Na última semana, a alta liderança da fabricante de eletrodomésticos Whirlpool, dona das marcas Brastemp, Consul e Kitchenaid, saiu do escritório para viver o dia a dia da linha de frente da empresa.
Quinze executivos C-Level, incluindo o gerente geral, Gustavo Ambar, passaram por toda a cadeia do negócio, desde as fábricas até os pontos de venda, atravessando a logística, os revendedores e o atendimento na casa dos consumidores, trabalhando de uniforme lado a lado com os colaboradores sem que eles soubessem. “A gente passa a ter uma perspectiva holística de todas as áreas, não só daquilo que é a nossa responsabilidade”, diz Ambar sobre a experiência. “Fiquei mais nervoso do que em muitas reuniões”, disse o CFO da Whirlpool no Brasil, Pedro Pimentel Collier, depois de um dia na fábrica.
A ação do tipo “chefe oculto”, em que líderes se camuflam para viver o dia a dia dos colaboradores ou mesmo para experimentar os serviços da empresa, ficou famosa com o reality show americano Undercover Boss, que ganhou uma versão brasileira dentro do Fantástico, da TV Globo. CEOs de grandes empresas, como Starbucks e Uber, e até mesmo Bill Gates, já usaram essa estratégia para viver na pele o dia a dia dos seus colaboradores.
Sair do escritório e vestir os sapatos, ou melhor, o uniforme dos funcionários pode ser benéfico para que executivos, que passam o dia todo entre calls e reuniões, entendam melhor a empresa e tomarem decisões mais conectadas com as equipes. No caso da Whirlpool, Ambar sentia que a liderança precisava ter um conhecimento mais geral do negócio, pé no chão mesmo. “Trouxe um entendimento de como as coisas são construídas e como o colaborador que faz todo dia a mesma coisa se motiva.”
Mas deixar o dia a dia de trabalho com que estão acostumados e desempenhar funções repetitivas foi mais difícil do que esperavam. “Quando você está numa atividade operacional, que é literalmente a linha de produção, se você faz alguma coisa errada, compromete o trabalho de todo mundo”, diz Ambar.
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Os executivos viveram exatamente a rotina dos funcionários, pegando o mesmo ônibus, almoçando a mesma comida e no mesmo intervalo de tempo. “Eu montei 84 fogões”, diz a diretora de marketing da Whirlpool, Patricia Pessoa.
Eles se apresentavam como uma equipe administrativa e só ao final do trabalho revelavam quem eram. “Estabelecemos a relação sem os vieses inconscientes que todo mundo tem”, diz Ambar.
No front da operação
Há cinco anos na Whirlpool e três meses no cargo de gerente geral, o executivo construiu sua carreira na indústria de bens de consumo não duráveis, em empresas como Danone e Pepsico, onde ficou por 12 anos. “Desde que entrei na Whirlpool, fui tentando me incorporar à indústria e colocar esse espírito de entender a operação como um todo”, diz ele, que já tinha participado de ações semelhantes antes, como parte do onboarding.
Essa é uma ideia que se conecta com a sua infância, já que cresceu acompanhando o negócio de aviamentos da família, de origem libanesa, na rua 25 de março, grande centro comercial em São Paulo. “Desde moleque, fui treinado para adquirir conhecimento do negócio com quem conduz as operações.”
Depois dessa experiência, a ideia é que os executivos, e até mesmo outros profissionais da empresa, continuem indo para a linha de frente periodicamente.
Veja outros CEOs ocultos
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Dara Khosrowshahi – CEO da Uber
Em um período de escassez de motoristas de aplicativo nos Estados Unidos, o CEO da Uber passou alguns meses trabalhando como um dos colaboradores da empresa nas ruas da Califórnia. Durante a experiência, classificada por ele como “bastante desajeitada”, segundo o Wall Street Journal, o executivo se inscreveu no app como qualquer um que quer ser motorista da Uber e também foi punido pelo algoritmo por recusar corridas. A vivência serviu para repensar os processos pelos quais passam os motoristas de aplicativo. Essa não foi a primeira vez que o executivo se colocou no lugar de um colaborador. Em 2021, o CEO trabalhou como entregador do UberEats e, em um dia, faturou só 0,48% do que ganha em um dia no escritório.
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Bill Gates – fundador da Microsoft
Em 1989, a Microsoft ainda não era a big tech de hoje, mas já era uma grande empresa com 4.000 funcionários. Quando Bill Gates, o fundador, visitava as novas instalações de suporte da companhia, perguntou a um dos técnicos se ele mesmo poderia atender uma ligação. Ele atendeu o telefone respondendo por “William”, seu primeiro nome, e aparentemente se deu muito bem. Quando o cliente ligou de volta mais tarde com uma pergunta complementar, pediu especificamente para falar com o William, que tinha resolvido seu problema.
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Xavier Mufraggi – CEO do Club Med para Europa, África, Oriente Médio e mercados emergentes
Xavier Mufraggi participou em 2020, quando ainda era CEO do Club Med, do programa de televisão norte-americano “Undercover Boss”, em que os executivos trabalhavam disfarçados por alguns dias ao lado de funcionários de suas empresas. O CEO trabalhou nos resorts da companhia em Punta Cana e Cancun em posições como barista e mensageiro. No final do episódio, quando revelou sua identidade para os funcionários com quem trabalhou, prometeu fazer melhorias nas acomodações e ao centro médico dos empregados da rede de hotéis. O Club Med ainda criou uma página em seu site para que os funcionários tivessem acesso à experiência vivida pelo executivo.
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Laxman Narasimhan – CEO do Starbucks
O novo CEO da Starbucks, Laxman Narasimhan, planeja trabalhar meio turno uma vez por mês como barista em uma unidade do Starbucks. Seu objetivo é “promover uma melhor conexão e engajamento entre a liderança e os funcionários”. Ele escreveu uma carta aos profissionais dizendo que a “saúde” da empresa precisava ser fortalecida, apesar do já forte desempenho da marca.
Dara Khosrowshahi – CEO da Uber
Em um período de escassez de motoristas de aplicativo nos Estados Unidos, o CEO da Uber passou alguns meses trabalhando como um dos colaboradores da empresa nas ruas da Califórnia. Durante a experiência, classificada por ele como “bastante desajeitada”, segundo o Wall Street Journal, o executivo se inscreveu no app como qualquer um que quer ser motorista da Uber e também foi punido pelo algoritmo por recusar corridas. A vivência serviu para repensar os processos pelos quais passam os motoristas de aplicativo. Essa não foi a primeira vez que o executivo se colocou no lugar de um colaborador. Em 2021, o CEO trabalhou como entregador do UberEats e, em um dia, faturou só 0,48% do que ganha em um dia no escritório.