No último dia 5, a Jaguar celebrou o Jubileu de Platina da rainha Elizabeth exibindo um E-Type – provavelmente seu carro mais icônico – restaurado sob medida, com direito a pintura que remete ao azul da bandeira do Reino Unido e outras melhorias técnicas.
Fãs da marca têm outras razões para comemorar, contudo.
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De certa forma, a história da Jaguar começa há 100 anos. Em 1922, William Lyons e William Walmsley fundaram a Swallow Sidecar Company, fabricante daqueles carrinhos acoplados em motocicletas. Depois de ganharem fama pelo estilo e pela qualidade dos sidecars, em 1927 começaram a flertar com automóveis, construindo as carrocerias do Austin Seven.
Os primeiros carros próprios chegam somente em 1931: SS1 e SS2, com motores e chassis fornecidos pela Standard, empresa vizinha em Coventry. Os dois modelos inspiram a primeira mudança de nome, de Swallow para SS Cars, que ganha ainda mais fama com o SS Jaguar 90, primeiro esportivo da empresa, de 1935.
Após a Segunda Guerra Mundial, o “SS” sai do nome da empresa – para evitar a óbvia associação com a Schutzstaffel, ou SS, organização paramilitar ligada ao nazismo – e “Jaguar” vira enfim o nome da fabricante.
Saturday Club
Entre meados dos anos 1980 até o fim dos anos 1990, o mundo testemunhou o nascimento de uma geração ímpar de supercarros. Com histórias, nacionalidades, especificações e propósitos diferentes, Ferrari F40, Ferrari F50, Porsche 959, Bugatti EB110 e McLaren F1 ajudaram a moldar uma espécie de olimpo automotivo.
Tão veloz, exótico, exclusivo e raro – mas nem sempre reconhecido assim –, o Jaguar XJ220 faz parte desse exclusivo clube. Aliás, foi de um clube que o XJ220 nasceu, há 30 anos.
No final de 1987, a Jaguar tinha acabado de vencer o World Sport-Prototype Championship com um XJR-8. Jim Randle, então chefe de engenharia da fabricante inglesa, pensou que era o momento certo para a marca ter um carro de corrida homologado para as ruas.
Como sabia que a Jaguar jamais patrocinaria tal extravagância, Randle recrutou voluntários da própria empresa para desenvolver o projeto, fora do horário de expediente. Daí a existência do Saturday Club, uma reunião de 12 engenheiros da Jaguar que se reuniam aos sábados para planejar o próximo supercarro da companhia.
Rabiscado pelo designer-chefe da empresa, Keith Helfet, o futuro modelo não tinha nome, apenas um código: XJ220, que se referia a uma produção inicialmente limitada a 220 unidades.
O conceito foi adiante e a Jaguar decidiu exibi-lo durante o British International Motor Show de 1988, do qual o XJ220 fora a principal atração. Quatro anos depois, a versão de produção estava pronta e chegava às lojas.
Para alcançar níveis de desempenho até então inéditos para um Jaguar, a empresa contratou a Tom Walkinshaw Racing como parceira na construção do carro. Projetado para ter um V12 e tração integral, o XJ220 acabou equipado com um 3.5 V6 biturbo (central), que despejava seus 550 cv e 65,3 kgfm de torque apenas nas rodas traseiras, por meio de um câmbio manual de cinco marchas.
Contudo, boa parte dos clientes já havia depositado £ 50.000 de sinal para ter um Jaguar V12, e não V6 – o que gerou à fabricante alguns processos judiciais. Mesmo assim, o XJ220 se tornou o carro mais rápido do mundo em 1992, ao atingir 340 km/h de velocidade máxima. Até mesmo pneus especiais, nas medidas 345/35, de 18 polegadas, a Bridgestone desenvolveu especialmente para ele.
Ainda que custasse exorbitantes £ 470.000, deu prejuízo à Jaguar.
Em 1994, o XJ220 saiu de cena após 275 unidades produzidas.
Dois no Brasil
Hoje o XJ220 é um clássico indiscutível, cobiçado e valorizado: em 2003, um exemplar 1993 foi leiloado pela RM Sotheby’s por US$ 157.500; doze anos depois, outro semelhante a este foi arrematado por US$ 462.000. Leilões mais atuais já estimam valores ao redor dos US$ 500.000.
“Um modelo de referência na ilustre história da Jaguar, o XJ220 ainda é o carro de produção mais rápido da marca. Como tal, permanece altamente colecionável, sendo procurado pelos aficionados da Jaguar e pelos colecionadores de supercarros”, resume a RM Sotheby’s.
Há dois exemplares no Brasil, um prata e um azul, pertencentes a coleções privadas. Que, estima-se, chegaram aqui zero-quilômetro, por volta de 1993. Ao completar 30 anos, o XJ220 poderá ser importado novamente, agora como carro de coleção.
“É um esportivo menos óbvio do que uma F40. Tem sua grande relevância, mas gera menos desejo. Não é o pôster que estava na parede de todo adolescente dos anos 1990. E são tão poucos colecionadores que têm condição de ter um modelo desse, que acho difícil que um XJ220 esteja na lista de alguém por aqui”, avalia Henrique Mendonça, à frente da loja O Acervo.
Pelas contas de Mendonça, estacionar um XJ220 na garagem custaria a um colecionador brasileiro cerca de R$ 6,3 milhões.
“Lá fora, é um carro de US$ 500 mil, US$ 550 mil. Já um Porsche 959 ou uma Ferrari F40 estão na casa de US$ 1,2 milhão e US$ 1,8 milhão, respectivamente”, calcula o comerciante especializado em clássicos.
Para ele, o colecionador desse perfil tem acesso a uma estrutura nos EUA ou na Europa: “muitas vezes ele compra e usa lá fora”.
XJ220 S
Um XJ220 pilotado por David Coulthard, David Brabham e John Nielsen venceu as 24 Horas de Le Mans de 1993 na categoria GT. Um mês depois, no entanto, o carro foi desclassificado por ter corrido sem catalisadores.
Foi então que a Tom Walkinshaw Racing, equipe de corrida desde o início envolvida com a construção do XJ220, pegou as especificações do carro de Le Mans e aplicou num modelo de rua, criando o XJ220 S, mais leve e com 700 cv. Estima-se que apenas seis unidades foram montadas.