Não é surpresa nenhuma que o uso de aplicativos de relacionamento tenha disparado durante o período mais difícil da pandemia. Não só cresceram as pessoas em busca dessa tecnologia como também surgiram novas opções para quem buscava encontrar alguém no ambiente virtual. Brasil e Estados Unidos, inclusive, hoje são os maiores consumidores dessas plataformas.
Dito isto, existem dois fenômenos interessantes acontecendo:
1. Parece não ser verdade que esses aplicativos estão sendo usados só para encontros e sexo casuais. Um sociólogo americano foi estudar isso e constatou que, atualmente, os casais heterossexuais são mais propensos a conhecer um parceiro romântico no ambiente online do que por meio de contatos e conexões pessoais.
Isso mostra que parece ter desaparecido o estigma de que usar a tecnologia para encontrar alguém é ruim. Também mostra que parece ser mais “cômodo” usar esses apps. Aqueles amigos que costumavam nos apresentar uma pessoa parecem não fazer mais essa intermediação. Claro que eles existem e os encontros pessoais casuais também, mas eles diminuíram. Até porque, nessas plataformas há muito mais pessoas esperando ser conhecidas do que, por exemplo, num bar ou numa festa.
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2. Será que a experiência de conhecer alguém online é tão boa quanto pessoalmente? Tudo leva a crer que não. Primeiro, porque o gasto de tempo nessas plataformas é enorme. Uma pesquisa feita por um desses apps uns anos atrás apontou que as pessoas gastavam cerca de 1,5 hora por dia logadas, o que dá cerca de 10 horas, em média, por semana. Isso é um dia inteiro de trabalho. É muito.
Segundo, porque quase a metade das pessoas se diz frustrada com a experiência de encontrar alguém ali. São horas gastas na incansável rolagem de tela até haver um possível “match”. Tanto é assim que já existem dois termos para descrever esse cansaço: fadiga da decisão e esgotamento por aplicativos de namoro. Simplesmente 4 em cada 5 adultos disseram ser sentir esgotados emocionalmente com essa experiência, de acordo com dados de abril de 2022.
Isso sem falar que muita gente, em meio à troca de mensagens, desaparece e para de se comunicar (o famoso “ghosting”), muita gente mente, muitos caem em golpes e muitos estão ali só para enganar, muitos têm a autoestima abalada porque ninguém dá “match” neles. Já o encontro presencial dá mais chance de checarmos as informações que estamos “recebendo”, checar como o parceiro ou a parceira potencial age, se comporta, checar se houve “química” de verdade.
Será que vamos voltar só ao olho no olho? Não creio. Essas tecnologias vieram para ficar. Mas é possível que, logo, essas plataformas sejam substituídas por um um modelo híbrido. E isso já está acontecendo. Um aplicativo chamado Thursday (quinta-feira, em português) só funciona às 5as. Assim, você tem 24 horas para conhecer alguém online e marcar um encontro na vida real. Bacana, não?
Dr. Arthur Guerra é professor da Faculdade de Medicina da USP, da Faculdade de Medicina do ABC e cofundador da Caliandra Saúde Mental.
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