O que é a DiDi?
O nome DiDi Chuxing Technology Co. não era conhecido nos EUA e em outros países ocidentais até este mês. A DiDi é uma empresa de transporte por demanda, e muito mais. Ela oferece uma ampla gama de negócios, incluindo compartilhamento de bicicletas, serviços de entrega sob demanda, vendas de automóveis, locação, financiamento e manutenção, operação de frota, carregamento de veículos elétricos e desenvolvimento de veículos em parceria com montadoras.
Assim como a China, a DiDi é enorme. Na verdade, chamá-la de “Uber chinês” é subestimar o modelo de negócios que a DiDi promoveu aos investidores em seu IPO. A empresa teve uma receita de cerca de US$ 25 bilhões nos últimos 12 meses, contra cerca de US$ 11 bilhões da Uber. A companhia afirma que seus níveis de usuários e penetração de mercado são atualmente 4 a 6 vezes maiores do que os do Uber, e ainda afirma ter 15 milhões de motoristas ativos, enquanto a Uber tem cerca de 3,5 milhões.
A DiDi parece um caso clássico de “Fast Follower” (“seguidor rápido”, em tradução livre). A Uber provou ser um modelo satisfatório para consumidores e investidores, e a DiDi pôde aproveitar a clareza do mercado para se expandir rapidamente e ultrapassar a ex-líder. Como Fast Follower chinês, a Didi aproveitou o enorme mercado interno para crescer bastante, protegendo-se da concorrência estrangeira. Ela também se beneficia da cultura emergente de rápida inovação de serviços, que impulsionou a tecnologia chinesa a uma posição de destaque no mundo.
Em 30 de junho, a companhia chinesa levantou US$ 4 bilhões em seu IPO, que não ocorreu na China, mas sim na Bolsa de Valores de Nova York. Foi o maior IPO de uma empresa chinesa no mercado norte-americano em sete anos. As ações subiram 15% no primeiro dia, levando o valor de mercado da empresa para US$ 80 bilhões.
Por quase 48 horas, essa foi mais uma história chinesa de sucesso.
O martelo foi batido
Mas parece que alguém em Pequim não ficou satisfeito. Em 2 de julho, o governo chinês suspendeu abruptamente os planos de desenvolvimento de negócios da DiDi. A empresa foi instruída a interromper a inscrição de novos clientes, enquanto aguarda sua “retificação”.
De qualquer forma, a empresa foi informada pelas autoridades chinesas que estava em “violação grave” de… o quê exatamente? Algo a ver com segurança de dados… sendo ordenada a suspender seus negócios. Especificamente, além da suspensão do recrutamento de novos usuários, Pequim impôs as seguintes medidas:
- O app da DiDi foi removido das principais lojas e plataformas de aplicativos;
- Outros 25 aplicativos – incluindo os apps de carona, de finanças e para clientes corporativos – também foram excluídos;
- A empresa foi multada por violações antitruste (referentes a um assunto mais antigo, mas agora visto como uma medida adequada).
O horário pode ter sido tarde (a ligação de Pequim foi às 22h, supostamente). A justificativa pode não ter sido clara. Mas seu cumprimento era obrigatório.
Nenhuma das ordens trouxe qualquer detalhe sobre os dados e problemas de segurança específicos que despertaram as preocupações dos reguladores. Em um comunicado publicado após a meia-noite nas redes sociais chinesas, a Didi disse que “aceitaria e obedeceria categoricamente” às demandas.
O dano imediato não se limitou às ações da DiDi. O índice Nasdaq Golden Dragon, composto por 98 empresas chinesas negociadas em Nova York, caiu paralelamente, recuando 14% em uma semana, com perda de US$ 130 bilhões em valor.
Em Xangai, o mercado perdeu cerca de US$ 200 bilhões em 2 de julho, quando o anúncio da DiDi foi divulgado. A bolsa de Hong Kong – repleta de empresas com dupla listagem em Nova York – foi a mais atingida, perdendo algo em torno de US$ 500 bilhões ao longo da semana.
Três Interpretações
1. Paranóias em Pequim
Talvez esse seja um equívoco de Pequim. De acordo com essa visão, atingir a DiDi é a última tentativa das autoridades chinesas de afirmar controle sobre uma florescente indústria de tecnologia empresarial. Nesse caso, seria um erro estratégico. Ao suprimir o setor mais dinâmico e inovador da economia chinesa, o governo tende a derrotar o propósito maior da China de alcançar a paridade tecnológica e econômica com o Ocidente. A China precisa dessas empresas fora da curva e hipercriativas, e do espírito empreendedor que as guia. Mas o governo parece não conseguir lidar bem com esse contexto, por isso as medidas em nome da “regulamentação financeira”, como o IPO interrompido do Ant Group e o agora prejudicado IPO da DiDi.
2. Boas políticas, péssima execução
Nessa interpretação mais otimista, a China assumiu a liderança no confronto com algumas complicações da rápida mudança tecnológica. Dentro de um sistema político mais autoritário, eles podem ser mais decisivos do que reguladores em outras economias.
“Os EUA e a China acabarão descobrindo que é do seu interesse cooperar para controlar as empresas que buscam acumular – e lucrar com – cada vez mais dados. China, EUA e outras economias irão se beneficiar com esses gigantes, mas também continuarão em confronto com eles”, disse oficial chinês de alto escalão. “Eles não podem lidar com o problema sozinhos. Esta é uma área importante para a cooperação.”
Talvez devêssemos admirar os reguladores chineses pela rapidez implacável com que abordam um problema, e rapidamente tomar as ações corretivas. Nessa visão, não é o resultado, mas a maneira às vezes brutal como a política é executada que podemos questionar. Depois que a poeira baixar, o resultado – podemos admitir – pode não ser tão ruim.
Tudo isso também pode ser visto como um passo calculado em direção ao confronto aberto com o sistema financeiro dos EUA e seus reguladores. Existem implicações nefastas para o sistema financeiro global que transcendem as diferenças de estilo ou julgamento.
A Guerra Fria Financeira, que já está se formando há algum tempo, foi declarada abertamente há alguns meses e não foi nem na China, nem em Nova York, mas sim em Washington D.C. quando o Congresso norte-americano aprovou por unanimidade a Lei de Responsabilidade de Empresas Estrangeiras.
Esta lei exige, entre outras coisas, que todas as empresas estrangeiras listadas nas bolsas de valores dos EUA precisam cumprir o processo de revisão de auditoria supervisionado pelo Conselho de Padrões de Contabilidade de Empresas Públicas (PCAOB). Esta agência foi criada pela Lei Sarbanes-Oxley de 2002, e todas as empresas públicas dos EUA são obrigadas a cumprir, assim como as empresas em quase todos os outros países que negociam em Nova York. A China disse que se recusará terminantemente a permitir que suas empresas cooperem. Eles são o único país do mundo a assumir essa posição.
Um estudo antigo de empresas estrangeiras listadas em Nova York – de diferentes países – encontrou um prêmio de avaliação de quase 40% associado à listagem cruzada em uma bolsa norte-americana. O estudo antecede o surgimento da tendência de listagem cruzada da China e, portanto, se refere principalmente a empresas sediadas em mercados desenvolvidos.
Um estudo mais recente do efeito do não cumprimento do PCAOB sugere um corte de 5-7% na avaliação das empresas chinesas associadas a comunicados indicando atrasos ou falhas na cooperação com os reguladores dos EUA.
Em qualquer caso, o custo de capital para empresas chinesas é significativamente mais alto do que para empresas norte-americanas. Aumentar o fator “risco regulatório” na China ou a perda de acesso aos mercados de capitais norte-americanos certamente aumentaria a lacuna entre os países.
Este endurecimento de posições não será facilmente revertido. Apenas nesta semana, tornou-se pública a notícia de que a ByteDance (TikTok) – outra gigante da tecnologia chinesa com alcance global – se dobrou a Pequim e “adiou” os planos para uma listagem nos EUA. Em toda a vasta paisagem China-Tech, há um esfriamento geral dos espíritos animais. Muitos dos “fundadores” viram o que aconteceu com Jack Ma e estão se afastando, diminuindo sua visibilidade. As empresas chinesas de tecnologia entenderam a mensagem.
A questão lateral relacionada a DiDi é: onde estava a “devida diligência” neste negócio? Parece claro que os reguladores chineses informaram a empresa sobre sua insatisfação com uma listagem “prematura”. Os bancos de investimento deveriam ter previsto isso. Para os investidores, perder US$ 23 bilhões em valor antes dos “cheques serem compensados” (por assim dizer) é uma grande falta.
“Não divulgar o conhecimento prévio das decisões regulatórias que movimentam o mercado pode tornar a Didi e os bancos que organizaram a oferta pública inicial – Goldman Sachs, Morgan Stanley e JPMorgan Chase – vulneráveis a processos judiciais de investidores e problemas regulatórios nos Estados Unidos.”
Tudo isso tem ficado claro para o mercado. O Índice Golden Dragon caiu 37% nos últimos cinco meses, devido ao aumento da pressão regulatória. O índice S&P 500 subiu 10% nesse período – então o resultado líquido é que as ações chinesas em Nova York caíram pela metade em relação ao nível geral de Nova York – configurando definitivamente um mercado em baixa para as ações chinesas.
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