Aproximadamente 35 mil pessoas impactadas por demissões no Brasil terão que passar pelo processo de busca de emprego, segundo dados colhidos pelo portal Layoffs Brasil, plataforma que reúne informações sobre demissões em massa. Um dos desafios que elas possivelmente terão que enfrentar é lidar com inteligências artificiais de plataformas online envolvidas no processo seletivo, que são cada vez mais usadas pelos departamentos de RH. Uma pesquisa de 2022 da Predictive Hire, companhia global de tecnologia de recrutamento, mostra que 55% das empresas aumentaram seus investimentos em automação de recrutamento em 2022.
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No último mês, a consultoria de gestão de pessoas Cia de Talentos, testou o ChatGPT como ferramenta em uma dinâmica de grupo e indicou os candidatos a usarem o bot para apoiar sua apresentação pessoal. “A nossa maior surpresa foi ver que o ChatGPT é como se fosse mais uma pessoa participando do processo. Usá-lo como meio para ver como cada um se comporta e aplica seu pensamento crítico foi valioso”, diz Paula Esteves, co-CEO da Cia de Talentos.
Embora a inteligência artificial não consiga substituir (por enquanto) os humanos no processo de contratação, ela faz tarefas operacionais que antes ocupavam parte de seus dias de trabalho. Classificar informações de currículos, criar descrições de vagas ou mensagens para candidatos, por exemplo. “Eu acredito na união da inteligência artificial com o RH, mas existe o risco de empresas usarem como uma tomadora de decisão. Isso pode levar a escolhas equivocadas”, diz Esteves.
O setor de recrutamento vê a introdução de tecnologia na área como uma tendência que deve gerar impactos em seus processos. Mas nem sempre estão otimistas. Apesar de 67% dos recrutadores acreditarem que a inteligência artificial pode ser útil no processo de contratação, 26% deles crêem que essas tecnologias podem destruir a indústria de RH de acordo com o relatório da empresa de tecnologia corporativa norte-americana Tidio.
A inteligência artificial não vai tirar você do processo
Os maiores riscos em colocar a inteligência artificial no processo seletivo é ela desconsiderar experiências e qualidades incomuns que o candidato tenha e a criação de algoritmos enviesados, segundo o estudo da Tidio. Isso acontece porque o machine learning – ou seja, o aprendizado da ferramenta de IA – parte de uma base de dados e, depois, busca e replica padrões. “Se você não interfere neste padrão da IA e ensina a máquina a usar ferramentas diferentes, ela vai apresentar viés e começar a agir sozinha”, diz Paula.
Por isso, nas etapas importantes do processo de contratação, a IA atua como um ajudante do profissional de RH, não como um tomador de decisão. Na maioria das vezes, ele não vai desclassificar alguém pelas informações contidas no seu currículo, mas sim, classificar os perfis que mais se encaixam na vaga. “Na Gupy, a IA não descarta pessoas candidatas, ela só atua na ordenação de currículos em uma lista, ou seja, 100% dos currículos enviados para uma vaga estarão nesta lista”, afirma Guilherme Dias, CPMO e cofundador da Gupy.
Outras funções da IA no processo seletivo são criar e personalizar trilhas de aprendizado – testes virtuais para avaliar conhecimentos e a personalidade do candidato –, elaborar questões de entrevistas conforme o perfil do candidato, elaborar, enviar imagens aos participantes do processo e, inclusive, ajudar os próprios candidatos em dinâmicas e apresentações pessoais.
Não são só suas experiências que importam
No último mês, a Cia de Talentos testou usar o ChatGPT como ferramenta de consulta aos envolvidos em uma dinâmica em grupo e indicou os candidatos a usarem a ferramenta para ajudar em suas apresentações pessoais. “A nossa maior surpresa foi ver que o ChatGPT é mais uma pessoa participando do processo. Usá-lo como meio para ver como a pessoa se comporta e aplica seu pensamento crítico foi valioso”, diz Esteves sobre os resultados do projeto-piloto.
O teste com o ChatGPT exemplifica uma tendência de buscar mais as softskills, habilidades e qualidades do candidato no processo seletivo, já que a inteligência artificial identifica para o profissional de RH as informações mais objetivas sobre o perfil da pessoa – como formações ou experiências. “A IA tem nos permitido centralizar o trabalho nas capacidades que só nós, seres humanos, temos de usar pensamento crítico, fazer correlações, colocar emoção em algo e construir posições diferentes”, afirma Esteves.
Beatriz Pinaffi, que hoje trabalha com comunicação no setor de investimentos do Itaú Unibanco, se candidatou para uma vaga na empresa por um processo seletivo online. “Mesmo conseguindo a vaga depois de uma etapa única de entrevista com coordenadores da área, ainda tive um pequeno trabalho de incluir palavras-chave no meu currículo para passar por uma primeira peneira e conseguir falar com pessoas”, diz. Melhor falando, não é porque o processo inclui etapas que requerem outras habilidades que você não deve ter cuidado em como a tecnologia vai entender o seu perfil.
Como aumentar as chances de ser contratado em um processo seletivo com IA
Pelo funcionamento da IA envolver padrões e a busca por adequação no perfil de um profissional da vaga disponível, formatar o seu currículo envolve facilitar que a tecnologia leia seu perfil como uma boa combinação com a vaga. Confira as dicas de Paula Esteves e Guilherme Dias:
Utilize palavras-chaves específicas para seu mercado
Estuda a área e o mercado para a qual está se candidatando e encontre termos utilizados para descrever atividades, experiências ou qualidades de alguém do ramo. Como a IA trabalha identificando padrões, seu perfil tem mais chances de ser favorecido por tal tecnologia se as descrições das suas experiências e competências são semelhantes a de outros profissionais da área. Não que as situações sejam as mesmas, mas você pode aproveitar palavras-chave mais buscadas. Usar ferramentas como o Google Trends pode ajudá-lo a ser mais visto.
Estude a linguagem utilizada em sua área
Busque entender como está o mercado no qual você está trabalhando ou para o qual vai aplicar. Seja os desafios mais comuns aos profissionais dessa área, as ferramentas que mais utilizam e a linguagem falada e escrita. Isso pode ser feito de várias maneiras, seja fazendo cursos específicos, estudando vídeos e influenciadores (que de fato dominem o assunto). “Há várias formas de se conectar com as necessidades da área e entender sua linguagem e ferramentas mais usadas”, diz Esteves.
Saber como contar a sua história para que a IA leia
O seu currículo reúne suas vivências profissionais e formações acadêmicas, mas não te define como pessoa. Seguindo a tendência de valorização de soft skills e habilidades, saiba dizer quem você é para mostrar como poderia contribuir com a empresa, como se encaixa na vaga e como seus valores se aproximam aos do empregador. Não se esqueça de usar palavras e descrições colocadas no job description e na comunicação da empresa para ser encontrado pela IA.
Filtre suas experiências
“Você não deve contar todo o seu histórico profissional no currículo, como muitos pensam”, diz Dias. Foque em descrever o que for relevante para a vaga, como as ferramentas que você utilizava, sistemas e tecnologias que você domina, as atividades que fazia e que demonstram suas habilidades e outras informações que podem te destacar como alguém de perfil que pode contribuir para as funções descritas na vaga. Esses são os detalhes que serão mais buscados.
Construa um currículo objetivo mas detalhado
Quanto mais informações e detalhes seu currículo tiver, melhor. Mas seja assertivo. Para se envolver no recrutamento, a IA precisa entender profundamente o contexto do currículo e o que a empresa precisa para poder ordenar os perfis de acordo com a a afinidade e com a vaga. Assim, concentre-se em mostrar o que você já fez e não falar o que você sabe fazer, além de sempre citar exemplos de situações em que a sua habilidade apareceu.