Stephanie Bon, 37 anos, trabalhava no banco Lloydse, em Colchester, na Inglaterra, quando usou o Facebook para criticar o salário de £ 4.000 do CEO da empresa, o executivo António Horta-Osório. Pouco tempo depois, ela foi demitida. O ator Chris Fountain, por sua vez, foi dispensado de um programa de TV após a emissora encontrar no YouTube vídeos onde ele aparecia cantando uma música de conteúdo polêmico. Já Clare Deloughrey acabou expulsa do Departamento de Bombeiros de Whitefield, em Manchester, Reino Unido, depois de publicar uma série de fotos sensuais vestindo a farda do grupamento.
Situações como essas vão se tornando mais comuns à medida que as ações do mundo virtual passam a interferir no mundo real. Em um país como o Brasil, com 211,8 milhões de habitantes, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), sete em cada dez habitantes usam as redes sociais de maneira ativa. Por isso, o comportamento online já é considerado, pelos especialistas em carreira, uma extensão das atitudes da vida real.
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“Muita coisa que é colocada na rede se propaga de forma instantânea, atingindo um número ilimitado de interlocutores. Esta realidade confere maiores poderes àqueles que utilizam das redes sociais e, consequentemente, maiores responsabilidades em sua atuação e postura de manifestação de pensamento”, explica o advogado trabalhista André Leonardo Couto, da ALC Advogados.
De acordo com ele, o artigo 482 da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) assegura que “atos de improbidade, incontinência de conduta ou mau procedimento e violação de segredos” configuram demissão por justa causa. Na prática, isso significa que ferir a imagem ou honra do empregador, de parceiros, clientes, colegas de trabalho, assim como a divulgação de situações internas e estratégicas do negócio, são algumas das atitudes que podem custar caro para o colaborador. “O que mais gera problema nas redes sociais são postagens que vão contra as regras legais e que ferem a moral dos bons costumes e da decência. Além disso, o uso indevido dessas plataformas durante o horário de trabalho podem resultar em penalidades”, descreve o especialista.
Outras práticas que, à primeira vista parecem “inofensivas”, também podem causar constrangimentos. É o caso de críticas políticas e até de fotos na praia com a família. Leonardo Berto, branch manager da Robert Half, consultoria especializada em recursos humanos, explica que a partir do momento que o usuário adiciona contatos profissionais à sua rede, os cuidados com o conteúdo devem ser redobrados. “Essas publicações podem trazer um tom antiprofissional e prejudicar a imagem corporativa do colaborador”, afirma. “A recomendação é que se evite posicionamentos contra organizações, políticos e outras entidades ou personalidades. Apesar de algumas empresas olharem com outros olhos para o ativismo, a principal orientação é que, nesses casos, o tom seja educativo ou de conscientização, nunca agressivo ou desrespeitoso”, completa.
Por último, o funcionário deve prestar atenção redobrada com as interações que faz na rede. Isso porque o ato de compartilhar, comentar e “curtir” publicações de caráter duvidoso também pode ser usado para embasar as punições. A advogada Erika Mello, especialista em compliance trabalhista, alerta, ainda, que determinadas postagens podem causar uma quebra de confiança entre colaborador e empregador. “Tem sido recorrente a aplicação de justa causa, por exemplo, baseada em apresentação de atestado médico para afastamento das atividades de trabalho e publicação em redes sociais de foto em festas ou outros ambientes de lazer incompatíveis com a condição relatada à empresa”, afirma.
Vida corporativa x privacidade
Por outro lado, a vigilância das empresas carrega alguns limites. Ao contrário dos perfis nas redes sociais, que hoje são considerados ambientes públicos, grupos e aplicativos de mensagens costumam ser encarados como uma repartição privada no meio digital. Erika Mello explica que o empregador que ingressar de maneira ilegítima nesses espaços, a fim de obter informações sobre o funcionário, também estará ferindo a conduta legal de trabalho.
“O cuidado, nesse caso, é que as empresas não podem extrapolar e invadir ambientes e equipamentos pessoais, porque dentro daqueles limites a pessoa está protegida pela Constituição Federal (art. 5º, X) ao seu direito à vida privada e intimidade, já que não existe a ação ou intenção de tornar público aquele conteúdo ou conduta”, pontua.
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Outro direito que deve ser respeitado é o da liberdade de expressão. Nesse contexto, os advogados descrevem que a situação pode se tornar ambígua. Se por um lado o funcionário é assegurado constitucionalmente ao seu direito de manifestação de pensamento, por outro ele deve prezar pela imagem da marca que representa. “O indivíduo, mesmo fora do ambiente de trabalho, continua vinculado à imagem da empresa e representando os seus valores, principalmente porque é comum que os internautas divulguem onde trabalham”, diz Erika. “A participação nas redes sociais se constituiu em instrumento do direito fundamental à liberdade de expressão, mas que deve ser exercitado com parcimônia, especialmente porque potencializa a publicidade das manifestações”, complementa Couto.
Os especialistas afirmam, ainda, que os empregadores podem e devem determinar regras e proibições para os colaboradores no espaço digital – desde que respeitem a liberdade individual. Nesse sentido, todo conteúdo que se relaciona à integridade moral da equipe e da companhia é tangível de controle. É razoável, por exemplo, prever que os funcionários não utilizem seus perfis pessoais nas redes sociais para manter conexão com clientes do empregador ou para criticar a marca”, afirma Erika. “Por outro lado, a empresa não pode interferir quanto às publicações de suas atividades de lazer, eventuais gostos pessoais, hábitos etc.”
A melhor medida é o bom senso
“Por mais clichê que pareça, a principal recomendação é bom senso. Antes de compartilhar um conteúdo, enviar solicitações de amizade ou sugerir conexões com colegas de trabalho, é fundamental que o profissional pare e reflita sobre quais serão os efeitos da ação em questão, especialmente em redes sociais corporativas, como o Linkedin, que vinculam o colaborador à marca, mas também em quaisquer outras que o profissional utilizar profissionalmente.
É interessante pensar que a rede social é um retrato seu para pessoas de fora, que muitas vezes não teriam tanto contato com você. Por isso, refletir sobre a imagem que deseja passar é tão importante”, explica Berto. Quando o deslize já foi cometido, a orientação dos especialistas é que o funcionário delete a publicação e procure o departamento de recursos humanos da empresa o mais rápido possível para esclarecer a situação e se desculpar.
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