Mario Garnero: Quanto mais muda, mais fica a mesma coisa

4 de novembro de 2020
FG Trade/Getty Images

Apesar da crise, o Brasil criou mais de 400 mil vagas de trabalho com carteira assinada nos últimos meses

Em francês, o ditado é Plus ça change, plus c’est la même chose. Entre a Segunda Guerra Mundial e a pandemia atual, uma lição ficará. O novo normal, em 1945, depois da morte de cerca de 80 milhões de pessoas de uma população mundial de 2,3 bilhões, corresponderá ao novo normal pós-pandemia, que até agora vitimou 1 milhão de pessoas em uma população de 7,8 bilhões.

E o novo normal, depois de duas bombas atômicas e da destruição física da Europa e de parte da Ásia, foi, para vencedores e vencidos, representado pelo consenso de reconstruir o tecido que sustenta a humanidade por meio da solidariedade e da união das vontades.

Assim tem sido desde a vida nas cavernas até a solidariedade hoje vista no combate e na busca de cura aos atingidos pela Covid-19.

O início do século 20 não imaginava as guerras mundiais nem a chegada da penicilina e da TV e a aterrissagem de meu amigo Buzz Aldrin na Lua. Também não sonhava com a internet, os aviões a jato e a proximidade global que esses avanços trouxeram, criando novas fontes de riqueza e prosperidade.

Da mesma forma, nossa entrada no século 21 não nos permitia imaginar mais uma das sete pragas que nos atingiram mundialmente. Influenza, HIV e Sars vieram e foram vencidas. Um dia, a Covid-19 também será uma triste recordação, mas terá marcado um passo gigantesco para o conhecimento médico e o desenvolvimento de novas regras sociais.

A solidariedade que no século passado levou à criação da Liga das Nações em 1919, após a Primeira Guerra, e da ONU em 1945, após o segundo embate mundial, deve estimular os países a mais uma ampla cooperação na luta contra a pobreza e sua filha dileta: as doenças epidêmicas. O grito de alerta foi dado.

"A Covid-19 será uma triste recordação, mas marcará um passo gigantesco para o conhecimento médico e o desenvolvimento de novas regras sociais."

Pensemos agora na retomada, já em andamento. A China crescendo 11%, vencendo o medo, embora tudo tenha lá começado. Os EUA, mesmo com o presidente Trump atingido, está criando empregos a taxas elevadas. O Brasil, segundo o Caged, criou mais de 400 mil vagas de trabalho com carteira assinada nos últimos meses. A retração anunciada pelas cassandras de plantão na faixa de 15% negativos estará muito próxima dos 2%.

Mas sempre poderíamos ter feito melhor, aqui e no mundo. A Bélgica, país ultradesenvolvido, apresentou a maior taxa de mortalidade per capita. Mas comparar morticínio não constrói. Vamos nos ater ao pós-Covid e ao crescimento mundial, única forma de evitar a pandemia mortal e paralisante da pobreza, que atinge mais de 2,5 bilhões de seres humanos. Para essa tarefa, os esforços locais não são mais eficazes. A China ainda tem 700 milhões abaixo da linha da pobreza; o Brasil, 50 milhões; os EUA, 25 milhões; a Europa, 70 milhões.

Abramos os olhos. O planeta atingirá em breve a marca de 15 bilhões de seres humanos. Logo teremos as populações atuais da China, Índia, EUA e Europa reunidas no mais importante exército mundial: o dos vulneráveis.

Vamos todos repensar os papéis das nações e dos homens neste ainda incipiente século 21. Qual de nossas ações ficou para melhorar a vida e o convívio dos nossos semelhantes? Qual é o nosso rumo social após a dura prova da Covid-19? Qual é o peso de nossas atitudes para forjar as grandes alianças nacionais e internacionais para combater o flagelo das pestes, das doenças e, acima de tudo, da fome?

Lembremo-nos de que a humanidade, como um todo, sem lideranças expressivas, sempre se comporta como um bebê. Desta vez, não basta apenas trocar as fraldas. Precisamos reaprender a andar.

Mario Garnero é chairman do Grupo Garnero e presidente do Fórum das Américas

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