No último mês de 2019, a cidade chinesa de Wuhan, na China, recebeu os primeiros indícios da doença que está se tornando uma pandemia: o Covid-19, causado pelo novo coronavírus. O contágio cresceu no continente asiático, alcançando atualmente quase 80 mil casos confirmados e se espalhando para outros países.
Com surtos na Itália e no Irã e casos isolados em diversas nações, como Brasil e Estados Unidos, o Covid-19 se tornou uma situação de saúde pública, gerando debates e discussões sobre o desenvolvimento da cura.
É neste contexto que a startup Moderna Inc. vem se destacando. A empresa chamou a atenção por estar na dianteira da corrida pela vacina contra o coronavírus. O primeiro lote já foi enviado para testes no Instituto Nacional de Doenças Alérgicas e Infecciosas (NIAID). Esse fato mexeu com suas ações. Nesta semana, com o mercado acionário global em crise, os papéis da companhia , que opera sob o código MRNA, dispararam 30% nos dias 25 e 26 de fevereiro. Já no pregão de ontem (27), as ações oscilaram, mas ainda assim fecharam em alta.
Isso reflete o fato de que o senso de oportunidade e a eficiência da companhia são diferenciais que a estão conduzindo ao patamar atual. E um dos protagonistas por trás de tudo isso é o CEO da empresa, Stéphane Bancel. Ligado à Moderna desde outubro de 2011, o executivo possui mestrado em engenharia pela École Centrale Paris (ECP), MBA em engenharia química pela Universidade de Minnesota e em administração de empresas pela Harvard Business School.
Antes de se juntar à startup, sua experiência na área farmacêutica já estava em constante ascensão. Trabalhou um tempo na Ásia, desenvolvendo o mercado de medicamentos para doenças infecciosas na sua então empresa farmacêutica francesa de capital aberto, a bioMérieux. Depois disso, decidiu que precisava continuar aprendendo e assumiu uma posição na manufatura da Eli Lilly, onde teve a experiência de gerenciar equipes com mais de uma centena de pessoas.
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Bancel cresceu rapidamente na Lilly e acabou como diretor administrativo de suas operações na Bélgica, com responsabilidade pelas áreas de vendas, marketing, pesquisa e ensaios clínicos. Em 2006, recebeu uma ligação da bioMérieux, convidando-o para ingressar novamente na empresa como CEO, um cargo que ocupou por cinco anos.
Com um currículo recheado no setor, começou a receber propostas para administrar startups de biotecnologia. “Recusei a maioria delas porque não eram emocionantes o suficiente. Até que soube da Moderna – e fiquei mais interessado”, diz.
A conexão entre o CEO e a Moderna foi imediata graças à ousadia da empresa, que buscava uma maneira de usar o RNA mensageiro (mRNA) para fabricar medicamentos biológicos, produtos que tradicionalmente são feitos com DNAs recombinantes, o que cria um atraso de três a quatro anos entre a ideia de um medicamento e sua fabricação efetiva.
Com a proposta da Moderna, seria possível criar uma vacina em, pelo menos, metade do tempo do método tradicional. Esse cenário fervilhou na cabeça de Bancel, que chegou a duvidar que essa divulgação fosse verdadeira, já que o uso do mRNA havia sido descartado pelos cientistas uns anos antes. O especialista explicou que “o mRNA apresentava falhas significativas quando utilizado. Ele se degradava rapidamente porque a célula o via como um vírus invasor que gerava uma resposta imune, dando a qualquer medicamento fabricado uma estimativa de vida tão curta que não seria eficaz”.
CETICISMO
Mas Derrick Rossi, um jovem cientista de Harvard, havia descoberto uma maneira de realizar essa produção inovadora. Mesmo assim, apesar dos promissores resultados acadêmicos, Bancel estava cético. “Eles me mostraram um trabalho de pesquisa e eu disse: ‘Eu não compro’. Mas então vi que o Hospital Infantil de Boston tinha conseguido replicar os dados e decidi prestar atenção”, relembra.
Era tudo que precisava para Bancel se encantar pela proposta e decidir financiar a Moderna. Após mergulhar de cabeça na empresa, começou a organizar a comercialização da descoberta de duas formas: licenciando-a para grandes empresas farmacêuticas e desenvolvendo seus próprios medicamentos.
Para os grandes nomes do setor, a startup oferece vantagens econômicas convincentes que movimentam positivamente a indústria. Como regra geral, o segmento sofre porque, normalmente, consome mais de uma década e de US$ 1 bilhão para desenvolver um novo medicamento. “Usando nossa tecnologia, leva apenas algumas semanas para passar da ideia para a droga no frasco e meses para proteínas in vivo. Podemos levar uma empresa para a linha de chegada em um ano”, explica Bancel.
Além disso, a empresa consegue reduzir o custo de fabricação de um biofarmacêutico. “Nossa tecnologia pode diminuir muito o custo de fabricação de um medicamento em comparação ao DNA recombinante. O lançamento antecipado pode oferecer às empresas entre dois e quatro anos de vendas patenteadas adicionais com menos dinheiro inicial e margens muito mais altas”, revela.
No quesito econômico, o CEO da Moderna também disse, em uma entrevista, que a empresa optou por angariar dinheiro de maneira privada, e que conta com investidores como BB Biotech AG, Sequoia Capital China, Viking Global Investors e Alexandria Venture Investments, que já passaram pela história da companhia.
Interesse foi a palavra chave que ligou Bancel a seu trabalho atual, e, em 2018, após quase oito anos na Moderna, o CEO disse à FORBES que possuía uma participação de 10% na startup. Ele revelou que não vendeu nenhuma ação e comprou mais algumas pelo caminho. Supondo que sua participação continue a mesma, ele possui cerca de US$ 700 milhões em ações da empresa.
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Toda sua visão sobre o mercado farmacêutico não estava equivocada. Apesar do ceticismo do início, Bancel e a startup cresceram juntos, conquistando o mercado e fazendo da Moderna uma empresa de biotecnologia de US$ 2 bilhões em capital. sua expectativa é de esperança: “Temos um alto valor para investir, uma ótima equipe, uma poderosa plataforma de mRNA e um local de fabricação de ponta. Estou mais energizado do que nunca sobre o nosso futuro”.
Além dos lucros, Bancel revela a existência de um foco maior, combustível diário para levar a companhia cada vez mais longe: “Nosso objetivo são as doenças raras com necessidades médicas não atendidas e, é claro, a cura do câncer”.
A companhia já possui pesquisas avançadas na produção de vacinas profiláticas, incluindo vacinas complexas com múltiplos antígenos para doenças comuns, bem como contra ameaças à saúde pública global, onde se enquadra o Covid-19.
No site oficial, a empresa revela o status de cada vacina que está sendo produzida e das que já passaram por todos os testes e estão no mercado. Ela também se posiciona sobre seus objetivos, dizendo que “seu portfólio global de saúde pública está focado em doenças epidêmicas e pandêmicas, para as quais o financiamento foi solicitado a organizações governamentais e sem fins lucrativos”. Com enquadramento perfeito para o atual coronavírus e com a vacina já em fase inicial de teste, a tendência é que o produto seja viabilizado dentro de um ano e meio.
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