Em reuniões com clientes, Poliana Casal se incomodava de ser a única mulher na mesa. Executiva com carreira em finanças, já foi questionada em sua credibilidade e desacreditada por ser considerada nova demais para um cargo de gerência. “Cheguei a ter receio de anunciar que estava grávida pois formei uma imagem sobre o que é ser mulher no ambiente corporativo.”
Há oito meses, Casal assumiu o cargo de CFO (Chief Financial Officer) para América Latina na GE Power Conversion, onde começou há 15 anos como trainee, ajudando um pouquinho a mudar o perfil do profissional que ocupa esse cargo. De acordo com uma pesquisa do Insper e da consultoria de RH Asset divulgada em 2022, o CFO brasileiro é, em sua maioria, homem, branco e está na faixa de 48 anos de idade.
Aos 37 anos, primeira mulher no cargo na GE Power Conversion, Casal deixa claro que não queria esse pioneirismo, apesar de entender a importância da representatividade na cadeira que ocupa. “Eu entendo o que representa para outras mulheres dentro e fora da GE, mas isso tem que ser normal.”
Representar essa mudança de perfil foi um dos atributos que a levou ao posto. “Vim com o papel de trazer novas ideias em um grupo homogêneo. Tenho uma visão holística do negócio. Vejo que qualquer decisão que a gente toma tem impacto em diferentes áreas.”
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Foi com esse olhar, e percebendo como uma empresa de energia tem influência sobre o meio ambiente, que ela começou a encabeçar projetos sustentáveis na empresa. E ao mesmo tempo, como profissional de finanças, considerar a lucratividade do negócio. “Esse último ano, em termos de resultado financeiro, foi um dos melhores dos últimos oito anos na região.”
A GE Power Conversion é um braço da GE responsável por produzir motores e geradores para diversas indústrias – plataformas de petróleo, usinas hidrelétricas e até mesmo brinquedos da Disney. De 2020 a 2022, a empresa viu um crescimento médio anual de 21% na receita e aumentou quatro vezes o lucro operacional e seis vezes o caixa. E Poliana esteve à frente das estratégias responsáveis por esses números, especialmente em 2022, um ano importante para a retomada do negócio pós-pandemia.
A resiliência da 1ª mulher CFO
Poliana reconhece que ainda há muito caminho a trilhar, mas sua positividade também faz parte da líder que é hoje. “Minha mãe não me deu esse nome à toa. Poliana é uma menina sonhadora, mas no meu caso não é ser boba, eu visualizo coisas positivas e crio estratégias para fazê-las acontecer.”
Antes mesmo de entrar na GE, Poliana Casal já tinha esse perfil. Depois de não passar no processo seletivo para ser trainee da empresa, criou um plano para tentar no ano seguinte. “Lembro de voltar para casa chorando porque fui para São Paulo fazer as provas e fiquei muito assustada com o pessoal, que já tinha nascido com uma presença executiva”, diz a mineira, que à época era tímida e calada – o que quem a conhece hoje custa a acreditar.
Depois de um ano de preparação, até mesmo com sessões com psicólogo, começou sua carreira na empresa. “Sou cria da GE”, diz a executiva, que depois também participou do programa de liderança sênior da companhia. Ela rodou diferentes cidades e países, mudando a cada três meses e vivendo nos EUA e na Alemanha nesse período. “Minhas roupas nunca ficavam passadas.”
Foi aí que teve seu primeiro contato com lideranças executivas e saiu da sua zona de conforto para viver o mundo corporativo. “Tive que correr atrás de assuntos e técnicas que não eram naturais no meu ambiente familiar”, lembra ela, que ficava repetindo dezenas de vezes uma apresentação para sair da forma mais natural possível quando fosse apresentar para os gestores. “Até que começa a ficar natural e você fica confortável nesse ambiente.”
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Contra a síndrome da impostora
Hoje, o corporativo é um espaço que a CFO quer continuar conquistando. Desde que entrou na GE, participa ativamente do grupo de mulheres da companhia, e agora é líder do comitê de diversidade da sua divisão de negócios para que funções como a dela estejam cada vez mais a cargo de mulheres.
E apesar de ter enfrentado dificuldades adicionais em um universo ainda muito masculino, teve grandes gestores homens e duas promoções que coincidiram com os dois períodos em que estava de licença-maternidade. “Sempre achei que foi sorte, mas depois de um processo de coaching percebi que foram as escolhas da minha vida que me trouxeram até aqui”, disse ela, que chegou a aceitar posições que ninguém queria para se destacar.
A síndrome da impostora acompanhou parte da sua jornada, e agora Poliana trabalha para que outras mulheres driblem o sentimento de fraude, se candidatem a vagas mesmo sem cumprir 100% dos requisitos e busquem posições de liderança nas empresas. “Faço mentorias e puxo as mulheres para elas irem com medo mesmo e conseguirmos subir juntas.”
Turning point da carreira
“Acho que foram dois, os programas de liderança que eu passei na GE e o processo de coaching há três anos que foi quando eu entendi que as coisas que aconteciam comigo não eram por acaso. Elas são fruto de todas as escolhas que eu fiz e de coisas que abri mão na minha vida para estar onde eu estou. Descobri isso realmente três anos atrás, antes eu não tinha dimensão do impacto das minhas escolhas.”
Quem me ajudou
“Eu tive vários gestores que me apoiaram, não foi uma pessoa só. A maioria deles foram homens e todos acreditaram no meu trabalho, nenhum me colocou para trás. Contei com boas pessoas durante esse caminho e principalmente as mulheres do grupo da GE que hoje eu lidero, mas já fui participante. Elas me apoiaram em vários momentos da minha vida, mas o aprendizado no início principalmente foi muito importante.”
O que ainda quero fazer
“Quero crescer mais, adoro o mundo corporativo. Quem sabe assumir uma posição maior, no exterior. E continuar inspirando as mulheres, ver a representatividade aumentar. Tenho duas filhas então quero ser exemplo para elas e quero a felicidade delas, é o que eu mais quero.”
Causas que abraço
“Diversidade. Sou bem positiva, gosto de justiça, pode até parecer coisa de miss, mas fico muito irritada com injustiças e eu vejo muito isso no mundo corporativo. E quero fazer essas mudanças, ainda mais agora que eu ocupo esse lugar e tenho voz.”
Minha formação
Administração na PUC-MG
Quinzenalmente a Forbes publica a coluna Minha Jornada retratando histórias de mulheres que trilharam vidas e carreiras de sucesso.