Recentemente, o TikTok, a plataforma de mídia social que invadiu a China e chamou a atenção da cultura online norte-americana nos últimos dois anos, revelou sua atitude mais ousada até o momento. A empresa trouxe para o posto de CEO Kevin Mayer, o principal executivo da Walt Disney, a maior empresa de entretenimento do mundo.
E, assim que as notícias foram publicadas, a caixa de entrada de Jacob Pace alertou para uma nova mensagem. Pace, 21 anos, dirige a @flighthouse, uma das maiores contas do TikTok com 24,7 milhões de seguidores, que pode ser melhor descrita como a MTV do século 21. E esse e-mail recebido era de um consultor do setor, conhecido de Pace, que disse para ele se preparar para o que poderia ser uma corrida rápida: Mayer provavelmente levará o TikTok a uma compulsão por criação de conteúdo e, com a longa história dos principais acordos de aquisição da Disney, o CEO provavelmente estará à procura de alvos interessantes como o @flighthouse.
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“Muitas pessoas ficaram super empolgadas”, diz Pace. “Ele vem do entretenimento. Vai ser incrível.”
E, se a trajetória de outras redes sociais de rápida evolução –Twitter, Snapchat, Instagram– for um indicativo, o TikTok deve ser ainda mais disruptivo e remodelar as bases do que já é um negócio midiático saturado.
No primeiro trimestre, o TikTok foi baixado 315 milhões de vezes em smartphones Apple e Android, o maior número de instalações trimestrais de um aplicativo de todos os tempos, segundo o SensorTower, que monitora os downloads de apps. E com o mundo isolado socialmente, o uso da plataforma aumentou, com o total de downloads agora acima de 2 bilhões. Ainda mais ameaçador para seus concorrentes: 40% de seus usuários têm entre 16 e 24 anos e são heavy users, gastam quase uma hora no aplicativo todos os dias em média.
E, se Mayer entregar para a empresa controladora da TikTok, a ByteDance, o que ele fez pela Disney durante mais de duas décadas lá, os frutos podem ser ainda maiores.
“Foi o nosso maior foco de mídia social no primeiro trimestre e acho que continuará sendo durante o resto do ano”, diz John Robinson, presidente da 100 Thieves, uma equipe popular de e-sports que tradicionalmente canalizou seus esforços para o YouTube e o Twitch. “Estamos selecionando alguns de nossos melhores criativos e talentos e canalizando um tempo que normalmente seria gasto no YouTube para o TikTok. É uma grande oportunidade.”
A Bytedance já realizou um feito que outros gigantes chineses da internet, como Alibaba e Tencent, não conseguiram: criar uma marca com muitos seguidores no Ocidente. A empresa conseguiu fazer isso com vídeos leves e contagiantes de animais de estimação, coreografias no banheiro e brincadeiras. Mas tudo isso precisa de um executivo para incrementar ainda mais as coisas e estimular o crescimento de adeptos no mundo.
O que explica por que o bilionário e CEO da ByteDance, Zhang Yiming, 36 anos, não perdeu tempo em cortejar Mayer para substituir quem comandava o TikTok da China, Alex Zhu. Mesmo antes da chegada de Mayer, a plataforma pleiteava a ideia de um programa de TV em Hollywood no formato reality, embora os detalhes desse plano não estejam totalmente claros.
As primeiras ligações foram feitas três meses atrás, após Mayer ser ignorado para o cobiçado prêmio da Disney de sucessor do CEO Bob Iger, em favor dos ex-chefe de parques e experiências Bob Chapek. Zhang procurava o candidato certo desde outubro, alguém com a combinação perfeita de conhecimento digital e experiência de liderança para gerenciar o crescimento do TikTok nos EUA, Europa, Índia e Brasil.
Mayer claramente se encaixou no projeto, já que o executivo tem o crédito da criação do único ponto brilhante da Disney em um negócio esmagado pela pandemia: Disney +, o serviço de streaming de enorme sucesso. Ele tinha as características digitais e estratégicas que Zhang precisava para levar o TikTok ao próximo nível.
O executivo da Disney participou de reuniões em Nova York e na Califórnia enquanto gerenciava o lançamento europeu da Disney +. Depois, partiu para conversas na Lark, a plataforma de videoconferência da ByteDance –Zhang em Pequim e Mayer em Los Angeles– enquanto o mundo entrava em quarentena.
“Ele era um candidato relutante a princípio porque tinha um papel extremamente importante na Disney”, diz Bill Ford, membro do conselho da ByteDance, que estava envolvido no esforço de recrutamento. O interesse de Mayer cresceu com inúmeras conversas com o empresário chinês da Internet, a quem Ford comparou com o fundador do Alibaba, Jack Ma, em videoconferência. “É uma espécie interessante de cortejo. Acho que esse é o mundo em que estamos.”
A Disney, que excluiu a biografia corporativa de Mayer de seu site, não respondeu ao pedido de entrevista para. Mayer se manteve respeitoso sobre seus planos com o TikTok.
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Sua presença como CEO tem caras como Pace –e outros provedores de conteúdo como ele– salivando. O que quer que o TikTok não possa criar, Mayer estará pronto para comprar, como um veterano de algumas das aquisições mais impressionantes de Disney, incluindo Pixar, Lucasfilm, Marvel e seu último grande feito, a Fox.
“Quando você tem uma plataforma tão grande e com tantos usuários, há inúmeras oportunidades de incluir outros serviços, produtos e empresas”, diz Rob Fishman, fundador da BratTV. Como a @fligthouse, a BratTV é uma parceira óbvia da TikTok –ou potencial alvo de aquisição. O estúdio virtual esta semana estreou um novo programa no YouTube, Attaway General, estrelado por um dos mais populares TikTokers, Dixie D’Amelio.
Com seu alcance e conteúdo massivos, o TikTok poderá medir seu sucesso em bilhões. A ByteDance é fechada e não divulga detalhes financeiros, mas os grandes observadores do aplicativo podem encontrar pistas úteis no YouTube e sua transição do depósito de lixo gerado pelo usuário para uma força dominante na mídia. O YouTube, de propriedade da Alphabet, faturou US$ 15,5 bilhões em vendas no ano passado, acima dos US$ 1 bilhão da década anterior. Uma das principais prioridades de Mayer é redestinar alguns desses dólares.
Zhang quer ex-aluno da Harvard Business School para muito mais, nomeando-o também diretor de operações da ByteDance, o que faz dele a mão direita do bilionário no gerenciamento de um ecossistema de aplicativos que são amplamente populares na Ásia, incluindo o Lark e o Helo. Isso também confere a Mayer outra vantagem: um líder americano em uma empresa nascida em uma nação fechada em tempos hostis. O TikTok foi lançado pela primeira vez na China como o nome de Douyin em 2016 e importado para os Estados Unidos quando se fundiu com outro aplicativo, Music.ly, no ano seguinte.
O estilo de Mayer, o pedigree da Disney e a boa aparência de um personagem de ação –sua mandíbula marcada e confiança abundante lhe renderam o apelido de Buzz Lightyear no QG da Disney– fizeram dele uma figura popular de Hollywood, e Zhang espera que ele possa fazer o mesmo em Washington, DC.
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Alguns políticos conservadores temem que as raízes do aplicativo na China possam levar ao uso indevido de dados de usuários e violar a privacidade. O senador Josh Hawley, do Missouri, em março introduziu uma legislação para banir o TikTok de qualquer dispositivo do governo e, assim que Mayer foi anunciado como o novo CEO, ele publicou o seguinte este tuíte: “O @tiktok_us disse anteriormente que não podia comparecer às audiências e testemunhar porque os executivos ficavam na China. Mas esse novo executivo mora nos EUA. Estou ansioso para ouví-lo.Sob juramento”.
O TikTok também enfrenta fortes críticas de que não está satisfazendo os requisitos de um acordo da Comissão Federal do Comércio para proteger melhor os usuários jovens. Mayer é um ex-executivo da Disney que construiu produtos de tecnologia parcialmente destinados a crianças –que seria o serviço de streaming Disney + –e, como resultado, ele deveria, teoricamente, estar familiarizado com o cumprimento das leis em torno da privacidade online das crianças.
“Essencialmente, eles o contrataram para ser o rosto americano de uma empresa chinesa”, diz Rohit Kulkarni, analista da MKM Partners que cobre empresas de internet. “E ser uma ponte com os anunciantes.”
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