Começo com algo que pode parecer uma obviedade, mas não é: férias são essenciais para a boa saúde mental. Vejo muita gente postergar esse momento não só por receio de ser desligado da empresa em que trabalha, mas porque a sensação de que tanta coisa chega até você, há tanto para resolver, para entregar, que isso parece funcionar como uma barreira para o descanso. O resultado é que se vai adiando, adiando as férias até que muitos “pifam”.
Diferentemente de uma máquina (vou citar o PC ou o notebook, porque todo mundo faz uso deles), feita para trabalhar seguidamente, o cérebro precisa de pausa, precisa de um momento para descansar, um momento de inatividade para que ele seja capaz de continuar produtivo.
Não por acaso, na maioria das culturas as leis trabalhistas reservam um momento do ano (as férias) como um direito ao descanso. O do cérebro, principalmente, no caso da maioria de nós que executa trabalhos intelectuais. Mas também o do corpo, para quem, além da mente, faz uso dos seus músculos no dia a dia – agricultores, esportistas, policiais, empregados domésticos etc.
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O espaço número 1 que o cérebro tem para realmente passar um tempo inativo e se recuperar é no sono. Daí a importância de dormir bem e de praticar a higiene do sono para estimular uma boa noite na cama. As férias são um outro espaço constituído para dar ao cérebro a possibilidade se regenerar.
Uma coleção de estudos recentes vem mostrando o quanto esse repouso é essencial para o bem-estar e para a saúde mental, a começar pelo fato de que elas são uma oportunidade de reajustar os padrões de sono (quantos de nós não iniciam as férias num tremendo déficit de sono?). Só isso vai ajudar você a retornar ao trabalho com o pensamento mais claro, mais criativo.
Contato com o verde, com a natureza, prática de uma atividade física que foi deixada de lado por causa do trabalho, investimento no aprendizado de uma nova atividade ou competência, dedicação à leitura e ao lazer, à família, aos amigos. Tudo isso contribui para que a mente consiga vagar por diferentes experiências, ao invés de – como acontece quando estamos trabalhando – focar em uma única atividade por horas seguidas, o que a deixa exaurida.
Férias também são o momento oportuno para descomprimir. As pressões do trabalho estimulam a elevação dos hormônios do estresse. Repouso também permite regular novamente essa balança hormonal que estava descompensada e que, se permanecer desregulada, pode afetar a saúde física.
Mas que fique claro: as férias devem ser usadas para nos desconectarmos. Conheço muita gente que conseguiu tirar um mês de férias e voltou aos compromissos diários tão estressado quanto estava anteriormente, porque não se deu a oportunidade de se desligar.
Nem é preciso de fato sair da cidade, embora, claro, isso ajude a descomprimir. O importante é largar a caneta (metaforicamente falando) e só voltar a pegá-la ao fim do seu período de descanso. Aproveite esse momento. A sua saúde física, emocional e mental vão agradecer.
Dr. Arthur Guerra é professor da Faculdade de Medicina da USP, da Faculdade de Medicina do ABC e cofundador da Caliandra Saúde Mental.
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