“Ao pesquisar ‘nômade digital’ no Google, sempre aparece alguém com um notebook na beira da praia. Isso faz com que as pessoas pensem que fulano largou tudo para viajar o mundo, o que não é verdade. Existe um planejamento no meio dessa história”, explica Matheus de Souza, autor do livro “Nômade Digital”, finalista do Prêmio Jabuti 2020 na categoria economia criativa. Desde 2017 vivendo a experiência de não ter uma casa fixa, Souza observa o aumento de interesse pelo tema, principalmente por conta do isolamento social durante a pandemia de Covid-19.
“Em 2015, eu tive o primeiro estalo sobre o assunto. Sempre atuei na área de marketing e sabia que meu trabalho podia ser feito de qualquer lugar. Por que não de forma remota?”, questionou aos seus chefes da época, que não aprovaram a ideia. “Fiquei um ano me programando: oferecendo trabalhos como freelancer como redator e fazendo uma reserva financeira. Quando me demiti, estava prestes a ter um burnout. Tinha apenas 28 anos e minha pressão subia”, relembra o autor.
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Seu primeiro destino foi o México, onde, finalmente, encontrou o equilíbrio que procurava entre a vida pessoal e profissional. “Trabalho entre cinco e seis horas por dia, crio minha agenda”. Para o nômade digital, uma boa internet e um custo de vida atrativo já é o bastante para que um país se torne opção de moradia por alguns meses. “Somos, simplesmente, sujeitos em constante movimento trabalhando de forma remota”, define.
Para Sophia Costa, nômade digital assumida desde 2020, o estilo de vida é ideal para suas vontades do momento. “Eu sempre falo que, para mim, nada é definitivo. Acho que as pessoas têm um pouco de medo de tomar uma decisão dessas porque pensam que será para sempre e, na verdade, é pelo tempo que faz sentido”, explica. O estilo de vida se tornou parte de sua realidade de forma natural, quando começou a viajar e descobriu que explorar novas culturas era sua maior motivação. “Minha vida era trabalhar, juntar dinheiro e viajar. Foi assim por alguns anos, até eu decidir ir para Moçambique fazer um trabalho voluntário de três meses.”
A experiência mostrou que era possível trabalhar em qualquer lugar do mundo. “Eu nunca tinha atuado de forma 100% remota e muito menos com fuso horário. Quando cheguei lá, descobri que funcionava super bem”. Quando voltou ao Brasil, teve mais uma oportunidade longe de casa: passou em um mestrado de direitos humanos em Buenos Aires, na Argentina. “Quando meu período de estudos acabou, me desfiz do meu apartamento, terminei meu namoro e viajei para a Tailândia, onde estou há exatamente um ano”, conta Sophia entusiasmada.
“Eu trabalho para uma agência e tenho um horário limite para entregar as demandas do dia. Tenho a liberdade de me organizar da forma que eu quiser”, ressalta. “Nunca fez sentido para mim ficar 8h dentro de um escritório. Se eu consigo fazer minhas atividades em 3h, por que preciso ficar presa por tanto tempo?”
Lucas Morello, criador da consultoria de marketing Bota na Rua, é dono do seu próprio negócio e produz conteúdos digitais. Para ele, a flexibilidade de criar seu próprio horário de trabalho enquanto explora novas culturas é de tirar o fôlego. “Meu vício por viajar começou na primeira viagem internacional que fiz, para a Bolívia. Lá eu me encontrei como um pequeno desbravador que está disposto a conhecer a cultura do outro e acabar com meu preconceito sobre as diversas formas de viver nesse mundo”, destaca.
As escolhas de um nômade
Por incrível que pareça, a vida de um nômade digital também é acompanhada de incertezas e inseguranças. Para Sophia, uma das maiores dificuldades é conciliar sua rotina com a de amigos que ela encontra na estrada que, normalmente, não possuem horários flexíveis. “Exige pulso firme, porque não existe ninguém me cobrando e eu preciso ser muito fiel à minha agenda.”
Por outro lado, há um aspecto – completamente incontrolável – que preocupa todo nômade digital em suas estadias: o câmbio. Esse é o fator que determina o destino dos viajantes, especialmente quando o salário é pago em real, como é o caso de Souza, Morello e Sophia. Esse fator é ainda mais decisivo para ela, que precisa de bastante tempo de estadia para conseguir conhecer o local. “Eu faço trabalho de freelancer, tenho uma marca, um livro e meus produtos digitais. Se eu ficar pouco tempo nos lugares, não vai dar tempo de fazer nada”, explica.
Outro ponto essencial na hora de decidir o próximo destino é o acesso à internet. O trabalho à distância exige conectividade de qualidade 24 horas por dia. Sophia, por exemplo, tem o desejo de conhecer as Filipinas, mas, por conta da qualidade da web – que não é muito boa – teve de riscar o país da sua lista por enquanto.
Embora o termo nômade digital tenha se popularizado, ter referências e informações sobre o assunto é essencial para que outras pessoas sejam encorajadas a investir nesse estilo de vida. “Sempre gostei de compartilhar as minhas vivências. A gente precisa se enxergar nos lugares para acreditar que podemos ocupá-los”, destaca Souza.
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Para aqueles que ainda têm dúvidas, Sophia fala sobre a importância do autoconhecimento nesse processo: entender como seu corpo e sua mente lidam com uma rotina flexível em constante mudança. “Uma dica é alugar uma casa de praia por um mês e trabalhar de lá para ver como funciona, se consegue driblar as distrações.”
Já para aqueles que têm certeza que vão se adaptar ao estilo de vida, Souza, Morello e Sophia revelam seus destinos preferidos. Veja, na galeria abaixo, os 10 melhores lugares para nômades digitais brasileiros ao redor do mundo:
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Getty Images Koh Phangan, Tailândia
Amada pelos viajantes, a Tailândia aparece na lista de destinos preferidos por causa de sua qualidade de vida invejável. Além do contato constante com a natureza, o custo de vida é extremamente baixo e a internet funciona incrivelmente bem. “Eu já trabalhei no meio do mar e tinha sinal de internet”, revela Sophia entre risadas. “É um dos maiores polos de nômades digitais do mundo e tem uma estrutura absurda para nos receber.”
Tanto Sophia quanto Souza ficaram presos na Tailândia no começo da pandemia por conta do fechamento das fronteiras. “Fiquei na melhor situação possível. Eles controlaram a doença e eu fiquei seis meses em uma ilha paradisíaca por um preço incrível”, diz Souza, que teve tempo de sobra para aproveitar as belezas naturais. Sophia, que passou o ano inteiro no país, revela ser quase impossível enjoar. “Já entendi que um mês é muito pouco para explorar e entender a Tailândia.”
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Getty Images/Christopher Loh Cidade do Cabo, África do Sul
Três dias após sua aterrissagem na Cidade do Cabo, na África do Sul, Matheus de Souza já se dizia apaixonado pela cidade. “Já é um dos meus lugares favoritos do mundo”, diz com humor. “Devo morar aqui pelos próximos três meses”. Para ele, as primeiras impressões revelaram uma cidade cosmopolita, cheia de cafés hipsters, opções de lazer e contato com a natureza. “Tudo é incrivelmente organizado e limpo. A mobilidade também chama a atenção: ciclovias, transporte público de qualidade e carros de aplicativo mais baratos que no Brasil.”
Como se não fosse o bastante, a moeda local também é atrativa para viajantes brasileiros, que vivenciam praticamente o mesmo custo de vida do Brasil. Sophia, que também morou um tempo na África do Sul, concorda com as qualidades do país. “Tem um lugar muito especial no meu coração. Talvez seja o meu lugar no mundo”, destaca.
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Getty Images/Alexander Spatari Lisboa, Portugal
Mesmo com o valor do euro elevado, Souza diz ser impossível não citar Lisboa, em Portugal, como um dos melhores lugares para trabalhar e conhecer. “A gastronomia é maravilhosa, há uma forte cultura de cafés e muitas opções de lazer”. No mais, para aqueles que gostam de conhecer o máximo possível do país visitado, a localização da capital permite locomoção com facilidade para regiões litorâneas como Algarve e Ericeira.
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Getty Images/Tim Snell Buenos Aires, Argentina
Buenos Aires foi lar de Sophia durante cerca de um ano quando ela foi aprovada em um mestrado de direitos humanos no local. Para ela, a capital argentina lembra São Paulo, mas sem os pontos negativos. A praticidade e a segurança foram questões que influenciaram positivamente a estadia. “Tudo funcionava 24 horas por dia. Também tinha transporte público de qualidade, muitas opções de lazer ao ar livre, cafés, lugares para trabalhar e baixa taxa de violência. Eu amei morar em Buenos Aires.”
Além das facilidades que a cidade oferece, morar em Buenos Aires hoje é uma boa opção para quem está preocupado com os gastos. Em comparação ao real, o peso argentino torna o custo de vida na região muito mais baixo, principalmente no quesito moradia.
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Getty Images/Jeremy Woodhouse Brasov, Romênia
A Romênia é um dos melhores países para quem quer ser um nômade digital. Um dos fatores que torna essa experiência tão positiva é justamente a qualidade da internet. A cidade de Brasov, localizada na Transilvânia, é considerada um polo tecnológico em ascensão, o que torna a internet local muito boa e estável.
Lucas Morello diz que mesmo com uma quantidade significativa de turistas e estrangeiros, a cidade não perde o charme. “Existe uma pista de esqui acessível e bem barata. Para quem gosta de sentir o ar puro da floresta, existem vários castelos lindos para visitar com trilhas longas e bem marcadas.”
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Getty Images/traveler1116 Belgrado, Sérvia
Fugindo do comum, Souza também destaca a antiga capital da Iugoslávia como um grande destino para nômades digitais. “Belgrado, na Sérvia, tem um baixo custo de vida, diferente de outros destinos europeus”. A cidade também oferece uma grande variedade de cafés e parques. Como se não bastasse o preço atrativo nas compras locais, os voos para países próximos, como Croácia e Montenegro, são rápidos e baratos, o que facilita a visita durante os períodos de folga ou finais de semana.
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Getty Images/Smartshots International Medellín, Colômbia
Além de ser uma das maiores cidades colombianas, é um local extremamente bonito, que chama atenção pelo potencial de gerar cliques chamativos para as redes sociais. Para Sophia, um dos pontos fortes do local é a cultura. “É um país maravilhoso. Me apaixonei por Medellín, que também está se consagrando como um polo de nômades digitais. É uma cidade muito instagramável, onde tudo fica aberto até mais tarde e o transporte público é de alta qualidade.”
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Getty Images/christophefaugere São Petersburgo, Rússia
São Petersburgo é uma das maiores cidades da Rússia e, além de oferecer uma cena cultural e artística intensa, é uma ótima opção para os nômades digitais devido à qualidade da internet. Uma das características que chamou a atenção de Morello foi a quantidade de cafés espalhados pela cidade e a possibilidade de trabalhar tranquilamente estando em qualquer um deles.
“Um dos meus hobbies era trabalhar em todos os cafés que me recomendavam. Os russos podem parecer frios para nós brasileiros, mas pode ter certeza que essa impressão vai ser passageira se você engatar uma conversa com algum deles”, afirma Morello.
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Getty Images/venuestock Lviv, Ucrânia
Localizada perto da fronteira com a Polônia, Lviv é uma cidade com um cenário artístico muito intenso, diversas opções de lazer e muito bem equipada para as pessoas que atuam em trabalho remoto. “A boa notícia é que várias pessoas que vivem lá trabalham nos cafés também, o que facilita criar conexões locais boas”, explica Morello. A Ucrânia é um destino acessível para estrangeiros e oferece um custo de vida que não é muito elevado.
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Getty Images/fitopardo Cidade do México, México
Primeiro destino de Souza como nômade digital, a capital do México foi escolhida por dois motivos: câmbio acessível e clima tropical. “Meu orçamento era mais limitado, por isso fiz essa escolha. Mas, devo dizer que realmente me surpreendi”. Mais do que o tempo ensolarado e as praias paradisíacas para visitar, os mexicanos transmitem um clima familiar ao brasileiro de aconchego e alegria.
Koh Phangan, Tailândia
Amada pelos viajantes, a Tailândia aparece na lista de destinos preferidos por causa de sua qualidade de vida invejável. Além do contato constante com a natureza, o custo de vida é extremamente baixo e a internet funciona incrivelmente bem. “Eu já trabalhei no meio do mar e tinha sinal de internet”, revela Sophia entre risadas. “É um dos maiores polos de nômades digitais do mundo e tem uma estrutura absurda para nos receber.”
Tanto Sophia quanto Souza ficaram presos na Tailândia no começo da pandemia por conta do fechamento das fronteiras. “Fiquei na melhor situação possível. Eles controlaram a doença e eu fiquei seis meses em uma ilha paradisíaca por um preço incrível”, diz Souza, que teve tempo de sobra para aproveitar as belezas naturais. Sophia, que passou o ano inteiro no país, revela ser quase impossível enjoar. “Já entendi que um mês é muito pouco para explorar e entender a Tailândia.”
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