Resumo:
- O novo chef de cave da Dom Pérignon, Vincent Chaperon se deparou com algumas surpresas quanto às uvas para produção dos champanhes deste ano;
- O enólogo fala sobre as mudanças climáticas, como elas têm afetado o processo de produção e quais as medidas que a marca tomará para se adaptar, manter sua essência e se modernizar;
- Ele ainda recomenda três garrafas icônicas da bebida; veja quais.
Dom Pierre Pérignon tinha a intenção de fazer o melhor vinho do mundo, mas é difícil acreditar que o monge beneditino tenha conseguido prever o sucesso do seu champanhe homônimo. Produzido pela Moët & Chandon e de propriedade da LVMH -que possui um portfólio robusto de vinhos e destilados, com marcas de prestígio, como Château d’Yquem, Hennessy e Belvedere-, Dom Pérignon é um dos champanhes mais renomados do mundo e se tornou sinônimo de luxo e da mais alta qualidade.
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Criando apenas champanhes antigos feitos com uvas de um único ano, o foco da Dom Pérignon é fazer um espumante que destaque as características únicas de uma estação escolhida. Cada garrafa é envelhecida por um período mínimo de sete anos, enquanto uma safra realmente excepcional recebe um segundo lançamento e se torna parte da série Plénitude 2, também conhecida como P2, e é envelhecida por cerca de 16 anos ou mais.
Por 28 anos, Richard Geoffroy atuou como chef de cave da Dom Pérignon, criando a efervescência da elogiada marca, para que todos pudessem desfrutá-la. Entretanto, no início deste ano, Geoffroy foi sucedido por Vincent Chaperon, com quem ele havia trabalhado lado a lado, nos 13 anos que antecederam sua aposentadoria. À medida que Chaperon toma as rédeas e completa sua primeira colheita como chef de cave, houve algumas surpresas quanto às uvas deste ano. Abaixo, o enólogo fala sobre as mudanças climáticas, como elas têm afetado o processo de produção e as três garrafas de Dom Pérignon que você deve comprar.
Forbes: Agora que você é o chef de cave, existe algo em que realmente deseja se concentrar?
Vincent Chaperon: Essa é uma pergunta muito difícil de responder. Há muitas coisas. Por um lado, eu diria a continuidade porque a Dom Pérignon existe faz muito tempo. Temos de entender isso, respeitá-la e supervisioná-la, de certa forma. Mas, por outro lado, é preciso testar o novo e superar os limites, pois a Dom Pérignon tem de ser moderna e mostrar qual será o futuro do champanhe. Portanto, temos de continuar nos dedicando e inovando.
Sob outra perspectiva, existem alguns desafios com relação ao futuro, e um deles é referente à natureza e ao meio ambiente. Nós vivemos em um mundo onde estamos, mais do que nunca, entendendo que temos recursos limitados e que nossas ações têm repercussões. Como pessoas que trabalham na natureza, sentimos que temos uma responsabilidade talvez ainda mais profunda do que a dos outros. Portanto, um dos desafios é mudar a maneira como cultivamos a videira, ser mais respeitosos com o ecossistema e com o ambiente natural que é tão generoso conosco. Simultaneamente, tentamos nos adaptar porque o clima está em mudança. Desse modo, precisamos encontrar uma maneira de fazer isso e continuar expressando o que somos.
Além disso, acredito que há outro desafio relacionado à tecnologia. Estamos em um momento de avanço tecnológico, especialmente no mundo dos dados. Portanto, precisamos usá-lo como recurso para ir além, mas sem renunciar ao que somos, que é o que eu gosto de definir por empirismo. Essa é a forma pela qual tomávamos decisões no passado, que é muito humana, pois envolve o toque do polegar e o nariz. Nós ainda faremos escolhas por meio de nossos sentidos, mas usaremos cada vez mais novas tecnologias como uma ferramenta para nossas decisões, e não uma substituição.
Outra coisa realmente importante é continuar a revolucionar a experiência. Acho que hoje os indivíduos perdem grande parte de nossa essência quando bebem Dom Pérignon porque que não sabem como criar, de fato, o melhor contexto para descobrir a complexidade do nosso champanhe. Existem muitas oportunidades de correr riscos e explorar uma nova maneira de experimentá-lo, por exemplo, a partir de novos copos, temperaturas, alimentos, ingredientes,companhias e lugares. Diferentes contextos mudam a experiência e por isso, meu conselho para o futuro é correr o risco, experimentar.
F: Retomando a mudança climática, pois é um assunto muito quente, há duas questões. Você mencionou que tem consciência da necessidade de fazer determinadas alterações para potencialmente compensar quaisquer efeitos colaterais das mudanças climáticas. Que mudanças planeja fazer para manter a qualidade das uvas?
VC: Estamos mudando a maneira como cultivamos a vinha e o período de colheita. Para a colheita, temos um novo parâmetro a fim de entender melhor a qualidade das uvas. De modo simples, quando se tem um ano muito quente, é necessário antecipar a colheita de certas uvas, a fim de manter, no champanhe final, um certo equilíbrio necessário entre frescura e maturidade para não deixá-lo muito maduro ou pesado. Tudo se trata de entender o que está ocorrendo, por isso, conseguiremos nos adaptar se pudermos compreender melhor.
F: Estreitando um pouco o escopo, especificamente com relação a 2019 e as uvas que acabaram de ser colhidas. Este ano foi particularmente difícil em Champagne, porque houve muita chuva e, além disso, surgiram ondas de calor abrasadoras em julho e agosto. Como isso afetou as uvas, até então?
VC: Ficamos muito surpresos quando voltamos das férias e começamos a medir a maturidade das uvas. A velocidade de acumulação de açúcar nas frutas este ano se foi o dobro do normal, o que foi completamente inesperado. Por não anteciparmos isso, tivemos de ser flexíveis e agir. Também observamos que havia um equilíbrio diferente entre as facetas de maturidade nas uvas, que não se define somente pelo açúcar ou acidez, mas também pela cor e pelo aroma. O clima, por sua vez, é um fator de inflûencia sobre a disparidade do ritmo de maturação desses diferentes aspectos. Neste ano, notamos ainda que as cores e aromas estavam muito menos avançados do que em um período anual regular em Champanhe. Logo, tivemos de fazer uma seleção quando as uvas apresentaram um nível mais alto de açúcar do que o habitual, pois foi necessário esperar que a cor e os aromas atingissem uma certa maturação. Não podíamos mais apenas seguir o açúcar uma vez que ele não fornecia as mesmas informações que normalmente recebemos. O equilíbrio de elementos nas uvas, portanto, está realmente mudando com o clima.
F: Desse modo, considerando que essa maturação foi inesperada e que as uvas são diferentes dos anos anteriores, embora eu saiba que ainda é muito cedo, o que isso significa para o próximo Dom Pérignon?
VC: Atualmente, só conheço e entendo uma pequena parte da história, pois ela ainda precisa ser escrita. Em vista disso, ainda há uma grande parte de mistério e descoberta que virá nos meses seguintes. Todo dia é um novo dia e todos exigem decisões muito importantes. Vamos aprimorar nossa compreensão constantemente ao pressionarmos e fermentarmos o mosto. Hoje, vou lhe dizer que o que temos parece muito bom e tanto nossa paleta quanto nosso olfato nos dizem que existem elementos de complexidade e riqueza que nos fazem antecipar um potencial. Mas é tudo o que posso lhe dizer, porque ainda temos de fazê-lo.
F: Ao ver um consumidor beber Dom Pérignon, o que gostaria que ele fizesse de forma diferente? Você quer ver um balde de gelo ou um determinado copo? O que deseja que eles façam para obter a experiência completa?
VC: Quero que as pessoas entendam que não há regras. Se algumas foram criadas no passado, temos de quebrar os paradigmas, em nome de Dom Pérignon. Eu não diria isso para todos os champanhes, mas quando se trata deste, que é um dos melhores, sim. Ele tem tudo: complexidade, intensidade, versatilidade, harmonia e equilíbrio. Todas essas características realmente oferecem a você, ao consumidor, a oportunidade de quebrar as regras. Sabemos que quando violamos as regras, seja com relação ao champanhe ou à vida, não podemos ir longe demais, pois extremos não são bons. Portanto, as pessoas só precisam pensar o básico sobre champanhe. Sabemos que a taça e a temperatura são importantes, que a comida pode combinar com o vinho e que onde e com quem estamos impactam a experiência. Desse modo, existem cinco parâmetros a explorar: vidro, temperatura, comida, local e pessoas.
F: Se você comprasse apenas três garrafas de Dom Pérignon, quais safras compraria?
VC: Essa é uma pergunta realmente difícil. Cada safra incorpora uma faceta de Dom Pérignon, portanto, no final, os champanhes são a soma delas. De um modo geral, eu recomendaria a safra com a qual você está emocionalmente conectado. Logo, se eu tivesse de escolher três, 1976 seria um. Foi um período da seca na França. Embora o champanhe seja super concentrado, ele é do meu ano de nascimento, então, é uma safra que realmente tenho no coração. Eu também escolheria o 2005 porque foi a primeira colheita que fiz com Richard Geoffroy e sempre lembrarei disso. Diria até especificamente o rosé de 2005, porque, quando comecei na Dom Pérignon, me especializei em vinhos tintos. E, por fim, o 2008.
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