O Parlamento italiano também aprovou a proibição da muito discutida lei sobre a produção e comercialização de carne cultivada em 16 de Novembro, na sequência de um resultado semelhante da votação do Senado no início do verão deste ano na Europa, em julho. Embora o governo afirme que a medida se destina a defender a cultura e o património alimentar italiano, as organizações da sociedade civil acreditam que a proibição serve a um interesse político estratégico que o Irmãos da Itália, partido a qual pertence a primeira-ministra Giorgia Meloni, antes das eleições no verão de 2024.
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Durante o debate no Parlamento, em 16 de novembro, o Ministro da Agricultura, Francesco Lollobrigida – representante do partido da primeira-ministra – declarou o seu desejo de “uma Europa diferente”, instando outros países a alinharem-se com a Itália na proibição de qualquer forma de “alimento sintético”. Mas a ideia parece não estar pegando: em 17 de novembro, o governo alemão anunciou um fundo de US$ 41,4 milhões (R$ 201 milhões na cotação atual) para promover proteínas alternativas. Da mesma forma, o Ministro da Agricultura dinamarquês, Jacob Jensen, revelou à Forbes a sua intenção de rever os procedimentos atuais para novos alimentos, como a carne cultivada, em nível da UE.
O truque do TRIS
No início de outubro, a comunidade europeia de carne de laboratório celebrou a retirada oficial da Itália da sua notificação do TRIS (Technical Regulation Information System, ou Sistema de Informação de Regulamentação Técnica, na sigla em inglês) para o projeto de lei da União Europeia, um procedimento que visa prevenir barreiras no mercado interno do bloco.
Caso a carne cultivada fosse proibida na Itália, os produtores europeus que processam cultivados em laboratório enfrentariam uma distorção da livre circulação de mercadorias entre os países da UE, garantida pela legislação do bloco. O governo está ciente de que a lei proposta é atualmente ilegal do ponto de vista europeu. Quando questionado se isso assinalava a retirada da Itália, Lollobrigida respondeu que o Ministério pretendia submeter à Comissão um texto legislativo mais forte, garantindo que ela aprovaria um julgamento do bloco da UE.
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Os estados membros europeus não são obrigados a esperar pela aprovação da notificação TRIS para promulgar uma lei no seu país. Algumas organizações civis sugerem que a decisão de retirada foi tomada apenas para evitar o escrutínio da UE e para ganhar tempo para que o procedimento fosse aprovado por ambas as câmaras. Francesca Gallelli, Consultora de Assuntos Públicos da organização sem fins lucrativos que promove proteínas alternativas, Good Food Institute Europe, afirmou que o texto aprovado pelo Parlamento era idêntico ao anteriormente enviado por meio do procedimento TRIS.
O bloco da UE será, portanto, chamado a analisar o mesmo texto que já foi considerado fraco pelo Ministro. Francesca acrescentou que se a Comissão ou qualquer estado-membro tivessem levantado observações no âmbito do procedimento TRIS em outubro, o período para a não adoção da lei teria sido alargado até ao final de janeiro.
Movimento estratégico europeu
Chiara Caprio, da ONG italiana de bem-estar animal Esseri Animali, observou que a decisão de retirar a lei foi uma escolha política interna deliberada do partido Irmãos de Itália, destinada a promover o resultado deste governo antes das eleições europeias. Na UE, o partido posiciona-se dentro do eurocético Grupo Europeu de Conservadores e Reformistas, reticente em ceder partes de soberania à Comissão Europeia.
Ao garantir resultados positivos em ambas as câmaras, o governo italiano cria a ilusão de uma política correta, chamando a proibição de uma “vitória para Itália”. O governo já vê um conflito futuro com a UE numa narrativa demasiado conhecida de “Nós contra Eles”, anteriormente utilizada em campanhas eleitorais.
Mas a política proposta deve receber a aprovação do Presidente da República italiana, Sergio Mattarella, para ser eficaz. Os especialistas alertam que esta aprovação é incerta. O presidente Mattarella já expressou preocupação em relação à medida devido a fortes indícios de violação da lei do mercado único europeu, com possíveis processos de infração por parte da Comissão Europeia.
No início de outubro, a primeira-ministra Meloni também propôs uma reforma da Constituição italiana para reduzir o poder de decisão do Presidente da República. O partido pró-europeu italiano +Europa lançou no dia 17 de novembro uma recolha de assinaturas, para pedir ao presidente da república que não assinasse o texto da lei. Neste cenário, a lei será devolvida ao Parlamento, que necessitará de adoptar alterações significativas antes de a submeter novamente. Caprio mencionou que se a lei for aprovada, as ONG ambientais poderão iniciar um litígio estratégico contra o projeto de lei do governo para suspender a lei.
*Daniela De Lorenzo é colaboradora da Forbes EUA. Baseada em Oslo, escreve sobre sistema de produção de alimentos, meio ambiente e energia. (tradução: ForbesAgro)