Uma pesquisa recente do Datafolha confirmou uma sensação que nós, médicos que lidam com saúde mental, tínhamos desde que a pandemia se instalou no país: a maioria dos brasileiros convive há um ano com sobrecarga de trabalho.
Excesso de tarefas e jornadas que se estendem demais são algumas das coisas que mais afetam a saúde mental. Não por acaso, quando se perguntou aos entrevistados que sentimentos tinham aflorado nesse período, 66% relataram ter ficado ansiosos, 61% reclamaram de exaustão e 54% se queixaram de problemas para dormir.
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É fato que muitas organizações, estimuladas pela conectividade instantânea e 24 horas que aplicativos como o WhatsApp possibilitam, acabam por sobrecarregar os colaboradores, esticando as horas de trabalho para muito, mas muito além do razoável.
Mas também é fato que temos uma parcela de culpa pelo excesso de trabalho. É quase como se fôssemos os nossos próprios carrascos. Em tempos de crise econômica, muita gente passou a trabalhar mais, como se isso fosse determinante para uma não demissão. Geralmente não é.
Trabalhar mais não é sinônimo de trabalhar bem. Ao contrário. A produtividade cai, porque mente e corpo têm um limite para conseguir dar conta de demandas físicas ou mentais. Além disso, a vida pessoal acaba pagando a conta por essa sobrecarga e isso de alguma forma afeta o desempenho no trabalho.
Outras pessoas usam o trabalho quase como se fosse uma válvula de escape. Se o mundo está desesperador e a vida pessoal de pernas para o ar, passar mais horas na frente do computador ou no escritório torna-se uma maneira de fugir do que está ruim.
Quais as saídas para que essa sobrecarga não o afete demais? A primeira dica é ter disciplina. O que significa indisciplina no ambiente de trabalho? É deixar de se cuidar. Assim, se realmente você tem uma demanda de trabalho que vai exigir de você mais de 8 horas diárias, procure fazer pausas curtas ao longo do dia, para se levantar da cadeira, dar uma caminhada, tomar um café, se alongar, tomar água. Esses intervalos ao longo do dia são necessários. O mundo não vai acabar se reservar para você 5 ou 6 pausas de 5 a 7 minutos durante a jornada diária.
Deixe o celular fora do alcance na hora do almoço, jantar e, principalmente, na hora de dormir. O trabalho pode, sim, invadir a vida privada se abrirmos a porta para ele. Se permitirmos, mensagens com solicitações podem chegar a qualquer momento do dia e da noite. Os horários das refeições e, principalmente, o de descanso, no quarto, devem ser sagrados. Faça uso desses momentos para conversar com a família, com os filhos, sobre outros assuntos, para olhar notícias, responder a mensagens que amigos enviaram. Se a empresa para a qual você trabalha deu a você um horário de almoço, use-o para realmente relaxar.
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Qual é o seu limite? Pare para refletir sobre isso. Você não deve varar a noite trabalhando só porque um ou outro colega faz isso. Pontualmente, até é possível encarar, mas cuidado se demandas fora de hora se tornam uma rotina. Alguns podem ter até um limite mais largo, porém, pense se isso é para você.
Faça algum exercício. Atividade física feita de forma regular – e regular significa 5 dias na semana – ajuda a manter a ansiedade e o estresse sob controle, além de trazer todos os outros benefícios para a saúde que se conhece.
Dr. Arthur Guerra é professor da Faculdade de Medicina da USP, da Faculdade de Medicina do ABC e cofundador da Caliandra Saúde Mental.
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