O ano de 2021 começou agitado no Agro Paulista, o motivo? Uma enorme mobilização contra o aumento do ICMS, Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços, que foi aprovado no apagar das luzes de 2020.
De acordo com o Centro de Agronegócio da Fundação Getulio Vargas, nos últimos 25 anos, 87% de toda a arrecadação estadual vem do ICMS. Buscando reequilibrar as contas públicas, que pioraram devido à crise do coronavírus, o governo estadual publicou a Lei Estadual 17.293 que revisa o ICMS, reduzindo a isenção de impostos a alguns setores, entre elas insumos agropecuários, máquinas e implementos agrícolas.
O agro representa 12% do PIB do estado de São Paulo, o estado responde por 16,9% das exportações brasileiras no setor, 11,9% do Valor Bruto da Produção (VBP) agropecuária e foi o setor que se destacou frente à crise causada pela pandemia do novo coronavírus, com um crescimento de 10,7% no VBP agropecuária e de 12,5% das exportações em 2020 em comparação ao mesmo período de 2019, segundo relatório emitido pela FGV/Agro. De acordo com os autores, o aumento do ICMS poderia resultar em uma perda de consumo de até R$ 21,4 bilhões em bens e serviços e uma redução de R$ 6,8 bilhões no Produto Interno Bruto (PIB) da região Sudeste.
O setor do agronegócio organizou uma enorme manifestação ontem (7), com mais de 200 municípios confirmados, quando então, na noite anterior, o governo suspendeu parcialmente o corte aos subsídios. Suspender é uma ação vaga, pois a qualquer momento o corte aos subsídios pode retornar, pois se revoga os decretos, mas a lei continua. A qualquer altura, pode-se fazer outros decretos e desta maneira promover novos aumentos iguais ou piores. O que traria segurança, seria revogar a lei.
O que se diz, que não haveria aumento de impostos é puro jogo de palavras. Haveria aumento de tributação, o que dá na mesma. Os insumos e produtos do agronegócio que eram isentos, passariam a sofrer a carga tributária de 4,14%, impactando assim, os preços de toda a cadeia, em cascata.
Além da retirada da isenção, haveria o aumento de alíquotas, produtos que pagavam alíquotas de 7% passariam para 9,4% (aumento de 34,28%), outros pagavam 12% seriam majorados para 13,3%, aumento de 10,83%.
Acima de tudo, criou-se um enorme desequilíbrio em uma estrutura que estava ajustada desde o Convênio ICMS nº 100, publicado em 1997 entre todas as unidades da Federação para manter a competitividade dos produtos agropecuários nos mercados nacionais e internacionais.
O agronegócio continua sendo um dos setores mais impactados, toda a cadeia de valor do agro sofre com a mudança na tributação, a indústria de produção de insumos, cooperativas, distribuidores, produtores rurais, principalmente os pequenos produtores rurais, agroindústrias e por fim, os consumidores finais.
A maioria das empresas do agro trabalha com contratos firmados para a próxima safra, portanto, é essencial a previsão de custos. O produtor rural lida com uma série de situações além do seu controle, seca, chuva, variação de preços no mercado e da mesma forma, trabalha com preços fechados a futuro, desta maneira, toda a cadeia do agronegócio foi surpreendida pela mudança na regra do jogo, com o ajuste fiscal, feito na surdina.
As empresas e produtores rurais terão que fazer uma cuidadosa avaliação e correção de rota, pois a insegurança gerada pela incerteza de mudança das regras, sem plano de transição, pode trazer prejuízos comerciais e tornar os produtos produzidos no estado de São Paulo menos competitivos quando comparados a outros estados. Outra consequência é que grandes empresas podem optar por transferir suas operações para outros estados, impactando assim a geração de empregos no estado. Esta mudança, pode vir a gerar também uma guerra fiscal entre os estados da Federação.
Quem mais deverá sofrer o impacto, entretanto, são as famílias de baixa renda, que têm na alimentação uma de suas maiores fontes de despesas. Com o aumento do ICMS, sem contrapartidas para garantir comida na mesa de famílias, o poder de compra da população, especialmente de baixa renda tende a cair, dificultando o acesso a itens básicos como carne, leite, vegetais, hortaliças e frutas. “Quando você aumenta o imposto ou tira a isenção, principalmente dos produtos mais básicos, quem paga é o mais pobre”, explica Alberto Ajzental, economista da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Em entrevista ao “G1” em 22 de dezembro, ele afirmou: “Outro ponto importante é que estão aumentando os impostos de gêneros como legumes e hortaliças, que são alimentos super saudáveis e importantes para a população. É pior aumento de imposto que você pode trazer para a população”.
De acordo com o jornal o “Estado de São Paulo”, a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) e a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec) emitiram nota citando o impacto da mudança sobre os preços de alguns itens de peso importantes na composição dos principais índices de inflação. O leite longa-vida subiria 8,4%; as carnes, 8,9%; energia elétrica para estabelecimento rural, 13,6%; e têxteis, couros e calçados, 8,9%, suco de laranja e queijos terão sua alíquota aumentada para 13,3%.
Houve suspensão parcial do corte aos subsídios, no comunicado divulgado ontem foi informado a suspensão do ICMS sobre alimentos, mas não foi especificado qual produto seria poupado, porém assuntos importantes ficaram de fora: diesel, sementes, energia elétrica, leite longa vida e hortifrutigranjeiros, esses dois últimos, itens fundamentais nas cestas básicas.
Segundo os pesquisadores da FGV/Agro, haverá uma inversão de consumo, um aumento de gastos do governo enquanto ocorre uma diminuição do consumo por parte da população mais pobre. Para cada R$ 1,00 adicional de arrecadação, haveria uma queda de R$ 2,75 no consumo.
A solução? Reduzir gastos ao invés de aumentar os impostos.
O Brasil tem vocação natural para produzir, o agro é um setor eficiente, que devido ao seu destaque, tem se tornado a opção mais óbvia para buscar arrecadação e equilibrar as contas públicas, quando na verdade o objetivo deveria ser a simplificação e segurança jurídica, que tragam desenvolvimento e mantenham o agro na sua trajetória de trabalho e produtividade.
Helen Jacintho é engenheira de alimentos por formação e trabalha há mais de 15 anos na Fazenda Continental, na Fazenda Regalito e no setor de seleção genética na Brahmânia Continental. Fez Business for Entrepreneurs na Universidade do Colorado e é juíza de morfologia pela ABCZ. Também estudou marketing e carreira no agronegócio. E-mail: [email protected].
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