O termo mindfulness, traduzido para o português como “atenção plena”, designa um estado mental e o conjunto de técnicas e exercícios meditativos que permitem alcançá-lo. “O mindfulness é conhecido como uma técnica de meditação, mas é um estado da mente, uma atitude. Esse estado é sustentado pela meditação formal – que é muito importante, mas também temos outras práticas e exercícios”, explica Moira Malzoni, especialista em mindfulness pela Universidade da Califórnia, Los Angeles, e proprietária do estúdio Moved by Mindfulness, em São Paulo.
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As práticas de mindfulness, encontradas em diversas culturas e cada vez mais incorporadas na psicologia e na medicina, consistem, basicamente, em focar a atenção na experiência do momento presente.
Um dos principais diferenciais do mindfulness é que ele não precisa ser praticado em um momento ou em uma situação específicos. “É para aplicar no dia a dia”, comenta Moira. “Você pode estar mindfulness o dia inteiro”, completa Marcelo Maia, especialista pela Unifesp e sócio de Moira no estúdio, chamando atenção para o fato de que não se trata de um exercício de relaxamento, mas de atenção. “Quando falamos em treinar a atenção, queremos dizer trazer a atenção para o dia a dia, trazer consciência”, explica.
Outro aspecto do mindfulness que muitas vezes é deixado de lado é a mudança de atitude que a prática propõe. “O mindfulness também é uma questão de gentileza, com os outros e consigo mesmo. É estar atento ao momento presente, mas sempre com uma atitude gentil”, explica Paula Lage Pasqualucci, pediatra e especialista em mindfulness para crianças pelo método Eline Snel.
Evidências científicas têm comprovado que a prática ajuda a reduzir o estresse, limpar a mente da rotina habitual, liberar criatividade e compaixão, aumentar a produtividade e construir uma força interior capaz de fazer com que fatores de exaustão tenham menos impacto na felicidade e no bem-estar físico.
O mindfulness já é uma prática popular no Brasil há cerca de 6 anos, segundo Moira. Porém, apenas muito recentemente passou-se a pensar na aplicação da prática para crianças, que, segundo Paula, pode trazer diversos benefícios: “No caso das crianças, eu vejo três grandes vantagens. A primeira delas é a melhoria da qualidade de vida e do autocuidado. A segunda é o cuidado da saúde mental, que resulta na prevenção de doenças como depressão e ansiedade. E, finalmente, o incremento das funções executivas, muito ligadas à flexibilidade cognitiva, e do autocontrole, que são coisas fundamentais para o aprendizado.”
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Outra questão muito importante é o controle do estresse tóxico, que é aquele que está acima dos limites aceitáveis e que, normalmente, vem de um contexto familiar difícil. “É um fator muito prejudicial para o aprendizado: a criança não consegue se concentrar, tem alterações de humor, de sono e de memória. O mindfulness também atua nesse sentido”, completa Paula, que ministrará, a partir de maio, o primeiro curso de mindfulness para crianças baseado no método Eline Snel no Brasil, no estúdio Moved for Mindfulness.
Além do estresse tóxico, até mesmo o estresse do dia a dia pode ser reduzido por meio da prática do mindfulness – tanto para adultos quanto para crianças. “O estresse vem desse pêndulo: de a gente estar no presente, mas nossa cabeça estar no futuro ou no passado, o que faz com que nunca consigamos realmente aproveitar as experiências que estamos vivendo. O mindfulness tem a capacidade de trazer a gente para o presente e, assim, reduzir o estresse”, explica a especialista. “O que nos estressa, tanto às crianças quanto aos adultos, é a mudança contínua muito rápida do foco mental. Para acalmar a mente, basta aprender a deixá-la em um só lugar”, completa Honório de La Iglesia Lopes, psicólogo e professor do projeto Mindfulness in Schools, que está em fase de implementação em uma escola de Curitiba.
Assim como a prática da atenção plena traz para os adultos um maior autoconhecimento, pois em determinado momento o foco passa a ser as emoções, o mesmo vale para os pequenos. “As crianças, muitas vezes, ficam bravas ou choram e não entendem de onde vem aquilo. O autoconhecimento que o mindfulness traz pode ser muito útil nas relações interpessoais também para elas”, comenta Paula. Outro benefício que a especialista diz ter percebido em seus pacientes é o aprendizado da respiração e a calma obtida antes, por exemplo, das provas. Ou seja, lidar com o dia a dia de maneira mais tranquila. “O mindfulness ajuda a aumentar o foco na hora dos estudos, mas também proporciona mais capacidade emocional, por meio da observação das emoções e da condução da mente para a realidade concreta”, conta Lopes.
“É muito difícil ver escolas ou famílias que conseguem ensinar às suas crianças como lidar com as emoções. E as pessoas têm começado a entender como é importante trazer essas ferramentas para a realidade delas. O mindfulness atende a essa demanda”, opina Moira. Lopes compartilha do ponto de vista: “Nós temos um foco muito grande em desenvolvimento cognitivo. Ensinamos português, matemática e geografia. Mas é fundamental ensinar às crianças habilidades que elas podem usar na vida. Se ensinamos tanta coisa, por que não ensinar a lidar com a própria mente?”, pergunta.
Pode ser difícil, no entanto, imaginar como ensinar a prática às crianças. Paula, no entanto, garante que não é difícil: basta abusar da criatividade. “No caso delas, temos que usar recursos mais lúdicos e concretos. Para prestar atenção na respiração, a gente diz para ela colocar a mão sobre a barriga, entender como funciona enchendo uma bexiga ou soprando uma bolha de sabão. Assim, as coisas se tornam mais concretas e elas entendem e conseguem praticar”, explica.
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Honório Lopes também aposta em recursos lúdicos para entrar no imaginário das crianças. “Uma ideia é dizer para elas baterem palmas e sentirem as mãos. Fecharem os olhos e perceberem como a mente pode sentir a mão direita, a esquerda, um dedo por vez… Usando algo tão simples como as sensações corporais como foco”, explica. Tudo isso, segundo Paula, já pode ser ensinado a partir dos 4 anos de idade.
Levando em consideração todos esses benefícios, não surpreende que o mindfulness já venha sendo ensinado em escolas. O movimento, ainda incipiente no Brasil, é particularmente forte em países como Reino Unido e Espanha. No entanto, enquanto a tendência não chega por aqui, os próprios pais podem, aos poucos, introduzir a prática aos seus filhos.
A sugestão de Paula é começar com algo tão simples quanto compartilhar uma atenção de qualidade com as crianças, momentos em que se está realmente presente. “É sentar por dois minutos para tomar água, perguntar como foi a escola e realmente ouvir a resposta, sem fazer várias coisas ao mesmo tempo. É, de fato, estar com a criança.” Perguntar como a criança está, segundo a especialista, é uma forma de fazê-la pensar no momento presente.
Outra possibilidade, ainda, é criar pequenos jogos. Como exemplos, Paula cita propor que a criança conte o número de placas vermelhas ou de árvores que aparecem no trajeto até a escola. “Pode parecer um joguinho simples, mas traz a atenção para o momento presente”, explica.
Para Lopes, é fundamental que os pais conheçam as técnicas de mindfulness antes de tentar passá-las para os filhos. “É interessante que os adultos experimentem os benefícios. Tomem consciência de que, na maior parte do tempo, vivemos no piloto automático. Estamos fazendo algo, mas a mente está em outro lugar. Isso tudo é possível de ensinar para as crianças – mas, para poder ensinar, os pais precisam experimentar.” Moira completa: “É aquela velha história: você quer que seu filho coma salada, mas você come hambúrguer. Você quer que ele beba água, mas você beba refrigerante. Precisamos alinhar o discurso e a ação.”