Estônia: cidadania virtual permite a brasileiros empreender na Europa

10 de fevereiro de 2023
Foto: Leo Roomets/ Unsplash

Cidade Tallinn, capital da Estônia

Abrir uma empresa na Europa pode parecer um sonho distante para muitos brasileiros. Entretanto, pelo menos um país europeu facilita os processos. É a Estônia, primeiro país que instituiu o modelo de residência eletrônica (e-Residency).

O e-Residency é uma identificação virtual emitida pelo governo estoniano que dá acesso aos serviços eletrônicos do país para pessoas de qualquer origem. Essa identificação é concedida para estrangeiros que desejam ter acesso virtual ao ambiente de negócios do país (não é uma autorização para viver na Estônia).

“Na Estônia, 99% dos serviços governamentais são realizados totalmente online. Esse modelo administrativo mudou o olhar para o sistema burocrático do país, de modo que eles entenderam que, para empresas virtuais, não há diferença entre um fundador estoniano e um fundador estrangeiro. O ambiente é online de qualquer forma”, diz Taiz Coe, coordenadora de negócios e parcerias da e-Residency.

Desde o lançamento, em 2014, o programa de cidadania virtual da Estônia já atraiu cerca de 100 mil residentes estrangeiros, de pelo menos 170 nacionalidades. Somente brasileiros, são 1.087.

O primeiro passo para ter uma empresa europeia por meio do programa estoniano é tirar o e-Residency. Coe explica que, com o passaporte em mãos, é necessário entrar no site do programa, preencher o formulário e pagar uma taxa de € 190 (R$ 1,07 mil). Com isso, o pedido será enviado ao governo estoniano e um cartão de identidade é enviado num prazo de cinco a oito semanas.

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Após a chegada do cartão é necessário registrar a empresa por meio da abertura de um “CNPJ estoniano”. Outro formulário deverá ser preenchido, assim como uma taxa de € 265 (R$ 1,5 mil). “A abertura do CNPJ é imediata. Em 30 minutos é possível ter uma empresa europeia, totalmente funcional, sem despachantes ou advogados”, diz a coordenadora. “É mais barato e mais rápido do que no Brasil”.

Dos 1.087 brasileiros com cidadania virtual na Estônia, cerca de 288 deles tem o registro de companhia aberta no país. Essas pessoas conseguem acessar o mercado internacional sem sair do Brasil: fundos de investimentos, possíveis parcerias, remuneração em euro e/ou dólar, além de clientes europeus.

Uma experiência que Karen V Ordones conhece. E-Residente na Estônia, em 2015, ela criou uma plataforma de aulas particulares que conecta alunos a professores estrangeiros. Ordones fez o registro da startup Tutor.Id no país e em cinco anos conseguiu € 7 milhões (R$ 39,4 milhões) em investimentos internacionais.

Thomas Dobereiner, cofundador da NOBE, empresa que oferece soluções para a gestão pública por meio de softwares integrados, também é um exemplo de empreendedor brasileiro que conseguiu investimentos ao registrar sua startup na Estônia. No primeiro ano com o “CNPJ estoniano” ele conseguiu € 2 milhões (R$ 11,3 milhões) em investimentos.

Entretanto, mesmo aqueles que não conseguem um aporte financeiro também podem prosperar com a abertura de empresa na Estônia. Michele Garcia trabalhava como profissional autônoma para projetos de consultoria em vendas e atendimento ao cliente. Em 2020, ele adquiriu a sua e-Residency e fundou a Kuninganna. Ela não recebeu aportes, mas hoje tem clientes internacionais e aumentou a sua receita por se apresentar como uma empresa europeia.

O objetivo da Estônia é atrair esses profissionais que trabalham de forma remota e incentivar o giro econômico local. O país é pequeno, tem 1,3 milhão de habitantes – cerca de 10% da população da cidade de São Paulo, que conta com 12,4 milhões de habitantes, segundo estimativa do IBGE.

Devido às empresas serem registradas na Estônia, os impostos devem ser pagos ao país europeu. Para os empreendedores, esse não é um complicador. As taxas da Estônia são as mais competitivas e simples dentre os membros da OCDE, conforme o International Tax Competitiveness Index (ITCI) de 2022, elaborado pela Tax Foundation.

A taxa de imposto tem um valor único: 20% é devido em impostos sobre capital distribuído. Ou seja, se a empresa pagar dividendos ou alguma outra forma de recompensa financeira aos seus investidores, ela deverá pagar 20% em impostos à Estônia. Entretanto, o país não cobra taxas para capital reinvestido.

“Esse é um diferencial muito grande para startups. Porque são empresas em desenvolvimento que precisam de todo o capital possível para alavancar os negócios e fazer eles crescerem”, afirma Coe.

No caso de contratação de funcionários, as taxas aumentam porque as empresas devem arcar com custos trabalhistas. Neste caso, só podem ser contratados profissionais europeus ou estonianos. “A contratação de brasileiros residentes no Brasil em um CNPJ estoniano é considerada evasão fiscal e não é permitida”, afirma a coordenado do e-Residency.

Natural de Belo Horizonte, Taiz Coe trabalhou em startups e foi executiva de telecomunicações na Alemanha, na Espanha e na França. Após se tornar uma e-Residente da Estônia, ela conheceu mais sobre o país e se mudou anos depois para trabalhar para o governo estoniano.