Em agosto, Karen Karniol-Tambour alertou que o mercado de ações dos Estados Unidos estava precificado para a perfeição, o que o tornou vulnerável ao tipo de liquidação que ocorreu em outubro. Embora convencida de que, no longo prazo, os investidores precisam de mais exposição aos mercados chineses, no final de outubro, ela também não se mostrou otimista em relação à China no curto prazo.
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Ao contrário dos investidores comuns, a millennial Karen pode fazer mais do que apenas torcer por uma mudança favorável de cenário. Como chefe de pesquisa de investimentos da Bridgewater Associates, o maior fundo de hedge do mundo, com US$ 160 bilhões em ativos, ela dirige uma operação de 150 pessoas que já foi descrita como uma fornecedora de “estatísticas e análises mais relevantes do que o Federal Reserve”.
Sentada em seu pequeno escritório na sede da Bridgewater, em Westport, Connecticut (EUA), Karen desdobra uma pequena folha. “O único pedaço de papel que levo comigo em todos os momentos é minha lista atual de projetos”, diz. Não é surpresa que ela não compartilhe os 25 ou mais itens da lista, mas ainda assim dá uma amostra do escopo deles. Um enfoca os impactos globais nos mercados emergentes; outro elenca as principais estimativas de inflação. Embora algumas pesquisas afetem as atuais posições da empresa, outras visam compreender temas de investimento de longo prazo.
Os projetos não serão concluídos até o final do ano. “Nosso objetivo é atingir 70% a 75%, porque chegar a 100% significa que provavelmente você não é ambicioso o suficiente”, explica. A frase dá uma amostra da cultura que fez Karen prosperar e chegar ao cargo de chefe de pesquisa em 2017, com apenas 31 anos. A promoção fez dela uma das mulheres millennials de destaque em Wall Street.
Além de supervisionar um terço dos profissionais de investimento da Bridgewater, Karen é uma das poucas pessoas com pleno conhecimento do sigiloso processo de aplicação da empresa. Ela se reporta diretamente a Ray Dalio, bilionário e fundador da companhia, bem como a seus dois outros diretores de investimento.
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“Karen tem uma curiosidade intensa, comprometimento e inteligência”, diz Dalio. “Ela é como uma esponja de aprendizados.”
Karen diz que, quando começou a estudar em Princeton, aos 17 anos, nem sequer sabia o que era uma ação. Neta de sobreviventes do Holocausto e filha de dois professores (sua mãe, de psicologia; seu pai, de engenharia aeroespacial), a jovem nasceu em Israel e cresceu principalmente na cidade litorânea de Netanya, com uma estadia de dois anos nos EUA. Destacou-se em ciências da computação e física, mas ingressou na escola Woodrow Wilson de Princeton para estudar assuntos internacionais e públicos, um interesse estimulado por um acampamento de verão da Seeds of Peace com a juventude palestina, aos 14 anos. Hoje ela atua no conselho da Seeds e como Millenium Fellow no Atlantic Council. Uma carreira em finanças? De jeito nenhum. “Eu tinha um estereótipo de quem fazia plano de negócios”, diz. “Até pensei que seria professora, como meus pais.”
Em Princeton, Karen foi apresentada a um lado mais intrigante do mundo do dinheiro por seu orientador de tese, Daniel Kahneman, um psicólogo israelense-americano que ganhou o Prêmio Nobel pelo trabalho inovador em economia comportamental. Após a formatura, em 2006, ela conseguiu um emprego na Bridgewater, onde alguns amigos já trabalhavam. A ideia era ficar por dois anos até terminar a pós-graduação.
A primeira missão de Karen foi a pesquisa de títulos com Robert Prince, o chefe de investimentos de longo prazo da Bridgewater. Ele diz que ficou rapidamente impressionado com sua capacidade da jovem de “ligar os pontos” em tópicos sobre os quais pouco sabia. Com a mesma rapidez, Karen foi absorvida pela estratégia da Bridgewater e pelo imediatismo dos mercados. “Fui atraída por pessoas intelectualmente curiosas que literalmente queriam saber como as coisas funcionam”, diz. “Adorei o fato de que, se você tivesse uma boa ideia, poderia testá-la, demonstrar provas e usar o mercado.”
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Em 2008, Dalio escolheu Karen, com 23 anos, junto a outro colega, para trabalhar com ele em seus estudos sobre a crise financeira. Mais ou menos na mesma época, ela foi apelidada de “fábrica de ideias” e designada para supervisionar sua própria pesquisa. Foi a pessoa mais jovem a ter essa responsabilidade na Bridgewater. Seu trabalho com risco premium e taxas de desconto ajudou a destacar o fundo de hedge Optimal Portfolio, da Bridgewater, lançado em 2015, que administra US$ 23 bilhões.
Prince diz esperar que Karen o substitua algum dia. “Ela realmente está apenas começando”, afirma. “É muito inteligente, tem grandes valores e uma personalidade envolvente. Una essas três habilidades e você se tornará único.” Dalio também elogia a capacidade de Karen de “trabalhar bem com os outros”, o que é um pouco surpreendente, dada a cultura corporativa da Bridgewater.
Dalio construiu a empresa em torno de seus princípios, que promovem a transparência radical e a abertura dos desentendimentos como a melhor maneira de garantir uma boa tomada de decisão. Essa abordagem, aplicada a um exército de funcionários supersmart, ambiciosos e altamente remunerados, contribui para um local de trabalho de confronto.
“Em meio a uma cultura brutalmente franca, Karen age com gentileza”, explica um ex-colega da Bridgewater. “Não quer dizer que ela não tenhas essas características, mas o que há de tão especial em Karen é que seus motivos são genuínos e ela se preocupa com os outros e com a empresa.”
Karen, por sua vez, define o modo de trabalho na Bridgewater como um choque de ideias, não de egos. “Eu tive o momento de precisar ligar para o Ray às dez da noite e dizer a ele que tal decisão não faz sentido”, lembra.” É preciso valorizar a diversidade de pensamento.”
A Bridgewater comercializa 150 mercados em todo o mundo e uma variedade de ativos. Mas é mais conhecida por negociar e alavancar títulos do governo em mercados muito líquidos, bem como as moedas em que esses valores são detidos, juntamente ao comércio de commodities. Não é uma empresa que foca no quantitativo. Em vez disso, procura por diversos sinais além do econômico, analisa sua base fundamental e depois transforma essa pesquisa em algoritmos de negociação.
Como os demais na Bridgewater, Karen tende a falar e pensar tridimensionalmente. Ela desenha um cubo em um quadro branco, a única coisa pendurada na parede de seu escritório, com vista para o rio Saugatuck. Segundo ela, o desenho representa todas as informações que a empresa acumulou ao longo dos seus 43 anos de história. As coordenadas dentro do cubo, diz, são onde diferentes ideias de investimento, incluindo ativos, países ou até mesmo conceitos, podem ser localizados. Seu trabalho é preencher o cubo com mais dados e conhecimento.
A cada seis meses, os profissionais de investimentos da Bridgewater realizam uma sessão de brainstorming para identificar e priorizar seus próximos tópicos de pesquisa. É um processo, em parte, democrático. Eles votam nos itens, mas as considerações dos cargos de destaque contam mais. Karen delega o projeto ideal para cada funcionário da lista, até não sobrar nenhum analista. Uma grande área de foco hoje é a China. Karen diz acreditar que a Ásia, em geral, e a China, em particular, devem desempenhar um papel mais proeminente nos portfólios de investimento no futuro.
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A China está no processo de abertura de seus mercados de títulos e ações para investidores estrangeiros, e dado tamanho e importância de sua economia, a maioria dos investidores globais ainda se concentra abaixo do peso chinês, afirma.
Segundo Karen, a China é o único mercado significativo no qual um banco central facilita a política monetária. Porém, os papéis chineses sofreram um abalo neste ano. Além disso, a desaceleração do crescimento econômico do país e a presença de entidades estatais dificultam o investimento. Então, a curto prazo, ela não é otimista sobre ações de empresas da China.
Grande parte do foco de pesquisa da Bridgewater é internacional. Karen afirma que as perspectivas de uma guerra de comércio global diminuíram por causa dos acordos comerciais dos EUA com o Canadá e o México. Ela aponta que os mercados de títulos de países menores são hoje mais líquidos do que há cinco anos e que isso torna os papéis brasileiro, por exemplo, mais atraentes.
Mesmo ao avaliar os mercados estrangeiros, Karen mantém um olho fixo nos EUA. Para ela, o país é o epicentro de uma grande jogada dos bancos centrais para começar a remover a liquidez que eles injetaram em suas economias por uma década. Esse aperto repercute em ativos globais.
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O que dizer das perspectivas nos EUA? Karen espera que o estímulo fiscal dos cortes de impostos do Trump diminua à medida que o aperto da política monetária continue. Em agosto, ela alertou os clientes da Bridgewater de que os ativos norte-americanos (principalmente ações), por terem se recuperado mais rápido da crise financeira do que os de outros países, estavam precificados para a perfeição e, portanto, vulneráveis. Essa vulnerabilidade, ela observa, foi exposta um pouco pela venda de ações de outubro.