Unicórnio, no mundo das finanças, é toda empresa avaliada pelo mercado em pelo menos US$ 1 bilhão. Cerca de 28 companhias brasileiras já se tornaram unicórnios — 10 delas apenas em 2021. O número deve chegar a 100 nos próximos cinco anos, segundo a ABStartups (Associação Brasileira de Startups). Nessa corrida, quais serão as outras 72 empresas que alcançarão o posto de unicórnio? Ainda não há nenhuma do agro nesse clube dos bilionários, mas a Agrotools, plataforma digital de análise remota para empresas ligadas ao agronegócio, com sede em São Paulo, espera ser uma delas.
Chegar a esse posto é o que move o economista Sérgio Rocha, 62 anos, CEO e criador da empresa em 2007. Quando fundou a Agrotools, a ideia era levar informações organizadas ao agro, como um serviço que pudesse ser usado para análise de risco de financiamentos, seguros, transações de compra e venda, e que ajudassem na gestão dos negócios no campo e na agroindústria. Em 2021, a empresa dobrou seu crescimento e chegou à marca de R$ 130 milhões em receitas, o que na moeda norte-americana hoje (28) seria US$ 24,2 milhões.
Parece pouco para as pretensões de Rocha, mas a história de alguns unicórnios brasileiros mostra que não é impossível. A 99Taxi, aplicativo que surgiu da cabeça de um programador em 2012, conseguiu o título em 2018. Foi a primeira. Há outros casos de empresas que nasceram muito pequenas e deslancharam, como o delivery de comida iFood/Movile, também um unicórnio de 2018, ou o mais recente, a goiana FreteBras, em novembro do ano passado. A startup foi fundada em 2008, um ano depois da Agrotools.
LEIA TAMBÉM: 9 tecnologias revolucionárias que estabelecerão novos padrões em 2022
“Quando falamos de unicórnio, pensamos naquele bicho exótico e transformamos uma ideia impossível em possível”, diz Rocha. “Dentro dessa visão, eu diria que a gente já é um unicórnio no mundo brasileiro, porque tivemos que lidar com uma baderna de dados em um país que é quase um continente gigantesco para criar um novo linguajar capaz de monitorar o território.”
Ele conta que um dos maiores desafios no início da empresa foi construir do zero uma plataforma que agregasse todas as informações necessárias para que players do agro tomassem decisões com maior precisão e economia. Hoje, por exemplo, a plataforma é capaz de comparar dados da evolução da biomassa em uma área de cultivo e, consequentemente, seu potencial para plantio e riscos que podem surgir com períodos de seca ou alta incidência de chuva.
Para 2022, o primeiro ano dos cinco, em busca do posto de unicórnio, Rocha já traçou suas estratégias. Os desafios não são poucos e nem pequenos. Um deles é construir uma API (interface de programação de aplicações) por semana. Explicando de forma simples: API é um código que permite que dois programas de softwares se comuniquem entre si, ou seja, é o responsável pela integração de diferentes bases de dados do agro ao sistema da agtech.
Cada uma dessas interfaces facilita a comunicação, permitindo a interação de bases dispersas do agro no Brasil. Por exemplo, acrescentar ao seu sistema dados levantados por clientes ou bases de entidades como Embrapa, Banco Central e outros. Outro foco é o desenvolvimento de uma nova ferramenta de análise por mês, destinadas à tomada de decisão do produtor. Está na agenda, para integrar o marketplace da empresa, ferramentas como “verificação da cultura plantada” e “identificação da janela de plantio”.
Em busca de espaço para crescer
A Agrotools tem uma equipe de 300 pessoas, entre desenvolvedores de softwares, engenheiros agrônomos, gerentes de serviço ao consumidor, analistas de geo e outros, divididas entre a capital paulista e o núcleo tecnológico instalado no município de São José dos Campos (SP), apontada como a terceira melhor cidade em todo o mundo para receber investimento estrangeiro no setor de tecnologia aeroespacial.
“Estamos construindo uma experiência one-stop-shop de inteligência para empresas que se relacionam com o agro”, ressalta Rocha. Isso significa criar um local único para que empresários e produtores possam encontrar soluções, independentemente do tamanho do negócio. Uma análise socioambiental por meio da plataforma, com 20 cadastros geográficos e 20 análises, custa em torno de R$ 283 mensais, acessível a um pequeno produtor que precisa se adequar, por exemplo, a uma determinada norma ambiental. Rocha diz:
“Temos como objetivo democratizar o acesso à informação no setor e levar tecnologia para todo tamanho de empresa.”
O Brasil tem cerca de 5 milhões de propriedades rurais, das quais aproximadamente 2,5 milhões são classificadas como pequenas, de acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Outra estratégia de crescimento, além do orgânico, é a compra e aquisições de outras agtechs. O dinheiro investido virá da própria empresa, que afirma ter “capacidade financeira de crescimento ”.“O que faremos agora é olhar empresas para abrir nossas tecnologias proprietárias ou adquirir novas empresas. Já temos cartas de intenções assinadas e estamos de olho em algumas oportunidades”, revela Rocha.
“Até hoje, viemos crescendo organicamente, tivemos que criar tecnologias próprias com uma linguagem muito específica para o agro, mas agora vemos alguns negócios que fazem muito sentido para um crescimento por meio de aquisições, principalmente na área de dados. Existem muitas empresas que podem ser complementares ao nosso negócio.”
Hoje, a Agrotools conta com cerca de 200 clientes do agrobusiness, grandes multinacionais como Cargill, McDonald’s, Nestlé e BRF, e também instituições de crédito, como a Sicoob. A multinacional brasileira BRF, por exemplo, dona das marcas Sadia e Perdigão, em 2021 poupou R$ 9 milhões na cadeia de suprimentos ao utilizar uma solução de data science da aspirante a unicórnio.
“Todas as empresas estão falando muito de ter decisões baseadas em dados e a gente permite isso”, afirma Paula Valério, head de marketing da Agrotools. Como a agtech tem clientes que atuam em outros países, as soluções também vêm sendo utilizadas por eles lá fora. Com isso, a base de dados também inclui informações do agro nos Estados Unidos, Austrália, Paraguai e Argentina.
A estimativa é de que hoje a agtech monitore mais de R$ 100 bilhões em operações do setor do agro, dos quais R$ 15 bilhões em commodities. Na pecuária, 60% do abate bovino brasileiro é monitorado. “Nossa base já está feita para nos tornarmos um unicórnio dentro do conceito tradicional”, pontua Rocha. A base mencionada é composta por 1,3 mil camadas de dados que cobrem 200 milhões de hectares espalhados nos cinco países em que atua.