Se Amancio Ortega, a sexta pessoa mais rica do mundo, revelasse a fórmula exata do sucesso da Zara (a principal marca do seu grupo Inditex), com certeza a velocidade de entrega dos produtos que os consumidores mais desejam estaria no topo. A Zara, afinal, criou um sistema que é capaz de mapear o que os clientes querem, produzir coleções em menos de 15 dias e trazer, todas as semanas, novidades para as araras que logo desaparecem, graças aos estoques enxutos e planejados. A espanhola entendeu antes de muitos (no começo, sem mapear dados) que é o consumidor quem dita as regras, percepção fundamental para garantir a saúde financeira de uma confecção.
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Ter o consumidor como agente ativo no processo de criação de coleções de moda não é mais algo exclusivo da Zara – e muito menos um segredo. Cada vez mais, as marcas estão utilizando a coleta de dados e se apoiando em ferramentas a fim de se tornarem mais certeiras na hora de criar uma coleção. Para onde elas estão olhando? Para onde se encontram seus usuários: nas redes sociais. Segundo o relatório Measuring the Fashion World, publicado em outubro de 2018 pela McKinsey, dominar os processos digitais e dados analíticos é uma entre as três principais prioridades dos mais relevantes players da indústria. O documento foi elaborado considerando a entrevista com 54 executivos à frente de empresas (46% delas com receita anual acima de US$ 500 milhões).
O movimento é, de fato, global. E, enquanto alguns estão correndo, algumas marcas já nasceram com esse mindset. É o caso da brasileira Amaro, fundada em 2012 pela dupla de suíços Dominique Oliver (CEO) e Ludovico Brioschi, ambos economistas de formação e ex-funcionários de bancos privados de investimento. A marca nasceu como um e-commerce no modelo direct to consumer, o que significa a ausência de intermediários entre a marca e o cliente final. “Nós coletamos dados muito estruturados: navegação, onde as pessoas passam mais tempo, até dados de produtos, quais são as cores mais compradas, as modelagens… Com o tempo, passamos a utilizá-los de maneira mais eficiente e descobrimos novas maneiras de aplicá-los. Temos um modelo muito bacana, onde o cliente está no centro. Não temos um diretor criativo, com uma visão de mercado e de tendência que lança algo e depois o marketing faz a sua parte. Nós temos os clientes: eles sabem o que querem. Baseados nos dados, lançamos peças em quantidades pequenas. Conforme o sucesso, adaptamos tanto o produto como a quantidade”, revela Dominique.

Escritório da Amaro em São Paulo
Ou seja, na Amaro, são as clientes que mandam na próxima coleção que chegará ao site e aos guide shops (os pontos físicos e sem estoque), inaugurados a partir de 2017 e totalmente integrados ao ambiente online, para suprir a demanda que não passa por e-commerces (no Brasil, 5% são adeptos). A rapidez no processo impressiona: todas as semanas os ambientes são abastecidos com novas peças. A gestação de um novo produto leva apenas três semanas, processo que pode ser encurtado com o uso do projeto Trend Catcher. “Por meio das mídias sociais, principalmente pela função stories do Instagram, perguntamos de forma assertiva o que elas preferem, exemplificando com produtos. Isso é um processo transparente onde as consumidoras estão na posição de decisão”, explica Dominique.

Dominique Oliver, CEO da Amaro
Falando em Instagram, é inegável o papel de protagonista que a rede social teve – e permanece tendo – não só na maneira como as pessoas consomem moda, mas, também, como são criadas e compartilhadas as tendências, que balizam a criação de conteúdo. Eva Chen, diretora de parcerias de moda do Instagram, comenta: “O Instagram tornou possível que todos tenham um lugar na primeira fila, pois dá acesso e permite que você veja como os estilistas trabalham. O app eliminou barreiras. Antes existia aquela mentalidade ‘you can’t sit with us’ [você não pode sentar com a gente] na moda. Agora ele abriu as portas para uma nova geração de fãs. Colaborou no lançamento de marcas como Reformation, Everlane e Warby Parker. A indústria realmente estava precisando de mais acesso. Quando as marcas mostram os processos, a resposta é muito positiva.”
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Os dados do app comprovam seu poder: mais de 1 bilhão de usuários registrados na plataforma e 500 milhões de usuários que produzem stories todos os dias. Só de perfis de negócios são 25 milhões, e 80% do número total de usuários segue pelo menos um perfil da categoria. Todos os perfis business têm acesso às métricas que analisam engajamento, audiência e desempenho das publicações. Dessa forma, conseguem pensar em novas estratégias para atingir objetivos.
Em março, mais um recurso foi implantado: o Check-out, por ora disponível só para o mercado norte-americano. “Agora é possível comprar sem sair do aplicativo. Queremos melhorar a experiência de compra. Junto, lançamos o recurso Comprar dos Criadores, pelo qual é possível comprar os looks de influenciadores digitais sem deixar a plataforma. Basta tocar na publicação e comprar as peças por ali mesmo. Para o cliente, uma forma de facilitar a compra; para as marcas, uma nova maneira de encontrar o público-alvo, que busca inspiração nos influencers”, conclui Eva. A cartela de 25 marcas que no momento utiliza a função é para todos os gostos e bolsos: Adidas, Burberry, Dior, H&M, Uniqlo e Zara estão entre elas.

Eva Chen, diretora de parcerias de moda do instagram
Ao mesmo tempo que os conteúdos são produzidos na velocidade da luz pelo Instagram, ferramentas especializadas estão mapeando e fornecendo seus conteú – dos para as marcas. É o caso da Heuritech, uma versão do século XXI dos cool hunters (caçadores de tendências). A ferramenta analisa, por meio de inteligência ar – tificial, mais de 1 bilhão de imagens por dia e identifica quais são os próximos produtos que devem estourar. O CEO Tony Pinville conseguiu, após cinco anos estruturando o negócio, parcerias com a Microsoft AI Factory, La Maison des Startups (LVMH) e Serena Software.
Quando questionados sobre o futuro da moda, coincidentemente, Eva e Dominique bateram nas mesmas teclas: inclusão e pluralidade. “Queremos ser uma marca que ouve as clientes, que as representa e de uma maneira muito parceira. Sentimos muito isso nas redes sociais e queremos ser uma voz ativa, sem medo de nos posicionarmos”, comenta Dominique. Da sede do Instagram, em Nova York, Eva confirma: “O Instagram é uma comunidade global e diversa onde as pessoas podem encontrar sua própria versão de beleza e estilo. Isso vem mudando a forma e as expectativas sobre o que as pessoas querem ver nas indústrias de moda e beleza, cada vez mais diversificadas e acessíveis. Considero isso um grande passo em direção ao futuro.”
Reportagem publicada na edição 68, lançada em junho de 2019
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