Em uma única semana, o mundo perdeu um ícone do mundo da moda e outro da gastronomia, ambos por suicídio. Kate Spade e Anthony Bourdain, no entanto, permanecem como lembretes de que mesmo as pessoas que parecem ter tudo – sucesso, fama e dinheiro – também podem sofrer de depressão.
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A organização que eu lidero, a New York City Hospitality Alliance, organizou recentemente uma palestra sobre suporte a chefs, cozinheiros e funcionários de restaurantes que sofrem de doenças mentais e que lidam com o abuso de álcool e substâncias ilícitas. Entre os palestrantes estava a escritora Kat Kinsman, que canalizou o desejo do setor de expressar seus sentimentos, compartilhar suas histórias e dar apoio uns aos outros ao lançar seu site, “Chefs with Issues” (Chefs com Problemas, em tradução literal). Outros palestrantes criaram iniciativas para dar apoio às pessoas do segmento também, como a Ben’s Friends, uma organização formada em homenagem ao Chef Ben Murray, que se suicidou depois de enfrentar o alcoolismo.
Para algumas pessoas, trabalhar em um restaurante é apenas isso – um trabalho. Para outras, no entanto, é um meio de encontrar significado em suas vidas. Mas, independentemente de elas trabalharem nesses estabelecimentos apenas para pagar suas contas ou por vontade própria, é um emprego difícil: são noites viradas, finais de semana inteiros e feriados de trabalho, correria nas cozinhas, clientes complicados, rotinas sem tempo livre, chefes rigorosos, suspense pelas avaliações dos críticos… Ou como disse Anthony Bourdain certa vez: “Você luta um ano inteiro para juntar dinheiro, abre um restaurante, trabalha com paixão e, 10 minutos depois da inauguração, algum idiota está tuitando que aquele é o pior jantar de todos os tempos”.
As pessoas que já trabalharam na setor de restaurantes sabem que a mente, o corpo e a alma sofrem – mesmo quando você está com estados emocionais e mentais mais fortalecidos. Nossa indústria é incrível, mas é dura. As pessoas frequentemente usam essa dureza como uma medalha de honra. Mas ela não deveria ser usada como um distintivo que mascara angústias.
Eu acredito que dar apoio para que as pessoas se fortaleçam é fator de interesse de todo o segmento. Os restaurateurs deveriam criar uma cultura organizacional em que problemas mentais não sejam mais um estigma e o uso de álcool e drogas não sejam enaltecidos. Amparar funcionários com esse tipo de necessidade é vital, assim como encontrar a solução certa para cada local de trabalho.
Manuais de funcionários deveriam ser atualizados com informações sobre programas de auxílio a pessoas com doenças mentais e abuso de substâncias ilícitas e de álcool. Isso inclui recursos para aqueles sem plano de saúde e estrangeiros. A cidade de Nova York , por exemplo, conta com o ThriveNYC, uma robusta iniciativa que oferece serviços gratuitos de saúde mental.
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Empregadores deveriam trabalhar com o fornecedor de seu plano de saúde para encontrar os benefícios apropriados para apoio à saúde física e mental e, assim, oferecer aos seus funcionários acesso a linhas diretas de emergência, serviços de aconselhamento e até centros de tratamento a longo e curto prazos.
Nós entendemos a urgência de encorajar diálogos nos locais de trabalho sobre estes temas, mas também advertimos os restaurantes a confiarem nos especialistas em conselhos e lembramos que há preocupações sobre segurança e questões legais a respeito da privacidade do funcionário.
Os restaurantes podem providenciar às suas equipes alternativas seguras para empregos com rotinas tóxicas. Um exemplo é a criação de grupos de corrida, que aumentam a amizade entre as pessoas e promovem uma cultura no local de trabalho. Eles melhoram o espírito de equipe e proporcionam um fim de expediente saudável para os trabalhadores, em vez de noitadas regadas a muita bebida e ressacas no dia seguinte.
Uma carreira de sucesso em restaurantes exige muito do estilo de vida. Por isso, é importante colocar esforço extra no tempo livre, uma quebra na rotina diária, por meio de experiências de melhoria da vida e do trabalho. Isso ajuda a aperfeiçoar o estado mental da equipe, o que acaba se refletindo no trabalho e na vida deles.
Doenças mentais e abuso de álcool e de drogas são assuntos sensíveis, porém essenciais para a sustentabilidade e vitalidade da indústria de restaurantes.
O nascimento do restaurante moderno foi em Paris, no final dos anos 1700, um lugar onde as pessoas iam em busca de uma renovação saudável. A palavra ‘restaurante’ é derivada do verbo francês ‘restaurer’, que quer dizer “restaurar”. Como parte desta comunidade, nós precisamos revisitar a origem da palavra. E mostrar hospitalidade para nossa própria gente, porque isso pode ajudá-los a fazer escolhas na vida.