os sapatos dos senhores. No fim da semana, tinha dinheiro para ir à matinê e ainda sobrava um pouco para ajudar em casa.
De que forma o fato de seus pais não terem tido a opção de estudar interferiu nos seus rumos?
Eu tinha exemplos na família de pessoas bem-sucedidas graças à educação. Olhava para os tios que se formaram em faculdades e que tiveram melhores oportunidades na vida. Isso me inspirava. Sabia que aquele era o caminho que poderia me fazer mudar também. Eu via o esforço que meu pai fazia para manter nossa família – ele trabalhava por dias seguidos, sem descanso. Eu não queria seguir o mesmo caminho.
O senhor fez direito, mas acabou optando pela magistratura e decidiu abrir uma empresa de educação.
Como foi isso?
A educação mudou minha vida, minha história e meu destino. A magistratura e o Ministério Público me permitiram ter estabilidade financeira para poder investir no meu maior sonho – criar uma instituição educacional. No começo, era um curso preparatório para concurso – que teve sucesso nacional com a aprovação de milhares de concurseiros.
E como a empresa de curso preparatório virou o grupo Ser Educacional?
O Bureau Jurídico nasceu em 1994 e teve um sucesso que nem eu esperava. No começo, eu era o único professor, em uma sala alugada, dando aula para os meus alunos da universidade que iriam prestar concurso para magistratura. Depois fui contratando outros profissionais renomados. Em poucos anos, estudantes de todo o país passaram a vir estudar no nosso curso. Nosso índice de aprovação nos concursos era acima de 90%. A Ser Educacional surgiu como consequência. Na época, só existiam quatro faculdades em Pernambuco que ofereciam o curso de direito, mas havia uma enorme demanda. Decidi que queria fundar uma instituição de Ensino Superior com esse curso. Entrei em sociedade com uma universidade, mas não deu certo. Então saí do negócio e comecei a planejar a minha marca, que foi fundada em 2003. O investimento foi meu, financiado em longas prestações, que, graças a Deus, eu consegui honrar.
Quais foram os maiores desafios que enfrentou?
Foram vários desafios. Mas o maior deles é aprender com cada erro e continuar firme e forte em nosso propósito. Um dos fatos mais marcantes aconteceu em 2004, no início da operação da Faculdade Maurício de Nassau, quando, por um erro no cálculo da avaliação do Enade [Exame Nacional de Desempenho de Estudantes], um de nossos cursos foi considerado ruim. Isso poderia ter acabado com o nosso projeto, mas conseguimos comprovar que a nota havia sido calculada de forma errada e o MEC reconheceu a situação.
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A estratégia de crescimento do Ser passa por aquisições – o grupo abriu capital na Bolsa e desde então
já fez mais de 20. Quanto cresceu com isso?
O grupo cresce de duas formas: por aquisições e de forma orgânica, com a abertura de novas unidades. A abertura de capital foi um marco para nós. Fomos e ainda somos o maior IPO da América Latina no segmento de educação, e isso nos deu oportunidade de poder realizar grandes aquisições como a Universidade da Amazônia e a Universidade Guarulhos, fazendo com que saíssemos do status de um grupo regional para termos representação nacional. Nossos planos continuam sendo os mesmos, continuamos avaliando oportunidades de crescimento das duas formas.
De que forma o Ensino à Distância se encaixa na estratégia do grupo?
O EAD é uma realidade no segmento do Ensino Superior. Não investir nisso é dar um passo atrás. Se formos avaliar, ele teve algumas formas no Brasil – como o Telecurso 2000, que era exibido na televisão – e hoje ele está concentrado na internet, graças ao avanço tecnológico, com a ampliação da banda larga etc. Não enxergo o fim do ensino presencial, mas tenho certeza de que o Ensino a Distância ainda vai crescer muito nos próximos anos.
O presidente eleito, Jair Bolsonaro, defende a EAD desde o Ensino Fundamental. O senhor concorda?
O Brasil está longe de atingir as metas propostas pelo Plano Nacional de Educação, e todas as ações que visem a inclusão das nossas crianças, jovens e adultos na escola devem ser avaliadas. Vamos citar como exemplo as crianças e os jovens que moram em regiões isoladas e se arriscam todos os dias em longas jornadas de barco, caminhadas etc. por horas, para chegar às escolas. O EAD seria uma possibilidade para incluí-los, evitando um desgaste físico que os faz, inclusive, ter um baixo rendimento na escola presencial. Precisamos ampliar nossos horizontes. Quanto maior acesso à educação nossa sociedade tiver, mais desenvolvido será o país.
Qual é o objetivo do recém-inaugurado Centro de Inovação Overdrives em Recife?
O Overdrives funciona como ponto de conexão entre academia, mercado e startups. Investimos R$ 6 milhões e temos capacidade para abrigar até 40 startups. Lá, oferecemos infraestrutura, metodologia especializada, conexões com o mercado e queremos atrair a possibilidade de investimentos para que as startups cresçam de forma sustentável. Nosso principal objetivo é identificar oportunidades de negócios em áreas de educação, saúde, logística, construção civil e finanças, ajudando os novos empreendedores a desenvolver seus negócios.
Reportagem publicada na edição 63, lançada em novembro de 2018
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