Produzimos uma newsletter semanal interna do Atelier que nos ajuda a identificar os temas que estão em alta nas conversas digitais e que têm a ver com os assuntos de especialidade dos nossos clientes. Nas últimas semanas, ela tem trazido uma informação recorrente – e animadora – que me chamou a atenção: “A expressão ‘autoconhecimento’ apresenta curva de crescimento nas buscas”. As pessoas estão procurando, principalmente, definições, frases e livros sobre o assunto. Não me parece ser mera coincidência que pesquisas recentes da faculdade de Medicina de Harvard indiquem que empatia é a principal característica que um líder deve ter, segundo conclusão do psicólogo norte-americano Daniel Goleman.
Goleman é autor de vários livros sobre o assunto, entre eles o best-seller “Inteligência Emocional”, lançado em 1995. Desde então, tornou-se uma referência no tema, unindo-se ao legado deixado por outro norte-americano, Dale Carnegie, que viveu até 1955. Em 1936, Carnegie publicou o clássico “Como fazer amigos e influenciar pessoas” e desde 1912 já tinha seu instituto, Dale Carnegie Training, que ainda hoje oferece cursos de desenvolvimento humano.
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Eu tinha 12 anos quando o livro de Goleman foi lançado – e levou o debate sobre a importância das emoções a um alcance mais amplo do que tinha até então (estaria Carnegie à frente de seu tempo?). Lembro-me de ver “Inteligência Emocional” circulando pela minha casa, como tantos outros livros sobre emoções.
Meus pais se conheceram na faculdade de psicologia e, embora no início de suas carreiras nenhum dos dois trabalhasse na área, respiravam assuntos ligados a ela. Estudei em escolas construtivistas porque eles queriam que eu aprendesse a questionar e a compreender – e não a decorar e repetir fatos e conceitos. Em casa, aprendi a falar, na mesa do almoço, sobre o mundo interno mais do que sobre outros temas. O que estávamos sentindo diante de determinada situação? Como lidar com os impulsos, por exemplo, quando contrariada? A importância de conhecer as próprias intenções por trás das ações. A relação intrínseca entre expectativa e frustração. E por aí vai.
Acredito que por causa da influência, comecei a fazer terapia aos 10 anos e passei minha adolescência buscando respostas sobre a existência humana e a organização do mundo em livros de psicologia e em filosofias espirituais. Encontrei muito mais perguntas do que respostas. Pouco a pouco, comecei a compreender minhas próprias crenças (alimentando algumas e desconstruindo outras), a estabelecer princípios pessoais e, o mais importante, a considerar o auto aprimoramento constante como o propósito maior da vida.
Tornei-me praticante de yoga e trabalhei em lugares que me permitiram pesquisar temas ligados à empatia sob diferentes perspectivas – primeiro a do comportamento; depois a de negócios, cultura corporativa e liderança.
Minha sensação é que os mundos da emoção e da razão começaram a se encontrar publicamente nas últimas décadas. O universo pragmático foi incorporando, cada vez mais, palavras como inteligência emocional e autoconhecimento. Surgiram muitos outros livros derivados daqueles que ficaram conhecidos como os precursores. Outras vertentes trouxeram abordagens diferentes, mas igualmente centradas nas emoções. O universo do trabalho passou a chamar “recursos humanos” de “pessoas” e “gente”, as habilidades de relacionamento (soft skills) ganharam protagonismo e as competências sócio-emocionais agora fazem parte do currículo de escolas contemporâneas. O “comando e controle” nas empresas teve de abrir espaço para novas formas de liderança, ancoradas mais em influência e respeito do que na hierarquia do organorama.
Goleman baseou seus trabalhos mais recentes nas pesquisas de Harvard que mostram o que foi chamado de cérebro social. “São partes do cérebro humano que interagem para que aconteçam as relações, a compreensão do outro, a empatia”, segundo um artigo publicado aqui na Forbes. A conclusão do psicólogo é que a empatia é a base da comunicação e da liderança efetiva, seja no ambiente profissional, escolar ou familiar. Essa constatação valida outra, que aprendi com meus entrevistados e clientes (e sobre a qual já escrevi aqui): todo problema em uma empresa passa por um problema de comunicação.
Com base no que aprendi até aqui sobre o tema, estudando o assunto sob variados pontos de vista e lidando com líderes de algumas das maiores empresas do Brasil e do mundo, compartilho a seguir cinco elementos que considero formarem a chave da comunicação empática – e, portanto, da liderança.
1. Autoconhecimento. Ter consciência das próprias emoções, saber o que não sabe, discernir opiniões de fatos e desenvolver o domínio sobre os próprios impulsos é o início de qualquer relação. Para ter a “capacidade de prestar total atenção ao outro e perceber o que a pessoa está sentindo” (definição de Goleman para empatia), é preciso antes saber fazer isso consigo mesmo. Continua valendo o antigo aforismo grego “conhece-te a ti mesmo” pois esse é um conhecimento que nunca se esgota.
2. Confiar primeiro. É a lei da reciprocidade: se quer ser confiável, confie. Se quero compreender o outro, preciso estar disposto a me apresentar e ser também compreendido, por mais arriscado que isso possa parecer. Muitas vezes, o obstáculo para ver o melhor do outro é justamente deixar o seu melhor aparecer. Numa relação de confiança, alguém precisa dar o primeiro passo no escuro.
3. Escutar ativamente. Esta talvez seja a atitude mais simples e mais difícil numa conversa. A arte de conciliar o barulho interno com o que vem do outro. O silêncio real, capaz de baixar o volume dos próprios pensamentos e generosamente deixar os do outro entrarem. Ter a curiosidade necessária para entender o que suas palavras significam para ele. Não necessariamente comentar. Sorrir, sem falar. Prestar a atenção.
4. Honrar o que fala. Assim como a empatia começa antes da interação com outra pessoa, também continua depois. Você constrói uma comunicação empática ao revelar-se confiável – e isso só se fortalece com o tempo. Você honra o que fala? Cumpre o que promete? É consistente com seus princípios?
5. Relacionar-se com pessoas. E não com cargos ou títulos. Independentemente de posições, há ali uma pessoa. Relacione-se com ela, sem ir para o extremo do deslumbramento se for alguém importante no contexto; nem do desprezo, se ocupar um papel sem relevância. As vestimentas sociais mudam, mas pessoas são sempre pessoas. Você pode fazer essa escolha pelo prazer de se relacionar de maneira próxima e descontraída, para se divertir e aprender com quem quer que seja.
Gosto muito de uma frase do psiquiatra e psicoterapeuta Carl Jung que resume essa abordagem: “Conheça todas as teorias, domine todas as técnicas mas, ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana.”