Resumo:
- Pesquisa revela que o aumento da população não está sendo acompanhado por mais pesquisas para melhorar eficiência na produção de proteína animal;
- As mudanças climáticas também afetam as empresas, que podem perder dinheiro em processos e desastres ambientais;
- Quase 25% dos produtores não divulgam o uso de antibióticos na sua cadeia de produção;
- Pesquisadores notaram um aumento nos investimentos em empresas que buscam desenvolver políticas amigáveis ao meio ambiente.
Um novo estudo sugere que muitos dos maiores produtores mundiais de proteína animal não estão conseguindo mitigar seus próprios impactos no meio ambiente, no bem-estar dos animais e na saúde humana. Agora em seu segundo ano, o Coller FAIRR Protein Producer Index, índice feito pela FAIRR, entidade colaborativa que pesquisa riscos ambientais, sociais e de governança e analisa empresas como a Hormel e a produtora de carnes brasileira JBS, descobriu que muitas das 60 maiores do setor não estão tomando as medidas necessárias para reduzir seu impacto ambiental. Apesar de avisos urgentes de grupos ambientais que produtores de comida precisam se empenhar mais, muitas das maiores empresas de proteína animal não estão tomando as ações necessárias.
A população aumenta, os recursos diminuem
De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), a população mundial vai atingir 9,7 bilhões de pessoas no final de 2050. Sem dúvida, a produção de comida industrial conseguiu alimentar grandes faixas da população global por décadas, mas esse sucesso veio com custos significativos ao ambiente.
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Diversas empresas de alimentação dizem estar trabalhando para reduzir seu impacto ambiental, mas, de acordo com pesquisas, os dados disponíveis ao público contam uma história diferente. Neste ano, o índice FAIRR analisou os esforços sustentáveis de 60 das maiores empresas de proteína animal em nove categorias diferentes, incluindo emissões de gases de efeito estufa, poluição das águas, desperdício de comida, condições de trabalho, uso de antibióticos e bem-estar animal e concluiu que, em muitos casos, faltou atenção e esforço das empresas.
Para piorar a situação, os impactos crescentes da mudança climática estão pressionando ainda mais a produção de alimentos. “Estamos percebendo que empresas do setor estão contribuindo para muitos dos riscos discutidos no estudo, mas que elas estão profundamente vulneráveis aos impactos da mudança climática”, afirma o chefe de pesquisa do FAIRR, Aarti Ramachandran.
As consequências financeiras podem ser severas. “Já é possível notar impactos de eventos climáticos nas receitas”, diz Ramachandran, apontando o exemplo da Australian Agricultural Company. A produtora de carne vermelha perdeu mais de US$ 100 milhões em danos causados por enchentes em Queensland e pela seca atual. “Eles perderam mais de metade do rebanho [das propriedades no Golfo]”, ela diz que o número é 9% de todo o gado da companhia. Apesar das perdas significantes, a produtora não publicou uma estratégia de mitigação de mudanças climáticas com objetivos específicos.
Muita conversa, pouca ação
Enquanto as conversas de sustentabilidade de grandes agentes continuam acontecendo, o estudo apresenta um cenário diferente, pelo menos na maioria dos casos de produtores de frango, carne e porco.
Apenas 30% destas empresas divulgaram as medidas específicas que estão tomando para diminuir emissões de gases estufa, por exemplo, e a perspectiva no desmatamento não é muito melhor. Cinquenta das empresas de carnes e laticínios que dependem de terras desmatadas para fornecimento de soja e gado tiveram um índice de apenas 8% de endereçamento nos riscos de desflorestamento. A pior informação é a de que nenhuma dela se comprometeu publicamente com diretrizes, especialmente falando sobre o problema da soja e gado nas regiões em que têm fornecedores.
Muitas empresas chinesas estão importando mais soja do Brasil agora, graças à guerra comercial com os Estados Unidos. Mas 88% das companhias asiáticas analisadas pelo índice, incluindo oito produtores de carne de porco, também não oferecem nenhuma discussão pública sobre os riscos de desmatamento.
Divulgação do uso de antibióticos
Pouco menos de 25% das empresas do índice não possuem políticas públicas sobre antibióticos e se negam a divulgar a quantidade ou o tipo de substâncias usados em suas fazendas. Na verdade, apenas quatro companhias, a Bakkafrost (peixe), GFPT (aves), Lerøy Seafood (peixe) e Marfrig Global Foods (carne de vaca), comprometeram-se a acabar com as rotinas de uso desse tipo de droga.
As redes de Fast Food McDonald’s e Yum! Brands disseram que vão reduzir o uso de antibióticos em seus alimentos, mas o estudo pontuou que as duas empresas continuam comprando de fornecedores de carne e frango que não se alinharam à causa.
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O bem-estar animal também continua sendo um problema. Os pesquisadores descobriram que “empresas de carne conseguiram um índice medíocre de 22% em comprometimento com a situação de animais e ainda menos, 14%, em auditoria de parceiros e garantia de bem-estar”. Além disso, 83% das empresas estudadas “não possuem processos para identificar, prevenir e solucionar abusos de direitos humanos em atividades comerciais”.
Muitas dessas companhias também não estão conseguindo administrar a poluição das águas de sua operação, especialmente a derivada da falta de gestão de estrume. Seis dos sessenta produtores não divulgam suas informações da política de dejetos, outros 47 da pesquisa revelam pouquíssimo sobre suas práticas do assunto.
Segundo o documento, a Smithfield Foods, subsidiária da firma chinesa WH Group, já foi “penalizada em um total de US$ 550 milhões por processos relacionados a fezes de porcos”.
Ainda existe esperança
“O setor não possui a cultura de divulgar informações”, afirma Ramachandran, que espera que o estudo possa começar a mudar as ações em uma direção correta. “Mesmo que esse tipo de trabalho esteja acontecendo longe da visão do público, o meio ambiente que vivemos hoje e a urgência dos riscos ambientais fazem com que esse tipo de divulgação seja absolutamente crítica”.
O estudo revelou que muitas multinacionais tiveram bom desempenho no quesito de proteção ao meio ambiente, incluindo três empresas de hidrocultura europeias: Lerøy Seafood Group, Mowi and Bakkafrost. Essas organizações fizeram avanços significativos em prevenção de doenças e diminuição de uso de antibióticos em seus peixes.
A produtora de laticínios neozelandesa Fonterra e a fabricante de carne norte-americana Tyson Foods tomaram ações significantes para mitigar seus impactos ao reduzir a emissão de gases estufa e investir no setor de proteína alternativa. A Tyson Foods, inclusive, é a única organização a estabelecer um objetivo científico para reduzir emissões gases de efeito estufa na produção de carne de porco, ave e bovina até 2030, apesar de a nota do autor não mencionar se o objetivo é cobrir toda a cadeia de fornecimento de proteína da companhia.
Por outro lado, a Smithfield Foods discorda da afirmação. A vice-presidente executiva de compliance e assuntos corporativos, Keira Lombardo, afirma que a declaração acima é “totalmente errada. Em 2016, com a ajuda do Fundo de Defesa Ambiental (EDF, em inglês), a Smithfield Foods se tornou a primeira grande empresa de proteína a adotar um objetivo de redução de gases de efeito estufa na cadeia de fornecimento, prometendo a redução dos gases em 25% nos Estados Unidos em 2025”.
Ela também comentou que “diversos esforços estão sendo feitos”, incluindo:
- Desenvolvimento de projetos para transformar estrume em energia em 90% dos matadouros na Carolina do Norte, Utah e Virginia, e todos os no Missouri ao longo da próxima década.
- Parcerias para criar um fertilizante à base de esterco de porco que seja melhor do que os produtos tradicionais.
- Aperfeiçoar a logística e adotar novas tecnologias para reduzir distâncias percorridas por caminhões.
- Lançar um plano ambicioso de redução de lixo sólido em todas as instalações nos Estados Unidos para 2025.
- Implementar projetos de eficiência operacional que resultem em menor uso de energia, incluindo refrigeração, iluminação e outros projetos de equipamentos.
A produtora de laticínios Fonterra definiu um objetivo de atingir crescimento sustentável ao clima em suas fazendas na Nova Zelândia até o ano de 2030, primeiramente pelo aumento de produtividade e pela mudança de alimentação suplementar. A empresa divulgou um registro quase completo de suas emissões de gases estufa, comprometeu-se a resolver a maioria dos problemas com bem-estar animal e é uma de dez empresas do índice que publicou seus processos de prospecção de negócios combinados com direitos humanos.
Outra empresa com boa performance no relatório foi a produtora de carne vermelha Marfrig Foods, que divulgou um registro detalhado de suas emissões de gases estufa. Um dos maiores riscos para empresa que operam no Brasil é o desmatamento, mas a Marfrig possui um programa em andamento para minimizar esse problema, diz o estudo.
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O investimento em laticínios e carnes à base de plantas teve aumento significativo em 2018, fato visto como positivo pelos autores do índice FAIRR na direção da sustentabilidade. Ramachandran explica: “nós entendemos que deveria haver um rebalanceamento geral de proteínas, para que o consumo de proteínas animais não continue a crescer no mesmo nível e para que exista um equilíbrio sustentável entre comida à base de planta e de animais”.
Outras ações também deixam Ramachandran esperançosa. Apesar de a maioria das empresas do índice não terem sido particularmente transparentes sobre o manejo do esterco, a pesquisadora disse que a produtora de porcos Smithfield anunciou recentemente um novo esforço na Carolina do Norte para endereçar seu impacto na poluição do estado, o que ela entende como um passo na direção certa. “Eles anunciaram um projeto razoavelmente grande para converter esterco em energia”, explica. “É um exemplo positivo”.
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