Segundo a pesquisa anual focada em liderança na indústria de tecnologia realizada pela consultoria KPMG em parceria com a empresa de recursos humanos e tecnologia Harvey Nash, a participação de mulheres em posições seniores em tecnologia na América Latina está atualmente em 16%. A porcentagem é significativamente maior do que os 4% de representatividade feminina nestas funções em países como o Reino Unido, e superior à média global de 11%.
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Além disso, a pesquisa associa o aumento da liderança feminina em tech ao surgimento de programas específicos na região para trazer mais mulheres para o mundo de tecnologia. No Brasil, existem muitas destas iniciativas: PrograMaria, MariaLab, Laboratória e Reprograma estão entre os diversos projetos e startups sociais que visam aproximar mulheres deste mercado.
Reiterando o ponto de outras pesquisas, que afirmam que empresas com mais mulheres no board e em posições seniores tendem a ser mais lucrativas, o estudo da Harvey Nash e KPMG aponta que existem outras nuances do mundo pós emergência da Covid-19 que reforçam a importância de contratar mulheres em tecnologia e promovê-las para cargos de liderança.
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O estudo mostra um avanço da América Latina em relação ao resto do mundo na representatividade de mulheres em cargos seniores em tech. É um dado a ser comemorado, mas 16% ainda é muito pouco em relação ao tamanho da população feminina em países latinos como o Brasil, onde elas representam metade da população. Mulheres ultrapassarão os homens em termos de representatividade na força de trabalho no Brasil na próxima década, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), mas para garantir que uma proporção razoável destas ocupações sejam empregos de alto nível, temos muitos problemas a endereçar.
Mulheres representam somente 20% de todos os profissionais de tecnologia do Brasil e elas não existem em 21% de times de tecnologia no país, segundo a Associação Brasileira de Empresas de Tecnologia (Brasscom). Empresas brasileiras ainda promovem mulheres na área de tecnologia com uma freqüência três vezes menor do que homens, conforme mostrou uma pesquisa da Unlocking the Power of Women For Innovation and Transformation, Catho e Revelo. E organizações por aqui pagam mulheres 30% a menos do que os salários pagos aos homens em tecnologia, segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).
Este conjunto de problemas estruturais, que fazem com que mulheres em posições seniores sejam uma raridade, não são uma exclusividade do Brasil. Segundo um estudo global do Centro de Inovação para Talentos, das pessoas que ingressam em carreiras relacionadas a ciências, engenharia ou tecnologia, mulheres têm uma probabilidade 45% maior de abandonar a carreira do que homens. Possíveis motivos incluem a cultura hostil e machista do setor, um sentimento de isolamento de mulheres que atuam na área e falta de “patrocinadores” eficientes, ou seja, apoio de homens para promover seu desenvolvimento e promoção dentro da empresa.
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Estes preconceitos inconscientes também estão relacionados à falta de participação de mulheres em decisões operacionais e estratégicas que, cada vez mais, envolverão o uso de tecnologias de ponta. O estudo da KPMG/Harvey Nash menciona o impacto da cultura no desenvolvimento de tecnologias avançadas por empresas: para que a inteligência artificial seja efetiva e funcione para todos, é importante eliminar vieses organizacionais que incluem (mas não limitam a) gênero.
De fato, além de pensar em contratar e promover mulheres, é preciso pensar na interseccionalidade, considerando aspectos como a representatividade racial. Afinal, 32,7% dos times de tecnologia no Brasil não têm um negro sequer, segundo a pesquisa “Quem Coda o Brasil?”, da PretaLab e ThoughtWorks. A configuração do trabalho na pandemia, muitas vezes realizado remotamente e somado a diversas outras tarefas além das rotinas corporativas, também precisa ser considerada: é preciso evitar que as condutas deste novo mundo não inviabilizem o progresso de mulheres em tecnologia.
Nem toda mulher terá aptidão ou desejo de ser programadora, mas a transformação digital abrange muitas funções que poderão aproveitar expertises de outras áreas. Considerando o crescente desemprego na crise e o retorno dos programas de recrutamento no setor de tecnologia, oferecer possibilidades para que todas as mulheres possam começar e desenvolver novas carreiras na economia digital é essencial para que velhos erros sejam corrigidos e ninguém fique para trás.
Angelica Mari é jornalista especializada em inovação há 18 anos, com uma década de experiência em redações no Reino Unido e Estados Unidos. Colabora em inglês e português para publicações incluindo a FORBES (Estados Unidos e Brasil), BBC e outros.
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