A produtora rural Simone Silotti, 57 anos, quase chora – mas se segura –, ao descrever uma época de sua infância, lá pelos 6 anos de idade, na qual recolhia alimentos nas feiras livres e levava para casa. O que estivesse à mão (tomate, repolho, batata), se transformava em refeições para a família. No início desta semana, em 2 de fevereiro, Simone era uma dos formandos do curso de tecnólogo em agronegócio da Fatec (Faculdade de Tecnologia do Estado de São Paulo). No final de 2023, ela já havia recebido um outro título, desta vez de MBA em gestão de projetos na Esalq/USP (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz), em Piracicaba (SP).
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Produtora de hortaliças em estufas de hidroponia no distrito rural de Quatinga, em Mogi das Cruzes, a 60 km de São Paulo, no chamado Cinturão Verde da capital, hoje Simone continua recolhendo alimentos que seriam desperdiçados. Mas agora eles são a razão de existir do Faça Um Bem Incrível, ONG que ela criou durante a pandemia de Covid-19, em 2020, para conectar produtores rurais e suas produções que seriam desperdiçadas, com empresas que os compram e que na sequência os destina às instituições sociais. Em 2021, a Forbes a colocou na lista das 100 Mulheres Poderosas do Agro e no ano passado a convidou para integrar o ForbesMulher Agro, um grupo de cerca de 40 executivas e empreendedoras que exercem cargos de liderança. “Me abriu muitas portas estar com as mulheres do FMA e do poder que o grupo representa”, diz ela.
Simone voltou para o campo aos 49 anos, depois de uma bem sucedida carreira de 17 anos como pesquisadora, atendendo clientes do porte de AlmapBBDO, Gol, Comgás e Sabesp. “Não quero olhar para trás. Sim, sou filha do êxodo rural, de um pai pedreiro que se tornou agricultor e depois perdeu tudo por causa de atravessadores”, diz ela. “Essa é a minha história, mas pode não ser a de muitos produtores hoje.”
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O projeto já tirou do campo cerca de 420 de toneladas de cerca de 200 produtores mapeados em sua região. Nas hortaliças, as perdas podem ser de 40% a 50% da produção, por falta de padrão de tamanho do pacote de verduras, quedas de energia e excedentes. “A janela de colheita de uma hortaliça, a depender da luminosidade, varia de 3 a 5 dias. Esse tempo pode ser fatal para perder o padrão que os supermercados exigem”, diz ela. “Há bolhas invisíveis que precisam ser furadas.”
Tornar-se uma especialista em gestão é uma das maneiras que ela encontrou para ajudar na profissionalização dos produtores que gravitam ao redor do “Faça um Bem Incrível”. Além disso, fazer do projeto que está ligado diretamente à produção no campo um agente de política pública. Cada tonelada de alimento que seria desperdiçada vale, para as empresas, uma cota no valor de R$ 8,5 mil.
Simone quer fazer do projeto uma ação de política pública no campo e não perde oportunidades de mostrar o valor do alimento que vira ativo social, em vez de ser descartado pelo produtor. Ela estará em São José, na Costa Rica, a convite do IICA (Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura), para o primeiro Encontro de Líderes da Ruralidade das Américas, onde o tema central será “Fortalecendo ruralidade por meio da produção sustentável, resiliente e inclusiva”, entre os dias 15 e 21 de abril. “Prometo não chorar”, diz ela, que já preparou um extenso diagnóstico e o espera do futuro para o seu “Faça um Bem Incrível”. Simone sabe que não está sozinha nesta caminhada. Ela faz parte de uma rede de mulheres que hoje estão à frente de grandes projetos neste sentido. Algumas delas e seus trabalhos podem ser conferidos na galeria abaixo:
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Divulgação Alcione Pereira, da Connecting Food
A engenheira de alimentos, Alcione Pereira, é CEO da Connecting Food, criada em 2017. É a primeira foodtech do país especializada em conectar os alimentos que seriam descartados por empresas e que podem ser consumidos de forma segura.
Desde que foi criada, a foodtech já intermediou 16,6 mil toneladas de alimentos, em 286 municípios de 27 estados brasileiros. Foram atendidas 576 OCSs (Organização de Controle Social), entre elas associações e grupos. Em 2021, a Connecting Food foi uma das articuladoras do Movimento Todos à Mesa, que reúne empresas e organizações envolvidas também na redistribuição de alimentos e no ambiente regulatório para esse fim.
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Divulgaçao Geyze Diniz, do Pacto Contra a Fome
O projeto Pacto Contra a Fome, movimento que tem como norte acabar com a fome e reduzir o desperdício de alimentos, nasceu em 2022. As metas são ambiciosas, com uma agenda de trabalho baseada em governança e transparência. Geyze Diniz, presidente do conselho da entidade, é co-fundadora do Pacto Contra a Fome.
Economista, ela tem uma larga experiência em planejamento estratégico. Não por acaso, integra diversos outros conselhos, entre eles o do MASP (Museu de Arte de São Paulo). No Pacto Contra a Fome, o trabalho está alicerçado em inteligência, articulação e incentivos, o que significa apoio a políticas públicas para que sejam de fato implementadas de atuar na sociedade civil criando mecanismos de reconhecimento e práticas que mudem a realidade da fome e da insegurança alimentar.
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Divulgação Luciana Chinaglia Quintão, do Banco de Alimentos
A economista Luciana Chinaglia Quintão é fundadora e presidente executiva da ONG Banco de Alimentos, uma associação civil criada em 1998. A instituição tem seu trabalho baseado no que ela chama de colheita de alimentos (recolhe onde sobra e redistribui), em educação nutricional e conscientização. A redistribuição de alimentos beneficia diariamente cerca de 25 mil pessoas.
Luciana também está à frente do Projeto Inteligência Social, que nasceu a partir das ideias defendidas em seu livro com o mesmo título, “Inteligência Social – a perspectiva de um mundo sem fome(s)”, que tem como sua principal vertente a “responsabilidade de cada ser humano na construção do mundo à sua volta”.
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Divulgação Mónica Guerra Rocha, do Instituto Comida do Amanhã
Da arquitetura à sociologia, um doutorado em andamento, a co-fundadora do Instituto Comida do Amanhã, Mónica Guerra Rocha, se tornou uma voz. Fundado em 2017, o instituto é um think tank que apoia a transição para sistemas alimentares sustentáveis, biodiversos e integrados.
Um exemplo é o estudo “Cidades e Alimentação”, executado em parceria com a Embrapa Alimentos e Territórios, unidade localizada em Alagoas, por meio do programa Diálogos União Europeia-Brasil. Mónica também é conselheira do 50by40, um movimento global que visa reduzir os impactos da pecuária em 50% até 2040 por meio de manejos mais sustentáveis.
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Divulgaçao Vivian Lara Silva, da Rede All4Food
Vivian Lara da Silva é professora da USP (Universidade de São Paulo, desde 2005, na Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos, campus de Pirassununga (SP). Desde 2020, ela também coordena a Rede All4Food, criada para conectar pessoas, startups, indústrias e universidades. O objetivo é fortalecer o ecossistema de inovação na área de alimentos e bebidas.
Vivian foi uma das idealizadoras da rede, que hoje tem o apoio da Embrapa e de empresas como Nestlé, Cargill, Danone, Givaudan, M. Dias Branco e Mondelez, além de conectar pesquisas de várias outras universidades do Brasil e de outros seis países, como Argentina, França, Itália, República Tcheca, China e Suécia.
Alcione Pereira, da Connecting Food
A engenheira de alimentos, Alcione Pereira, é CEO da Connecting Food, criada em 2017. É a primeira foodtech do país especializada em conectar os alimentos que seriam descartados por empresas e que podem ser consumidos de forma segura.
Desde que foi criada, a foodtech já intermediou 16,6 mil toneladas de alimentos, em 286 municípios de 27 estados brasileiros. Foram atendidas 576 OCSs (Organização de Controle Social), entre elas associações e grupos. Em 2021, a Connecting Food foi uma das articuladoras do Movimento Todos à Mesa, que reúne empresas e organizações envolvidas também na redistribuição de alimentos e no ambiente regulatório para esse fim.