O evento ajudou a ressignificar esse termo em um época que não era tão comum se referir às pessoas como pretas. “Me perguntavam ‘por que não feira afro?’ ou ‘por que não feira ou negra ou étnica?’. E eu respondia ‘não, é preta!’”, lembra Adriana. Seu ativismo, no entanto, pelo menos àquela época, não precisava ir muito além da sintaxe. Afinal, só a existência de uma feira com esse nome, que reunia artistas, criadores, chefs e empresários negros era, por si só, um posicionamento político. O que Adriana queria, na verdade, era um lugar para reunir tudo o que os pretos estavam fazendo e que estava espalhado pela cidade, em feirinhas de artesãos, em shows de black music que passaram a tomar conta (do bairro) da Vila Madalena, em São Paulo, e em algumas grifes que começavam a usar essa referência étnica como ponto de partida para suas criações. Tudo o que era criado pelos negros, mas muitas vezes não tinha o reconhecimento ou os ganhos devidos “Eu sabia que os pretos criavam e não ficavam com o dinheiro que ajudavam a produzir. E ao mesmo tempo ia no show da Paula Lima, via aqueles cabelos e só pensava que era o que eu queria pra mim.”
E, pelo jeito, muita gente também tinha o mesmo desejo. Logo a Feira Preta virou um sucesso de público. Nessas duas décadas, ganhou versões no Rio, em Brasília e no Maranhão, foi visitada por mais de 200 mil pessoas e acumulou uma arrecadação de R$ 6,5 milhões. A cada edição, chegavam caravanas e ônibus vindos de outros estados para conhecer o evento principal, que sempre acontece em novembro, relembrando Zumbi dos Palmares e comemorando o Dia da Consciência Negra.
Quebrar foi, possivelmente, o melhor que poderia acontecer com o empreendimento. Porque foi depois disso que Adriana recebeu apoio e repensou seu negócio para muito além do evento anual. “A Graça Cabral, a Marcia Matsumoto, o Rodrigo Bueno, o Theo, [presidente] da Bayer… Nem sei quanta gente me ofereceu ajuda e eu me permiti ser cuidada”, lembra. Com essa nova rede de apoio, Adriana passou a bater nas portas certas. Em vez de tentar apoio financeiro do departamento de responsabilidade social das empresas, passou a fazer reuniões com os diretores de marketing – que tinham orçamentos bem mais polpudos para investir. A arrecadação vinda da iniciativa privada logo saltou de R$ 100 mil para R$ 500 mil.
Seus domínios então se expandiram. Em 2018 veio o Preta Hub, uma mistura de aceleradora e incubadora de iniciativas que reúnem inovação, tecnologia, tendências, pesquisa. Neste ano, em conjunto com o Conselho Britânico, aconteceu o Afro Lab, uma imersão digital para empreendedores do mercado de moda. Junto com o Facebook, veio o Afrohub, para uso das redes sociais em favor de negócios liderados por pretos. Adriana Barbosa foi reconhecida como uma das pessoas negras mais influentes do mundo pelo MIPAD e a primeira mulher negra entre os Inovadores Sociais do Mundo escolhidos pelo Fórum Econômico Mundial
Sua criação mais recente, em 2021, é o espaço Casa Preta Hub em Cachoeira, no recôncavo baiano, visto como o berço do feminismo negro no país. O que faz todo sentido já que a história de Adriana Barbosa pode ser contada por meio de sua bisavó, que ficou viúva e criou os filhos sozinha, de sua avó, que enfrentou o mesmo destino e inspirou a neta enquanto fazia coxinhas para vender, da mãe, que sempre foi presente na vida dela e a ajudou a criar, como mae solteira, a filha Clara. “Venho de uma rede de apoio de mulheres e por isso a feira sempre teve essa pegada, a de incentivar outras mulheres pretas”, diz Adriana, baseada na filosofia Ubuntu, que prega haver uma interligação entre cada ser humano e que cada um só pode ser e existir por meio do outro. “É a minha forma peculiar de fazer negócios” diz a empreendedora, que fez tantos outros negócios existirem a partir do seu.